— Senti muito a sua falta — diz Santiago, sua voz suave e carregada de sinceridade.
Estamos deitados em sua cama. Ele apoia o rosto em uma das mãos, enquanto seus olhos castanhos estão fixos em mim, como se tentassem memorizar cada detalhe.
A janela do quarto está aberta, deixando a brisa noturna entrar. As cortinas dançam suavemente com o vento. Seu apartamento, no quinto andar, reflete sua essência: minimalista, organizado, com tons claros. No quarto, além da TV, há uma mesa com um computador, uma prateleira abarrotada de livros. É o retrato clássico de um jornalista dedicado. Já perdi a conta de quantas vezes acordei e o encontrei naquela mesa, absorto em artigos e reportagens.
— Também senti sua falta — respondo, e é verdade. — Mas me conta, como foi lá? E a reportagem?
Santiago suspira profundamente antes de se deitar corretamente, os olhos voltados para o teto.
— Foi bom. Nada emocionante, sabe? Conversar com os atletas, ouvir as expectativas da torcida, fazer uma análise rápida do jogo... o de sempre. — Sua voz carrega um tom desanimado, distante.
Santiago começou a trabalhar na "Gazeta Nexus" ainda durante a faculdade de jornalismo. Ele era um sonhador, um idealista, determinado a dar voz às questões que realmente importavam e mostrar a realidade das pessoas, com o desejo de fazer a diferença no mundo.
Conseguiu um estágio no jornal, mas foi designado para cobrir esportes. Após se formar, acabou sendo efetivado nessa área.
Com o tempo, no entanto, Santiago parecia cada vez mais distante de seus ideais.
Chego mais perto, me aconchego em seus braços e deslizo minha mão até seu rosto, forçando-o a olhar para mim.
— Tenho certeza de que, logo, eles vão reconhecer seu talento e lhe darão as oportunidades que você merece. Mas você precisa continuar. Não desanima, está bem?
Ele ri levemente e deposita um beijo suave em meu rosto.
— Não se preocupe, amor. Eu não vou desistir. Vou continuar nessa função até surgir uma oportunidade melhor.
— Você sabe que, se quiser, eu posso te ajudar, não sabe? Posso conversar com meu pai...
— Não, Maju, por favor. Não começa com isso de novo. — Seu tom de voz se eleva um pouco, e eu recuo, sentindo a barreira entre nós. — Já te disse que quero alcançar meus objetivos pelo meu esforço, pelo meu trabalho.
— Eu não estou tentando te ofender, Santiago. Confio em você, no seu potencial. Só estava tentando ajudar, mas, se não quer, eu não vou mais tocar nesse assunto.
Ele suspira, e sua expressão suaviza.
— Me desculpa, amor. De verdade. Eu agradeço a intenção, mas preciso fazer isso por mim mesmo. Você entende, né?
— Entendo, Santiago. E sei que você está trabalhando em um dos melhores jornais e tem um salário razoável. Mas acho que pode mostrar mais do seu talento, das suas ideias.
— E o que você acha que eu faço, Maria Júlia? Eu me dedico, me esforço... O que mais você quer de mim? O que espera que eu faça? — ele questiona, impaciente, sentando-se na cama e encostando as costas na cabeceira.
Seguro seu olhar com firmeza. Eu acredito no potencial dele e conheço o seu talento. Apesar das minhas falhas, e do meu jeito torto, eu realmente gosto dele.
— Eu gosto de você, e quero ver você realizar seus sonhos. Não quero que se conforme com o mediano. Quero que mostre todo o seu potencial. Não quero que esqueça sua paixão. Quero que, quando falarmos sobre o seu trabalho, eu veja a mesma animação que você tinha quando falava das suas matérias na faculdade.
— Não estou mais na faculdade, Maria Júlia. Não posso sair por aí escrevendo matérias e investindo meu tempo em algo que nem será publicado.
— Pode sim. Não estou dizendo para abandonar seu trabalho, mas acredito que você tem capacidade de construir algo seu. Um site, um portal de notícias onde possa falar sobre o que realmente importa para você. Um espaço para trazer temas relevantes, análises e debates, sem ninguém limitando seu potencial. Se quiser, posso te ajudar com isso.
Ele permanece em silêncio, pensativo.
Quero apoiá-lo, mas não posso forçá-lo a aceitar minha ajuda.
