Amor na Colina
( Emily )
Eu me chamo Emily Monteiro, tenho 26 anos e trabalho em um escritório de advocacia.
Voltar pra essas ruas nunca é fácil. Cada esquina, cada portão enferrujado parece estar carregando um pedaço da minha história que eu queria esquecer. Aqui é onde cresci, onde tudo começou. Mas também é onde aprendi que o mundo não é justo, especialmente pra quem nasceu como eu: minha mãe era Vanessa, uma garota de programa.
A única coisa que sei sobre meu pai é que o nome dele é Roberto, minha mãe nunca entrou em detalhes sobre ele. Ela me disse que meu pai havia morrido quando eu era criança. Então era só eu e ela tentando sobreviver sozinhas.
Os moradores daqui são os mesmos, só mais velhos. Ainda lembram de mim, isso é óbvio. Dá pra perceber pelos cochichos e pelos olhares atravessados enquanto caminho. Minha cabeça quer me dizer pra ignorar, mas meu coração, esse idiota, sente como se fosse ontem.
Passo pela mercearia onde eu costumava comprar balas com as moedinhas que sobravam da feira. O cheiro de pão fresco ainda é o mesmo, mas o dono mudou. Ele não sabe que eu já fiquei plantada ali fora por horas, esperando a minha mãe sair de algum cliente.
Enquanto caminho, memórias da minha infância surgem como relâmpagos.
Flashback 1:
Eu tô sentada no canto do pátio, tentando me concentrar no livro da biblioteca. Tinha que ser emprestado porque minha mãe não podia comprar. Enquanto isso, um grupo de meninas cochicha perto do bebedouro.
Menina 1: "Olha lá, é a filha da Vanessa... Sabe o que a mãe dela faz, né?"
Menina 2: "Meu pai disse que ela trabalha à noite. E nem é de verdade!"
Elas riem. Finjo que não ouço, mas minha garganta queima e meus olhos ardem. Naquela época, eu não sabia responder. Só queria desaparecer.
Flashback 2:
Minha mãe e eu estamos na fila de uma padaria, esperando pra perguntar sobre emprego. Quando chega a nossa vez, minha mãe faz aquela cara esperançosa.
Vanessa: Oi, vocês estão precisando de ajudante?
O dono nem deixa ela terminar.
Dono: Desculpa, Vanessa, a vaga já foi preenchida.
Minha mãe respira fundo, agradece, mas eu vejo as lágrimas nos olhos dela enquanto viramos as costas. Essa cena se repetiu tantas vezes que eu já sabia o final antes mesmo de começar.
Flashback 3:
Minha mãe sai pro trabalho, e eu fico em casa sozinha. Tenho sete anos e um caderno na frente. Prometi a ela que ia estudar, e é o que faço. Não porque adoro matemática, mas porque preciso. Talvez, se eu for inteligente o bastante, ninguém mais ria da gente.
Quando a luz da cozinha pisca, tenho que apertar os olhos pra conseguir ler. A casa é fria, e o silêncio parece mais pesado do que deveria. Era só isso que eu tinha: livros emprestados e o som distante dos carros passando pela avenida.
Presente
Volto pro presente quando chego na pracinha. A gangorra enferrujada ainda está lá. Tinha um garoto, o Luís, que uma vez tentou ser meu amigo, mas logo os pais dele proibiram. "Ela não é boa influência", lembro deles dizendo. É engraçado como criança ouve coisas que não devia.
Meu celular vibra. É minha mãe. Atendo sem hesitar.
Vanessa: “Tá tudo bem, filha? Você tá onde?”
Emily: “Tô só dando uma volta.”
Ela faz uma pausa antes de responder. Não precisa dizer que sabe onde eu tô. E, de algum jeito, eu sinto que ela tá me agradecendo por tudo que tô fazendo por nós duas, sem usar palavras.
Desligo e olho pra pracinha mais uma vez antes de virar na próxima rua. Passei muita coisa aqui, mas saí. Consegui. Ainda que me chamem de filha da Vanessa, "a mulher da vida", hoje eu sou a Emily, sou advogada. E ninguém pode tirar isso de mim.
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Personagens:
Emily Monteiro:
Daniela França:
Alexandre Lacerda:
Gustavo Barreto:
Carlos Lima:
Davi:
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Atualizado até capítulo 98
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