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Cansado, a começar a entrar em desespero acabei por adormecer na wc. Horas depois, já devendo com certeza ter anoitecido ouvi a voz de Kayo perto de mim.

Vem ajudar-me e adormece, não haja dúvida que estou bem entregue...

Abri os olhos e dei de caras com ele: já tinha melhor aspecto e pelo menos já estava de novo a reclamar, isso só podia querer dizer que já estava restabelecido. Levantei-me do chão e tirei os óculos para os limpar.

Ficas com um ar super intelectual de óculos, mas prefiro-te sem óculos.- comentou Kayo com a maior calma do mundo fazendo-me parar de limpar os óculos às pontas da minha camisa.

Sinceramente não sei como te responder a isso...- respondi e sem conseguir evitar sorri pela primeira vez em algum tempo.

Eh lá!- ele exclamou dando um pulinho- Ele afinal não é de pedra!

Cala-te!- disse disfarçando. - Hoje ficas de folga, mas amanhã vamos para o terreno, estamos a perder muito tempo de treinamento e estou a sobrecarregar os meus colegas de tanto trabalho.

Mas hoje não temos mais nenhuma alma para ir buscar?

Penso que não.

Podes ver?

Fui buscar o meu caderno e passei os dedos nas lombadas. Apareceram os mesmos nomes.

Estranho. Já alguém os deveria ter ido buscar.- comentei começando a ficar preocupado.

Podemos ir nós?

Vou falar com o Yuri.

Peguei no telemóvel e marquei o número de Yuri.

Já sei, já sei, ninguém os foi recolher!- gritou mal atendeu a minha chamada.

Olá para ti também. Sim, ninguém foi ainda. Ele já está melhor.Penso que posso ir.

Fantástico! Não havia mais nomes sem ser esses?

Por enquanto...

-...acho que devias ver isto...- interrompeu-me Kayo apontando para o caderno que agora estava cheio de nomes.Havia pelo menos vinte nomes e eu era só um mais um aprendiz que nunca tinha ido para o terreno.

O caderno está cheio de nomes Yuri!- exclamei aflito.

Houve um descarrilamento no metro de superfície. Temos centenas de feridos, mas pelo menos cinquenta morreram. Todos foram divididos pelos hospitais da zona, mas devido ao trabalho a acumular uns ficaram piores do que outros. Preciso mesmo que lá vás!

Mas tenho ele comigo, ele é só um aprendiz.

Ótimo dia para ir para o terreno, não achas?- disse ele desligando logo de seguida a chamada.

Fiquei parado durante algum tempo sem reação.

Tens de ir recolher aquelas almas todas?- perguntou Kayo vestindo o blazer e ajeitando a gravata ao espelho.

Sim. Houve um acidente. Preciso que vejas como eu faço e não me atrapalhes.

Prometo que só vou tentar ajudar.

Não atrapalhes.- voltei a repetir. Peguei no meu blazer e meti-o debaixo do braço. Naquele momento não havia espaço para estilo.

Saímos do apartamento de Kayo e passámos por Kira no corredor.

Vais para lá?- perguntou-me ele mal me viu.

Sim. Tenho o caderno cheio de nomes e sou só um. Tenho de levar aqui o novato comigo...não quero pensar em como vai ser.

Não sei se já reparaste, mas o novato está aqui.- resmungou Kayo.

Ignorei-o completamente, despedi-me de Kira, que ia só trocar de roupa e ia voltar também para o terreno e puxei ele até ao elevador mais próximo.

Sem janela?- perguntou ironicamente enquanto entrávamos.

És capaz de estar calado dois segundos?!- exclamei já irritado.

Do nada senti uma mão que me empurrava contra a parede do elevador: era Kayo.

Não, não me quero calar. O que vais fazer em relação a isso?- ele estava cada vez mais próximo de mim, tão perto que eu conseguia sentir o cheiro dele, aquele cheiro a canela que eu amava nele. Instintivamente fechei os olhos para sentir o cheiro e todo o meu corpo reagiu a ele.

Pára.- sussurrei. - Sou teu supervisor.

E?- disse ele desta vez quase com a boca a encostar no meu pescoço.

Não podes fazer isso.- voltei a falar enquanto tentava a todo o custo não ficar duro por estar tão perto dele.

Poder posso, resta é saber se queres ou não...- abri os olhos assim que ouvi o barulho das portas do elevador a abrirem e empurrei-o saindo rapidamente. Kira já estava cá em baixo.

Caramba que tu vens com uma cara...- atirou mal me viu.

Nem me digas nada.- só pedi fazendo sinal para seguirmos, mas antes Kayo puxou-me por um braço.

Esta conversa não acabou.

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