O silêncio entre nós se torna incômodo. Pego meu celular e vejo que já passa das duas da manhã.
— Acho melhor irmos dormir. Está tarde.
Santiago apaga a luz, e sinto seus braços me envolverem, puxando-me para mais perto.
— Me desculpa pelo que eu disse. Você está certa. A ideia do site é boa. Vou pensar nisso com carinho. Obrigado por me apoiar sempre.
Sorrio, mas não digo nada. Santiago e eu formamos uma boa equipe. Compartilhamos muitas coisas, entre elas a dificuldade de lidar com as expectativas e críticas de nossos pais.
Infelizmente, meu pai destruiu meus sonhos. Mas, se depender de mim, eu nunca vou deixar os pais de Santiago fazerem o mesmo com os dele.
*****
O som do celular vibrando corta o silêncio do quarto, ecoando como um lembrete incômodo. Embora o peso do sono ainda esteja sobre mim e a tentação de permanecer deitada seja quase irresistível, eu respiro fundo, conto até cinco e me forço a levantar.
— Já está na hora de você ir? — Santiago murmura, se espreguiçando preguiçosamente ao meu lado.
— Sim, não posso me atrasar. Vou tomar um banho rápido. — Passo a mão pelo cabelo, tentando afastar o torpor. — Acho que meu pai já está descontente comigo, e se eu me atrasar, só vai piorar.
Ele se endireita na cama, me observando com aquela expressão que mistura curiosidade e preocupação.
— Sobre isso… a gente não teve a chance de conversar, mas eu acho que você está agindo muito mal, Maju.
Eu paro no meio do caminho, semicerrando os olhos para ele.
— Ah, é mesmo? E posso saber por quê?
— Seu pai está apaixonado. Está feliz. E, pelo que eu vi, a Laura parece ser uma boa mulher.
Eu cruzo os braços, sentindo a irritação fervilhar sob a superfície.
— Uma boa mulher? Me explica como você concluiu isso depois de trocar meia dúzia de palavras com ela?
— Por que você implica tanto com ela? — Ele suspira, como se estivesse tentando manter a paciência. — Ela faz seu pai feliz. Isso não deveria ser suficiente?
— Sabe por que eu implico com ela? Porque não vejo verdade nenhuma nessa história. Meu pai está cego por ela, mas e quanto a ela? Ela está mesmo apaixonada por ele? Ou é só conveniência?
Santiago dá de ombros, os olhos avaliando minhas palavras.
— Pode ser…
— Eu não acho. — Minha voz sai firme, quase dura. — Ela tem a minha idade, Santiago.
Ele arqueia as sobrancelhas, um sorriso discreto brincando nos lábios.
— Ah, então esse é o problema?
Eu reviro os olhos, relutante em admitir, mas acabo cedendo.
— Em parte, sim. Por que meu pai não poderia se apaixonar por alguém da idade dele? Alguém do mesmo círculo, com os mesmos interesses. — Faço um gesto amplo com as mãos. — Até outro dia, ela era só a secretária dele. Em um ano, tudo muda. De repente, ela me chama pelo primeiro nome como se fôssemos íntimas, e eu sou quem deve demonstrar respeito e simpatia? Não compro essa fachada de bondade. Ninguém é tão perfeita assim, Santiago. E parece que todo mundo caiu na lábia dela, menos eu.
Ele assente, a compreensão suavizando sua expressão, mas suas palavras ainda carregam firmeza.
— Eu entendo sua frustração, Maju, mas seu pai tem o direito de escolher com quem quer estar. E, por mais que você seja filha, isso não te dá o direito de interferir. — Ele se levanta, alongando-se. — Agora vai tomar seu banho, que eu vou preparar nosso café. Ah, e, por favor, tenta ser gentil com ela. Afinal, em breve ela será sua madrasta. Já imaginou ela te colocando de castigo? — Ele sorri provocadoramente antes de sair correndo.
— Idiota! — grito para ele, mas um sorriso breve me escapa.
Sigo para o banheiro, tentando afastar o tumulto na minha mente. A água quente escorre pelo meu corpo, e eu fecho os olhos, buscando algum tipo de clareza. Não importa o quanto eu negue, essa mulher já está mexendo com minha vida. O que eu preciso agora é encontrar uma forma de garantir que ela não tome o controle dela.
