...Encontros inevitáveis. ...
...Lyan...
Respirei fundo ao chegar a Abradaque. Era meu segundo ano na faculdade Rainbow, e ainda restava mais um ano para finalmente deixar este lugar miserável. Meus cabelos, de um preto profundo como ônix, caíam levemente sobre minha testa. Meus olhos, verdes escuros, carregavam um peso que poucas pessoas notavam. Com 1,80 de altura, minha postura normalmente passava confiança, mas por dentro só queria que tudo isso acabasse.
Aquele filho de puta do diretor Wilhian Sartore me obrigou a me matricular aqui. Ele era companheiro do meu pai antes de ele morrer. Esta é uma exigência para que eu recebesse a maldita herança.Não queria, mas minha mãe fez um inferno na minha cabeça. Até posso ouvir ela falando:
- É muita grana, você tem que ir Lyan !
Ela não era o tipo de mãe amorosa, nem um pouco. Mesmo assim, tentei desesperadamente fazê-la me amar. Então aceitei. Para mim, tanto faz estudar aqui. Nem ligo. Já fiquei com alguns caras, mas foi só diversão, nada além disso. E eles sabiam. Assim que acabava o prazer, os dispensava.
Homem, mulher, tanto faz. Sou bissexual, mas, até agora, foi só atração física.Procuro, sim, um dia gostar de alguém de verdade.
Mas carrego um ressentimento por pessoas como eu, mesmo me envolvendo. A raiz disso tudo é o meu pai.
Bem, um resumo: meu pai é bissexual, mas prefere homens. Ele não ficou com minha mãe, nem assumiu a responsabilidade por mim, para poder ficar com o maldito diretor.
Cresci sem ele. Só o via em revistas ou na TV. Minha mãe é complicada, para dizer o mínimo. Só pensa em dinheiro e é abusiva comigo. Ela reclama do meu pai desde que consigo me lembrar, me fazendo ter esse sentimento de ódio.
Ao lembrar do meu passado e da minha mãe, um sorriso amargo surge nos meus lábios. Ela me criou, sim, sozinha, mas nunca escondeu que não se importa comigo. As frases que mais ouvia eram:
- Você é um nada. Uma merda. Nunca será ninguém.
Isso está cravado na minha mente como cola.
Na minha infância, ela me espancava por qualquer motivo: um copo quebrado por acidente ou até algo que nem era minha culpa. Me lembro da dor do cinto de couro cortando minha pele, da sensação do impacto contra a minhas costas . Era uma dor seca,que não parecia passar,como se estivesse cravada no meu corpo .Eu segurava as lágrimas,mas arrepio de recordar tudo ainda percorre minha pele. Me mantinha imóvel,sem gritar, sem chorar,apenas me encolhendo,tentando evitar que visse a fraqueza. Desenvolvi uma armadura contra ela, mas culpo meu pai por tudo isso também, porque me deixou lá, à mercê de tudo isso.
Minha vida piorou quando minha mãe arrumou outro homem. Ele era forte e alto. Mal lembro do rosto dele, mas jamais esquecerei aqueles olhos castanhos cruéis me batendo também.
A cada tapa, a cada soco,parecia que ele queria arrancar algo de mim .A dor na pele,as marcas eram constantes. Ele não se importava. Eu me escondia no quarto embaixo da escada, tentando evitar as surras, pelo menos por um dia sabia que seria apenas uma pausa até próxima vez.
Meu corpo vivia ferido, cheio de hematomas. Tenho algumas cicatrizes nas costas. E sabe o que é irônico? Eu amo minha mãe. Quero ser amado por ela. Acho que é dependência emocional.
Porque, mesmo com tudo isso, ela não desapareceu como meu pai.
Não entendo por que ele queria que eu me matriculasse nesta faculdade. Por que me pediu isso? Ele morreu. Só agora se importa? Só no fim da vida quis fazer algo? Me deixar essa grana?
Vim apenas para ver se terei o amor da minha mãe. Porque é isso que desejo desesperadamente: ser amado de verdade.
Caminhava distraído pelo campus quando trombei em um cara.
- Ah, desculpa - comecei a falar, mas vi que era o bastardo do meu meio-irmão. Sim, meu pai tem outro filho, e este ele criou.
Mesmo com ódio por ele ter tido o amor daquele maldito, o ajudei a se levantar.
- Obrigado. Eu nem te vi - explicou, se levantando com a minha ajuda.
Minha mente ficou em branco, sem conseguir formular uma única frase. Era nosso primeiro encontro. Só o tinha visto em fotos quando recebi o testamento. Ele provavelmente nem sabe da minha existência. Apenas balancei a cabeça. No ano passado, consegui evitá-lo, mas parece que este ano já estava começando de forma péssima.
