Capítulo 17 - A Verdade sobre a Noite Fatídica

O ambiente em casa estava cada vez mais pesado. Lucas mal olhava na minha direção, e as noites vazias, com ele dormindo fora, tornavam a distância entre nós quase insuportável. A indiferença dele me consumia, mas eu precisava ser forte. Havia uma vida crescendo dentro de mim, e eu não podia mais adiar essa conversa.

Decidi que era hora de contar tudo. Fui até Mila e Dona Ester para pedir algo importante:

— Por favor, não contem nada ao Lucas sobre o bebê. Quero que ele ouça de mim.

Mila segurou minha mão, compreensiva.

— Claro, querida. Ele precisa saber isso diretamente de você.

— Estamos com você, Lívia — acrescentou Dona Ester. — Mas seja firme.

Assenti, agradecida, mas nervosa. Meu coração estava acelerado. Tinha medo da reação de Lucas, mas sabia que não poderia mais adiar.

Naquela noite, Lucas chegou em casa mais cedo do que o habitual. Ele parecia desconfortável, como se algo o incomodasse profundamente. Sentou-se no sofá da sala e passou as mãos pelos cabelos, em um gesto de cansaço.

Eu me aproximei lentamente, respirando fundo antes de falar:

— Lucas, precisamos conversar. É importante.

Ele levantou o olhar, mas não conseguiu sustentar o contato visual por muito tempo.

— Tudo bem. Sobre o que é? — perguntou, com um tom distante.

Era evidente que ele estava sem graça, talvez até com remorso por ter me ignorado durante semanas. Mas, ao mesmo tempo, eu sabia que ainda havia dúvidas em sua mente, alimentadas por Francine.

Sentei-me na poltrona em frente a ele, cruzando as mãos no colo para controlar o tremor. Decidi ir direto ao ponto.

— Lucas... eu estou grávida.

Por um instante, o tempo pareceu parar. Ele me olhou de cima a baixo, como se estivesse tentando entender o que eu havia dito. Sua boca abriu levemente, mas nenhuma palavra saiu. Então, finalmente, ele gaguejou:

— Ga-Grávida?

Eu apenas assenti, observando sua reação.

Ele se levantou, andando de um lado para o outro pela sala, até que parou abruptamente e se virou para mim.

— Grávida... Em uma única noite? Lívia, você está no final da graduação de Medicina e não sabe como se prevenir?

As palavras dele eram como facas. Meu coração apertou, mas ele continuou.

— Fez isso de caso pensado, Lívia? Isso foi um plano? Francine tem razão sobre você!

Senti as lágrimas escorrerem pelo meu rosto antes que pudesse conter as mesmas.

Levantei-me de repente, encarando-o com toda a dor que carregava.

— Como você tem coragem de dizer isso, Lucas?

Ele tentou falar algo, mas eu o interrompi, a voz embargada pelas lágrimas.

— Eu não tive culpa se você foi drogado naquela noite! Eu só tentei te ajudar, Lucas! O que aconteceu entre nós foi consentido, sim, mas você me beijou primeiro!

Lucas ficou parado, me olhando com surpresa.

— Eu nunca tinha beijado um homem na minha vida antes daquela noite, Lucas. Nunca! Você foi meu primeiro em tudo... beijo e sexo.

Minha voz falhou, e eu precisei respirar fundo antes de continuar.

— Eu te amei naquela noite, mesmo sabendo que você não se lembraria. Mesmo sabendo que para você, provavelmente, não significaria nada.

As palavras pareceram atingir Lucas como um raio. Ele ficou em silêncio, encarando o vazio, enquanto flashes daquela noite invadiam sua mente.

A sensação do beijo, o calor dos corpos juntos, a suavidade de cada momento... Ele não conseguia lembrar dos detalhes, mas sabia que algo naquela noite tinha sido especial. Então, a lembrança do sangue no lençol surgiu em sua mente, como uma prova inegável.

Ele olhou para mim, os olhos cheios de dúvidas e arrependimento.

— Lívia... eu...

Mas eu o interrompi, incapaz de ouvir qualquer outra acusação.

— Eu sei que você não lembra de tudo, e eu não espero que você se lembre. Mas não vou permitir que você ou Francine me tratem como se eu fosse alguém que armou tudo isso.

Limpei as lágrimas com as costas da mão e olhei diretamente nos olhos dele.

— Quero o divórcio, Lucas.

Ele ficou imóvel, como se não acreditasse no que havia acabado de ouvir.

— Divórcio?

— Sim. Você está com Francine, casou comigo obrigado por sua família e eu tenho medo do que ela possa fazer comigo ou com o bebê para me prejudicar

— Lívia, espera...

Eu levantei a mão, interrompendo-o novamente.

— A minha e a sua família já sabe de tudo, Lucas. Eu não vou continuar nesse casamento, sabendo que você não confia em mim e que sua prioridade é outra mulher.

Lucas parecia perdido, tentando encontrar palavras que não vinham.

Sem esperar por uma resposta, virei-me e caminhei em direção ao meu quarto no final do corredor. Senti o peso de seus olhos em minhas costas, mas não olhei para trás. Fechei a porta, deixando-o sozinho, mergulhado em suas dúvidas e incertezas.

Fiquei sentada na cama, com as mãos repousando sobre meu ventre enquanto as lágrimas voltavam a cair. Eu não sabia o que esperar daquele momento em diante, mas sentia que finalmente tinha colocado tudo para fora.

Enquanto isso, Lucas permaneceu na sala, processando cada palavra que eu havia dito. Ele não conseguia tirar da cabeça o que eu dissera sobre a noite em que estivemos juntos. Algumas memórias voltavam como flashes, mas havia lacunas que ele não conseguia preencher.

Algo não fazia sentido. Ele começou a perceber que as acusações de Francine contra mim eram exageradas, talvez até serem inventadas. Decidiu que precisava descobrir a verdade por conta própria.

Nos dias seguintes, Lucas começou a observar Francine com mais atenção. Cada palavra parecia carregada de intenções ocultas, e ele começou a desconfiar de tudo. Ao mesmo tempo, passou a observar a mim também, em silêncio.

Percebeu como eu continuava a cumprir minha rotina no hospital, mesmo diante de todo o estresse. Ele via a força em meus olhos, a maneira como tratava as pessoas com bondade, mesmo quando ele próprio não merecia.

E, pouco a pouco, Lucas começou a perceber que talvez ele tivesse cometido um erro ao deixar que as mentiras de Francine escureceram quem eu realmente era.

Enquanto Lucas mergulhava nas dúvidas, eu tentava me preparar para o que viria a seguir. Meu foco agora era o bebê. Eu não sabia como ele reagiria, mas tinha certeza de uma coisa: não deixaria ser derrubada.

Com o coração pesado, mas determinado, sabia que estava pronta para enfrentar o que viesse. Afinal, eu já havia sobrevivido à aquela noite fatídica. Sobreviveria a isso também.

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