Em Seu Reflexo Existe um Paralelo

Em Seu Reflexo Existe um Paralelo

Capítulo 1

Kelly era uma garota que chamava atenção por onde passava. Estava no primeiro ano da faculdade de Psicologia. Os professores a consideravam esperta e inteligente: participava ativamente das aulas, respondia com precisão às perguntas, obtinha excelentes notas e ajudava os colegas com a matéria. Os alunos a admiravam por seu desprendimento, pelas iniciativas e pelas ideias inovadoras, que sempre beneficiavam o grupo. Além disso, muitos se encantavam com sua beleza. Dotada de um carisma natural, Kelly era simpática, conversava com todos e fazia amizades com facilidade, sem esforço, mas com disposição.

Sua aparência prendia olhares à primeira vista: cabelos pretos e lisos, que caíam quase até o quadril. Despertava inveja em algumas garotas, que ao mesmo tempo, ansiavam por sua amizade. Os rapazes a paqueravam constantemente, mas Kelly não dava muita importância a isso. Embora fosse o centro das atenções na faculdade, mantinha-se indiferente aos flertes. Sua falta de reciprocidade tinha razão: além de estar focada nos estudos, namorava desde os dezesseis anos, e, agora com dezoito, continuava em um relacionamento sério.

Seu namorado, Charlie, era um rapaz muito bonito, o cabelo dividido ao meio, que alcançava a altura do queixo, magro, mas com músculos definidos, tinha um olhar misterioso e charmoso. De personalidade séria, Charlie causava a impressão de ser metido, afinal, raramente sorria. Apesar disso, sua presença era sempre marcante e atraente. Fazia parte de uma banda de rock e arriscava-se cantando em pequenos bares da cidade. O dinheiro que ganhava era pouco, e dependia financeiramente dos pais, que não apoiavam seu sonho de ser artista nem concordavam com seu estilo de vida. Essa falta de apoio o deixava frustrado, e ele sofria de depressão, necessitando de acompanhamento psiquiátrico contínuo.

Charlie, no entanto, era displicente com as medicações. Como gostava de consumir álcool, costumava interromper o uso dos remédios para evitar os efeitos perigosos da mistura entre antidepressivos e bebida. Às vezes, tinha crises de ansiedade, principalmente quando passava muito tempo sem conseguir trabalho. Esses problemas de saúde mental afetavam frequentemente o relacionamento com Kelly. Quando se sentia mal, tratava-a com indiferença, em algumas ocasiões, chegava a ignorá-la. Ainda assim, Kelly nunca pensou em terminar o namoro. Pelo contrário, acreditava que ao se formar em Psicologia, seria capaz de entender melhor o que Charlie sentia e ajudá-lo a resolver seus conflitos internos.

Kelly e Charlie eram melhores amigos e vizinhos desde os treze anos. Por isso, ela conhecia bem os tormentos que ele enfrentava. Na maior parte do tempo, eram inseparáveis. O namoro surgiu de forma natural, após anos de amizade sólida.

Enquanto Kelly era bastante admirada na faculdade, em casa a realidade era diferente. Sua irmã mais velha, Vivian, era irritante e adorava provocar. Inventava histórias sobre a família e os amigos de Kelly, tentando criar intrigas onde não havia. Seu passatempo favorito? Irritar a irmã mais nova, com comentários maldosos, ironias afiadas e manipulações sutis.

A mãe de Kelly era indiferente e ranzinza, passava os dias cuidando da casa em silêncio e evitava qualquer tipo de conversa mais profunda. Já o pai, bebia quase todos os dias, até perder o controle. Estava desempregado, e o sustento da casa vinha dos aluguéis de imóveis herdados pela mãe de Kelly. Mesmo assim, a família enfrentava dificuldades financeiras, já que grande parte do dinheiro era gasto com as bebidas do pai e com os luxos de Vivian, que apesar de trabalhar e ter seu próprio dinheiro, era extremamente consumista, priorizando roupas, cosméticos e saídas caras, sem qualquer senso de responsabilidade.