- De verdade, sinto muito. Não queria trombar em você de propósito. Meu nome é James. E o seu?
Olhei para ele. Sabia quem era. Um dos professores daqui, se não me engano, de música. Fiquei tão em choque que nem consegui dizer meu nome. Queria sair dali, mas minhas pernas não respondiam, como se estivesse preso ao chão.
- Você se machucou? - perguntou, preocupado. - Está com dor? Quer ir ao hospital do campus?
Ele achava que eu estava com dor, mas estava completamente errado. A verdade estava a léguas de distância. Estava paralisado por finalmente conhecê-lo. Queria dizer algo, até mesmo brigar por ele ser o filho favorito, mas nada saía da minha boca.
Ele me olhava agoniado. Eu abri a boca, mas nenhum som saiu. Antes que ele dissesse mais alguma coisa, uma voz grossa o interrompeu:
- James!
Olhei na direção da voz e vi um cara da mesma idade dele. Ainda em choque, saí apressado.
Assim que percebi que estava longe ,encostei-me em uma árvore, escondendo-me atrás dela enquanto tentava acalmar meu coração acelerado. Sabia que esse momento chegaria.Respirei fundo, lutando contra a ansiedade. Hoje é o dia. Aqui, agora, e ele está próximo.
Meu meio-irmão... e, pelo que ouvi por aí, ele namorado do professor de artes. Igor Sartore, filho do diretor Wilhian Sartore, o companheiro do meu pai - o único amor verdadeiro que ele teve. Uma história complicada, para dizer o mínimo.
Saí de trás da árvore, ignorando os olhares curiosos ao meu redor. Isso sempre acontecia. Desde o ano passado, as pessoas não paravam de me observar, talvez por acharem graça nos meus rompantes ou pela fama de "problemático". Vai saber. Acendi um cigarro, tentando focar no presente e não na expectativa de encontrar meu meio-irmão.
Foi então que, assim que terminei cigarro e o apaguei . Um garoto, com cara de nerd e óculos tortos, apareceu do nada me puxando pela gola jaqueta.
- Que...? - comecei, mas ele nem me deixou terminar.
Antes que pudesse reagir, me beijou. Um beijo rápido, mas direto, que me deixou completamente estático. Era para empurrá-lo, mas...correspondi. Algo dentro de mim me impediu de resistir, e por um breve momento, o mundo inteiro pareceu parar.
Quando ele finalmente soltou meus lábios, disse apenas:
- Obrigado pelo beijo.
E saiu correndo como se o diabo estivesse no encalço. Fiquei ali, parado, tentando processar o que tinha acabado de acontecer. Resmunguei baixinho:
- Que foi isso... caraca.
Enquanto ainda me recuperava daquele beijo que me pareceu curto demais, ouvi uma voz aleatória:
- Meu Deus, o que deu no novato pra beijar o Coringa?
Levantei o olhar virei a cabeça na direção de dois caras rindo do outro lado. Um deles, com uma camisa azul, disse em tom provocativo:
- Esse nerd claramente quer morrer. Beijar Lyan Sales? É pedir por isso.
Quando perceberam que eu os encarava, saíram correndo. Soltei uma risada leve. Estava acostumado com o apelido de "Coringa". Não era pela graça, mas pelo meu jeito imprevisível. Como o Coringa dos filmes, não deixava barato. Mexeu comigo? Retribuo em dobro.
Mas, naquele momento, o beijo roubado do nerd tinha me desarmado. Esqueci até do motivo que me trouxe aqui: meu encontro com meu meio-irmão. Enquanto caminhava para a sala do diretor, para assinar os papéis do ano, minha mente insistia em voltar àquele beijo.
Toquei meus lábios, pensativo. Já tinha beijado outras pessoas antes, tantas bocas diferentes. Então por que aquele beijo, de um completo estranho, mexeu tanto comigo?
- Deve ser falta de sexo - murmurei, tentando me convencer. - Faz uma semana, só pode ser isso.
Sacudi a cabeça, tentando afastar o pensamento. A culpa era da minha fome sexual, que, neste momento, estava à flor da pele. Toda a culpa era desse nerd estranho e desse beijo roubado.Ele nem era atraente, não fazia meu tipo.
- Lyan, para com isso! - pensei. Depois que resolver esse rolo, é só beijar outra pessoa, talvez transar, e esquecer essa história.
Antes de entrar na sala do meu maior desafeto - o diretor -, fiz uma nota mental: aquele nerd folgado não vai sair impune. Ele roubou meu beijo e bagunçou minha cabeça.
E ninguém mexe com Lyan Sales sem pagar caro por isso.Pode esperar, seu infeliz. Vai ter troco. Querendo ou não.
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Atualizado até capítulo 52
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