************
Assim que entro no hall da empresa, sinto o ar condicionado gelado que contrasta com o calor do lado de fora. O som abafado de saltos e murmúrios enche o espaço. Respondo aos cumprimentos de bom dia com um breve aceno de cabeça, um gesto calculado para não parecer mal-educada. Mesmo assim, sei que não fará muita diferença. As paredes desses corredores já viram e ouviram tudo – especialmente os comentários velados que serpenteiam pelos lábios de alguns.
Mas não me importo. Paus e pedras podem quebrar ossos, mas palavras não têm esse poder sobre mim. Ou, ao menos, é o que repito a mim mesma.
Nossa empresa é uma das maiores no ramo da publicidade. Aqui, transformamos ideias em campanhas que moldam opiniões e impulsionam vendas. O objetivo é claro: aumentar a visibilidade, construir imagens positivas e garantir que nossos clientes alcancem suas metas de comunicação.
Sou a diretora financeira, responsável por manter as engrenagens econômicas da empresa funcionando. Meu trabalho é equilibrar a criatividade exuberante das campanhas com a solidez de uma gestão financeira impecável. Uma tarefa que exige precisão, estratégia e, por vezes, nervos de aço.
Assim que chego à minha sala, fecho a porta, tiro os óculos de sol e os guardo na bolsa, que deixo sobre a mesa de vidro. O ar condicionado já estava ligado, mas ajusto a temperatura para ficar mais confortável. O silêncio momentâneo é interrompido quando Nádia, minha secretária, entra com passos firmes, segurando meu café e a agenda do dia.
— Bom dia, Maju. Trouxe seu café e sua agenda. Vamos revisar os horários?
Seu tom é sempre profissional, mas há algo de familiar em sua postura. Ela é, talvez, a única pessoa aqui que posso considerar uma amiga. Passamos tanto tempo juntas que ela conhece praticamente tudo sobre minha vida – um privilégio e um peso.
— Excelente. Estou precisando disso — digo enquanto tiro o blazer e o penduro na cadeira. Sento-me, ajustando a postura, e ligo o computador. — O que temos hoje?
— Logo pela manhã, uma reunião de avaliação orçamentária para a nova campanha. Ah, e o Garro deixou alguns documentos e contratos para você revisar.
Suspiro, pegando a xícara de café e sentindo o aroma reconfortante antes de tomar um gole.
— Mais um dia normal — murmuro, tentando encontrar algum entusiasmo na rotina. — Meu pai ligou ou deixou algum recado?
— Não, ele ainda não chegou.
— Deve aparecer só mais tarde. Provavelmente ainda está comemorando o noivado.
Abro meus e-mails enquanto Nádia permanece na sala. Estranho sua hesitação. Ela sempre tem um timing impecável.
— Tem mais alguma coisa? — pergunto, levantando uma sobrancelha.
Ela respira fundo antes de responder:
— Tem, sim. Melissa ligou mais cedo procurando por você.
Minha mão para no ar, ainda segurando a xícara. Mordo o lábio inferior, tentando conter a irritação crescente. Claro que seria Melissa. Sempre ela.
— Ela deixou algum recado?
— Disse que estará de volta ao país em algumas semanas e insistiu para marcarmos um horário com você.
Reviro os olhos, colocando o café de lado.
— Espero que você não tenha marcado.
— Não marquei. Disse que sua agenda estava cheia, mas ela afirmou que falaria com você de qualquer forma.
Sinto a irritação crescer, mas respiro fundo. Odeio quando as pessoas tentam me pressionar. Esse tipo de comportamento me tira do sério.
— Se ela ligar de novo, diga para me procurar apenas quando já estiver no país. E, por favor, não comente com ninguém sobre essa ligação. Mantenha-me informada de qualquer novidade.
— Pode deixar — diz Nádia, levantando-se com elegância.
Sorrio de leve, um agradecimento silencioso. Assim que a porta se fecha, encosto-me na cadeira, olhando para o teto por um breve instante. Preciso resolver esse assunto com Melissa antes que vire uma bola de neve. No meu mundo, deixar assuntos pendentes é uma fraqueza que não posso me permitir.
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Atualizado até capítulo 90
Comments
Maria Andrade
hum, mais um segredo escondido, e bem uma ex, ficante
2025-01-10
0
A.Maysa
hum, quem será essa Melissa?🤔
2025-01-10
2