Capítulo 4 - O Peso da Verdade
A noite estava pesada, como se a própria cidade respirasse com dificuldade. Eu não conseguia tirar os olhos do documento que ainda estava sobre a mesa, o papel que me conectava a um segredo doloroso. Damian nunca me falou sobre seu pai, mas de alguma forma, eu sabia que aquilo era mais do que apenas um erro de percurso ou uma história distante. O peso daquela revelação parecia ainda mais difícil de lidar do que eu imaginava.
Na manhã seguinte, Damian não apareceu no escritório até tarde, o que não era comum para ele. Eu sabia que ele estava se afastando, se escondendo de algo, mas o que mais me incomodava era o fato de que, pela primeira vez, eu não sabia o que fazer com as informações que agora possuía.
Minha mente estava dividida entre o desejo de confrontá-lo e a compreensão de que ele já estava lidando com algo muito mais profundo do que eu poderia imaginar. Mesmo assim, a necessidade de saber mais e entender o que realmente acontecera com seu pai me consumia. A revelação que eu havia encontrado era como uma chave para um enigma que ele nunca quis que ninguém resolvesse.
O dia se arrastava, e quando finalmente Damian entrou, sua postura era diferente. Ele parecia mais tenso, os olhos carregados de uma expressão que eu não reconhecia. Ele olhou para mim brevemente e então se dirigiu diretamente à sua mesa, sem dizer uma palavra. Eu poderia sentir a barreira entre nós crescendo, mais espessa e mais densa.
Foi difícil ignorar a distância, mas eu sabia que se fosse falar com ele, seria agora ou nunca. Não podia deixar que ele ficasse no controle daquela situação, não depois de tudo que eu havia descoberto.
Levantei-me da minha mesa e me aproximei da dele, sem dizer nada. Damian me olhou, como se estivesse se preparando para me expulsar com um simples olhar, mas ao invés disso, ele permaneceu em silêncio, esperando que eu fosse a primeira a quebrá-lo.
— Você sabia que sua mãe morreu por causa do seu pai? — minha voz saiu mais firme do que eu imaginava, mas o ar estava tenso o suficiente para que ele entendesse o peso da pergunta. Eu podia ver a raiva começar a se formar em seu rosto, mas não estava disposta a me afastar. Não agora.
Ele ficou parado, sem responder, mas os olhos dele estavam mais escuros, como se a dor estivesse prestes a transbordar.
— Por que você nunca me contou? — insisti, aproximando-me um passo. — Por que esconder isso de mim? Do mundo?
Damian respirou fundo, como se estivesse lutando contra algo dentro de si. Ele virou a cadeira para a mesa, seus dedos batendo nervosamente sobre a superfície. Então, como se a verdade finalmente o atingisse de forma cruel, ele falou, sua voz baixa, mas cheia de raiva reprimida.
— Eu não queria que você soubesse, Ana. Não queria que ninguém soubesse. Meu pai... ele destruiu minha vida de tantas maneiras, e não posso deixar que isso afete mais ninguém. Não posso deixar que a história dele defina quem eu sou.
Eu engoli em seco, meu coração batendo mais rápido com cada palavra que saía de sua boca.
— Você acha que eu sou apenas mais uma pessoa que vai julgar você, Damian? — perguntei, tentando não parecer brava, mas havia algo de profundamente ferido em sua atitude que me deixou sem palavras. — Você está se escondendo atrás disso. Não é sobre julgamento, é sobre a verdade.
Ele olhou para mim por um momento, seus olhos cheios de algo entre a raiva e o cansaço. Então, com um suspiro profundo, ele se levantou da cadeira e se afastou, indo até a janela. Ficou lá por alguns minutos, observando a cidade lá fora. O silêncio entre nós era denso, como se o tempo tivesse parado, esperando que ele se abrisse comigo.
Finalmente, ele se virou para mim.
— Eu não sou meu pai, Ana — disse, a voz falhando por um momento. — Mas carregar esse peso... as pessoas sempre vão olhar para mim e ver o que ele fez. Não importa o que eu faça, sempre será a sombra que vai me acompanhar.
Eu o observei, sentindo um desconforto crescente no peito. Havia algo em sua voz, algo que eu não havia reconhecido até então. Ele estava se entregando à dor de ser associado a um homem que havia destruído sua vida e a de sua mãe, e isso estava mais profundo do que ele queria admitir. O que eu não entendia completamente era por que ele ainda se apegava a esse segredo, como se mantê-lo escondido fosse a única maneira de se proteger.
— Você não precisa carregar isso sozinho — eu disse, tentando, de alguma forma, aliviar a pressão que ele estava sentindo. — Se não quiser que as pessoas julguem, você tem que parar de se julgar primeiro.
Damian me olhou como se fosse a primeira vez que eu falava a verdade, como se ele realmente estivesse ouvindo, mas não sabia o que fazer com isso. Ele não estava pronto para me mostrar a parte mais vulnerável de si mesmo. E eu sabia que esse segredo era algo que ele não queria dividir, mas que me fazia entender que ele não era o monstro que o mundo parecia vê-lo.
Eu dei um passo em direção a ele, mas ele recuou, levantando a mão.
— Não — disse ele, de forma quase desesperada. — Eu não posso fazer isso. Não agora. Não com você.
Havia algo nas palavras dele que fez meu coração apertar. Eu não sabia se ele estava falando sobre o segredo, sobre mim, ou sobre ambos. Mas uma coisa era certa: Damian estava em guerra com sua própria história, e eu não sabia se conseguiria ajudá-lo a encontrar uma maneira de se libertar disso.
— Eu não vou te forçar a contar mais, Damian — disse, minha voz suave, mas firme. — Mas eu preciso que você saiba que estou aqui. Eu não vou te julgar.
Ele não respondeu. Só se virou novamente, de costas para mim, como se estivesse procurando uma maneira de se esconder da realidade, ou talvez de si mesmo.
E, por mais que eu odiasse admitir, eu também estava começando a me esconder de mim mesma. Algo entre nós estava mudando, algo que eu não sabia se conseguiria controlar.
Talvez fosse o peso do segredo, ou talvez fosse algo mais profundo, algo que começava a se formar entre nós dois, mas que ainda não estávamos prontos para entender.
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Atualizado até capítulo 60
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