o silêncio diz tudo.

Alexander me observa por um instante que parece se alongar. Seu olhar é analítico, como se tentasse encaixar a garota que ele conheceu anos atrás na mulher que agora está diante dele.

— Você cresceu. — Ele diz com a voz grave, sem expressar muito. Neutra. Quase fria.

— O tempo passa para todos. — respondo, dando de ombros, mantendo o olhar firme no dele. Um leve sorriso curva meus lábios, discreto, mas presente.

— E mudou bastante. — completa, ainda me observando.

Isadora sorri ao meu lado, tentando aliviar qualquer possível tensão.

— A Aurora está cada vez mais linda, não é? — diz, orgulhosa, me lançando um olhar cúmplice.

Alexander apenas assente, educado. E volta sua atenção para meu pai, que agora fala com entusiasmo sobre os antigos tempos que viveram juntos.

Eu me mantenho em silêncio, absorvendo a energia do ambiente. A mansão é imponente, mas discreta. O cheiro de madeira encerada, o leve aroma de charuto no ar e a lareira crepitando compõem o cenário com perfeição. Um lugar que combina com Alexander: reservado, calculado e, de alguma forma, distante.

Sento-me no sofá de forma elegante, cruzando as pernas devagar. Não para provocar — mas porque sei que estou sendo observada. Não por todos. Por ele.

Seus olhos não se demoram em mim por mais do que segundos. Mas não é o tempo que importa, e sim a intensidade. Há algo ali, algo silencioso, mas denso. Ele não sorri. Nem elogia. Mas a ausência de palavras diz muito mais.

— E como foi a Rússia? — pergunto casualmente, tentando manter a naturalidade.

— Fria. — responde com simplicidade. — Mas eficiente.

Meu pai ri, batendo levemente no ombro dele.

— Alexander é um homem de poucas palavras. Mas quando fala, é porque é importante.

Concordo com a cabeça, mas continuo observando-o de relance. Há um mistério nele que me intriga. A barba impecavelmente feita, os ombros largos sob o blazer escuro, os olhos negros que não entregam nada — e ao mesmo tempo, dizem tudo.

Durante o jantar, as conversas seguem animadas. Eu respondo quando sou chamada, sorrio, participo. Mas há uma parte de mim que permanece em alerta. Atenta a cada olhar furtivo que recebo. E são poucos. Quase imperceptíveis. Mas existem.

Quando a sobremesa é servida, Alexander agradece à governanta com um leve aceno de cabeça e continua a beber seu vinho, pensativo. Por um segundo, seus olhos se cruzam com os meus. Ele não diz nada. Eu também não. Mas algo passa entre nós. Algo indefinido. Algo que nem ele nem eu ousamos nomear.

E talvez seja melhor assim.

Porque algumas coisas, quando ditas, perdem o poder.

Quando nos despedimos, ele aperta a mão de Isadora e depois a minha. Rápido. Formal. Mas firme.

— Boa noite, Aurora. — diz, com a voz baixa.

— Boa noite, Alexander. — respondo, tentando não transparecer o arrepio que sobe pela minha espinha.

No caminho de volta, dentro do carro com meu pai e Isadora, deixo meu olhar se perder pela janela, observando as luzes da cidade passando rápidas.

Por fora, tudo parece normal.

Por dentro, algo desperto.

Uma faísca.

Uma expectativa.

Um jogo silencioso começou.

Mas ninguém além de nós dois parece notar.

E é exatamente isso que torna tudo mais perigoso.

Chegamos em casa já perto das onze da noite. A mansão estava silenciosa, apenas algumas luzes acesas no hall e na sala. Me despedi do meu pai e da Isadora com um beijo em cada um e subi direto para o meu quarto.

Assim que fechei a porta, o silêncio se tornou quase ensurdecedor.

Tirei os saltos e os deixei de lado. Soltei os cabelos, caminhei até a janela e fiquei ali por um tempo, observando o jardim escuro, iluminado apenas pelos pequenos postes de luz espalhados pelo caminho.

Meu coração ainda batia em um ritmo diferente.

Eu não sabia exatamente o que era aquilo. Não foi um flerte. Não foi intimidade. Mas houve algo. Um choque breve de energia, uma troca de olhares que não se esquece com facilidade.

Ele não fez nada. Nem eu.

Mas a forma como me olhou, como demorou um pouco mais do que o necessário para me reconhecer... Como se quisesse ter certeza. Como se estivesse comparando a lembrança de uma menina com a realidade de uma mulher.

Fecho os olhos por um instante, e consigo ouvi-lo dizer: "Você cresceu."

Minha respiração se prende por um instante. E, ao soltar o ar, percebo que estou sorrindo — sem querer. Um sorriso curto. Quase tímido.

Tiro o vestido com cuidado, visto um roupão leve e sigo para o banheiro.

A água quente do chuveiro escorre pelas costas e, mesmo com o vapor preenchendo o ambiente, a imagem dele me vem de novo à cabeça: firme, sóbrio, contido. O tipo de homem que não se deixa afetar facilmente. Ou, se deixa, não demonstra.

E talvez por isso, ele seja tão difícil de ignorar.

.

.

.

- ALEXANDER RAMANOV -

A casa estava em silêncio novamente.

Alexander caminhou lentamente até o escritório, os passos pesados nos pisos de madeira. A lareira ainda estava acesa, deixando o ambiente aquecido e iluminado por uma luz âmbar suave.

Ele serviu-se de mais um copo de whisky e encostou-se na poltrona próxima à janela. De lá, observava os jardins que mandara plantar — roseiras vermelhas, como as que sua mãe gostava.

Levou o copo à boca, mas ficou um momento parado, com o olhar distante.

"Aquela garotinha..." — murmurou para si mesmo.

Aurora. O nome parecia mais adequado agora. Ela não era mais a adolescente de poucos anos atrás. Era uma mulher. E isso o surpreendeu mais do que gostaria de admitir.

Mas não era só a mudança física.

Era a forma como se portava. O olhar direto, a postura confiante, a maneira como parecia consciente do próprio efeito. Não houve palavras provocativas. Nenhuma atitude inadequada. E, ainda assim, havia algo na presença dela que fazia o ar parecer mais denso.

Ele tomou um gole do whisky, fixando os olhos na noite lá fora.

Sabia onde aquilo poderia levar, se quisesse.

Mas também sabia que não deveria querer.

Aurora era filha de seu amigo mais antigo. Uma garota recém-saída da adolescência. E ele… bem, ele não era o tipo de homem que alguém desejaria ver se aproximando da própria filha.

Mas o pensamento permaneceu. Silencioso. Incômodo.

Ele terminou o copo, colocou-o sobre a mesa com firmeza e se recostou, fechando os olhos por um instante.

Era só o começo. Ele sabia.

E se conhecia bem o suficiente para saber que, mesmo sem querer, algo já tinha sido despertado.

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