Ela saiu.
Eu consigo ouvir os passos dela se afastando pelo corredor. O som da porta se fechando atrás de Laura é como um soco no peito, silencioso, mas devastador. Eu não posso vê-la, não posso alcançá-la, e isso está me destruindo lentamente. Preso aqui, nesse corpo que não me obedece, a única coisa que me resta são os pensamentos, e eles estão me sufocando.
Por que eu continuo assim? Por que não consigo simplesmente acordar? Lutar? Eu sinto vontade, sinto o desejo de gritar, de dizer a ela que estou aqui, que não desisti. Mas tudo o que consigo fazer é ficar em silêncio. E, enquanto isso, vejo o mundo ao meu redor seguir em frente sem mim. Laura está seguindo em frente sem mim.
Seis meses.
Parece uma eternidade. Seis meses ouvindo as visitas de Laura, as conversas dela com o médico, os pequenos suspiros de cansaço que ela solta quando pensa que ninguém está ouvindo. O cansaço está escorrendo pela voz dela agora. Eu posso sentir isso. Ela está exausta, e não posso culpá-la. Não depois de tudo o que eu fiz.
O som da voz do médico ainda ecoa na minha mente. Ele está se aproximando de Laura. Eu sei. Eu percebo a maneira como ele fala com ela, como tenta confortá-la. Como se eu não estivesse aqui. Como se eu já estivesse morto.
Será que estou?
A ideia me apavora. Talvez, de alguma forma, eu já tenha perdido a única pessoa que ainda se importa comigo. E o pior de tudo é que, se isso aconteceu, foi por minha culpa. Eu fui o idiota. Eu a empurrei para longe, tornei a vida dela um inferno, e agora, quando mais preciso dela, quando tudo o que desejo é dizer que sinto muito, que me arrependo... não consigo fazer nada. Eu estou preso aqui, em uma prisão de carne que não responde.
Eu nunca fui de demonstrar meus sentimentos. Sempre preferi manter uma distância segura, uma barreira entre mim e os outros. Era mais fácil assim. Não precisava lidar com a fragilidade das emoções, não precisava mostrar fraqueza. E Laura... ela sempre foi a exceção. Mesmo quando eu a tratava mal, ela permanecia lá, como se acreditasse que havia algo de bom em mim. Algo que nem eu conseguia ver.
Mas agora... será que ela ainda acredita nisso?
A conversa que ela teve com o Dr. Leonardo ainda ressoa na minha cabeça. “Você não precisa carregar isso sozinha.” Ele disse isso a ela, e a maneira como ele falou... eu conheço aquele tom. Eu já usei esse tom antes. Não em Laura, claro, mas em outras. Quando queria conquistar algo, quando queria quebrar defesas. Ele está tentando tomar meu lugar.
O pensamento me deixa furioso, e por um segundo, parece que o corpo responde. Eu sinto uma faísca, um pequeno movimento involuntário. Será que foi real? Ou será apenas a minha mente criando ilusões?
Laura merece mais do que eu dei a ela. Sempre mereceu. Eu sabia disso desde o início, mas, por orgulho, nunca admiti. Agora, deitado aqui, tendo que ouvir tudo e incapaz de agir, sinto o peso do que eu fiz. Cada palavra fria, cada vez que a ignorei, cada momento que preferi o trabalho a ela. Eu construí muros, e agora estou preso dentro deles.
Eu costumava pensar que o sucesso era tudo. Que ser o melhor, ser imbatível nos negócios, me tornava invulnerável. E, por algum tempo, funcionou. Eu conquistei tudo o que queria. Dinheiro, poder, respeito. Mas, de alguma forma, perdi o que realmente importava. Eu perdi Laura.
Ela me amava, eu sei disso. Mas, de alguma forma, eu não fui capaz de retribuir esse amor. Talvez porque eu nunca soube como. E agora, vejo que ela está cansada. Cansada de mim, cansada de carregar esse casamento sozinha.
O médico é a personificação de tudo o que eu não fui. Atencioso, presente, compreensivo. Ele oferece a ela algo que eu nunca ofereci: apoio. E, por mais que isso me machuque, eu não posso culpá-la por se sentir atraída por isso.
Mas o que mais me aterroriza é o pensamento de que, se eu não acordar logo, se eu não conseguir lutar contra essa prisão que meu corpo se tornou, eu vou perdê-la para sempre.
Eu não sei como fazer isso. Não sei como sair desse limbo. Mas algo dentro de mim começa a despertar. Um desejo, uma necessidade urgente de me levantar, de abrir os olhos, de dizer a ela que ainda estou aqui. Que não desisti. Que não posso perdê-la.
Eu preciso de um sinal. Algo, qualquer coisa, que me mostre que ainda há tempo. Que ainda posso consertar tudo.
De repente, sinto algo molhado escorrer pelo meu rosto. Não consigo mover os músculos, não consigo ver, mas sinto a lágrima deslizar lentamente pelo canto do meu olho. Ela é involuntária, um reflexo do desespero, mas é real. É o único movimento que consegui em meses. Talvez, finalmente, meu corpo esteja começando a responder. Talvez, depois de todo esse tempo, eu esteja acordando.
Por favor, Laura, não desista de mim ainda.
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Atualizado até capítulo 25
Comments
Joana Moura
oh leitura angustiante.
2024-09-22
2