Kelly pensava em ajudar financeiramente a família, mas, por estar apenas no primeiro período da faculdade e não ter experiência profissional, ainda não conseguia um estágio ou emprego. Enquanto isso, dedicava-se aos estudos com afinco. Desde os quatorze anos, tinha um hobby que não abandonava por nada: a dança de rua. A dança era sua válvula de escape, sua forma de aliviar o estresse diário. Talentosa, já havia sido convidada para competir em várias regiões do país, mas recusou todas as oportunidades, tanto para focar na faculdade quanto porque não tinha condições financeiras de arcar com as viagens, hospedagens e inscrições.

Certo dia, Kelly e Charlie tiveram uma discussão. Ele tinha um show marcado para a noite, mas ela não podia assistir porque tinha uma prova importante no dia seguinte. Apesar de sempre apoiar Charlie e assistir suas apresentações, dessa vez sabia que precisava dormir cedo. No dia seguinte, após a prova, Kelly ficou preocupada com a reação dele por sua ausência no show. Depois da aula, foi até a casa dele para conversar. Charlie a recebeu de forma fria, e ela logo se desculpou:

— Desculpa por ontem. Eu realmente não teria conseguido fazer a prova se tivesse ido ao show. Terminou muito tarde, e eu precisava acordar cedo.

Mesmo relutante, Charlie conseguia sentir a sinceridade em suas palavras.

— Você nunca dá valor ao que eu faço. Eu sempre valorizo você. Sua presença era importante. Tinham olheiros lá, e eu não tocava há meses.

— Eu sei, sinto muito. Vamos comemorar! Sei que você sempre arrasa. Amo ver meu rockstar tocar.

Ele deu um sorriso contido, quase imperceptível e ela o abraçou, tentando animá-lo.

— Está bem. Você pode dormir aqui em casa hoje?

Perguntou ele.

— Posso. Você quer um beijinho, né?

— Eu quero mais que isso.

Respondeu, com um sorriso malicioso.

— Hoje, meu artista favorito, de quem sou a fã número um, merece tudo.

Disse Kelly, beijando-o apaixonadamente.

No dia seguinte, Kelly estava cansada na faculdade depois de passar a noite toda com Charlie. Seus amigos fizeram brincadeiras, sugerindo que a noite tinha sido bem aproveitada e ela, embora tentasse ignorar, acabou sorrindo junto com eles, corando levemente. Durante a aula, passou boa parte do tempo rememorando os momentos com Charlie, até ser interrompida por uma cutucada da amiga, que a fez perceber, num susto, que o professor a estava observando com ar de reprovação.

Na faculdade, havia um garoto chamado Daniel, que sempre estava nas mesmas aulas que Kelly. Ele chamava atenção pela frieza e era considerado bizarro pelos colegas. Apesar de ser bonito, era descuidado: usava roupas escuras e velhas, não cuidava da aparência, mantinha a barba por fazer e o cabelo sempre bagunçado, como se tivesse acabado de acordar, ou como se não se importasse com o que os outros pensavam.

Daniel quase não falava, e muitos alunos sentiam arrepios só de passar perto dele. Vendia drogas na faculdade, discretamente, mas não tão discretamente assim, e, de vez em quando, parecia alterado, o que o tornava alvo constante de chacotas. Os colegas diziam que ele tinha “perdido os neurônios” de tanto usar drogas e zombavam de sua aparente falta de inteligência nas aulas, embora, em raros momentos, demonstrasse flashes de lucidez assustadora.

Daniel era o mais velho da turma, com vinte e cinco anos, enquanto a maioria dos alunos tinha entre dezoito e vinte e dois. Repetente, ele já poderia ter se formado, mas suas notas eram terríveis, e seu desinteresse parecia deliberado. Mesmo com sua má fama, tentava se aproximar de Kelly, mas nunca tinha sucesso. Muitas vezes, passava a aula inteira observando-a, sem prestar atenção na matéria.

Quando estava desanimado, lembrava-se dela e isso bastava para se motivar a ir à faculdade. No entanto, Kelly estava sempre cercada por amigos, o que dificultava qualquer aproximação. Um dia, Daniel decidiu investigar a vida dela pelas redes sociais e descobriu que ela fazia aulas de dança em uma escola próxima à faculdade. Sem hesitar, matriculou-se na mesma turma, buscando um contato mais direto e talvez, quem sabe, uma chance de ser visto por ela não apenas como um colega de sala, mas como alguém real, alguém além da sombra que todos insistiam em projetar sobre ele.

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