No dia seguinte, com olheiras profundas e olhos vermelhos de tanto chorar, Celma entrou no consultório da Dra. Marília, uma psicóloga recomendada por uma colega de trabalho. Ao cruzar a porta, sentiu uma mistura de esperança e nervosismo. O ambiente era acolhedor, com tons suaves e uma iluminação agradável. Quadros com paisagens serenas adornavam as paredes, e o aroma de lavanda preenchia o ar.
Naquela manhã ensolarada, Celma havia decidido procurar um psicólogo. Ela precisava de alguém com quem pudesse falar antes que perdesse a sanidade mental, alguém que não a julgasse.
Celma entrou na sala de espera do consultório e sentou-se, as mãos tremendo ligeiramente. Após alguns minutos, a secretária a chamou.
— Senhora Celma Rodrigues? O doutor já pode atendê-la.
— É um Dr.? — perguntou Celma, tentando esconder o nervosismo na voz.
— Desculpe, esprecei-me mal é a Dra. Prata, conforme solicitado que queria uma mulher — respondeu a secretária, com um sorriso reconfortante.
Celma se levantou e caminhou em direção à porta, sentindo um nó na garganta. Quando entrou no consultório, a psicóloga, Dra. Marília Prata, levantou-se e a cumprimentou com um sorriso acolhedor.
— Bom dia, Celma. Eu sou a Dra. Marília. Fique à vontade — disse a psicóloga, com um sorriso gentil, apontando para uma poltrona confortável.
Celma sentou-se, tentando controlar o tremor em suas mãos. Respirou fundo, olhando para a mulher à sua frente. Dra. Marília tinha uma expressão acolhedora, e seu olhar transmitia uma calma que Celma tanto precisava.
— Obrigada por me receber, doutora. Eu... eu não sei por onde começar — disse Celma, a voz vacilante.
— Comece pelo que está mais difícil para você neste momento. Estou aqui para ouvi-la, sem julgamentos — respondeu Dra. Marília, com um tom encorajador.
Celma sentiu um nó se desfazer em sua garganta. As palavras começaram a fluir, cada uma carregada de dor e medo.
— Eu não consigo dormir. Toda noite é um pesadelo. Tenho medo de ser tocada, qualquer homem que se aproxima me dá pavor. Eu... eu sinto nojo. Não suporto a ideia de alguém me tocar — disse Celma, lágrimas escorrendo pelo rosto.
— Há quanto tempo você vem vivenciando esses pesadelos? Existe uma origem específica para eles? — perguntou Dra. Marília, com delicadeza.
Depois de um silêncio que pareceu durar uma eternidade, Celma respondeu às perguntas, contando o período e, pela primeira vez, desabafando toda a verdade que escondia consigo. Falou do estupro pelo ex-marido Hugo, falou do seu amor por ele, suas traições e como o seu casamento foi arruinado. Contou à Dra. Marília a origem de tudo.
Dra. Marília inclinou-se ligeiramente para a frente, mantendo um contato visual acolhedor.
— Isso é compreensível, Celma. Você passou por uma experiência traumática, e seu corpo e mente estão reagindo a isso. Vamos trabalhar juntas para entender esses sentimentos e encontrar maneiras de lidar com eles — disse a psicóloga, em um tom suave.
Celma assentiu, sentindo-se um pouco mais aliviada por ter compartilhado sua dor.
— Tenho sustos noturnos. Qualquer barulho me assusta. E Lucas... eu não sei como lidar com ele. Ele é meu amigo, mas eu não consigo ficar perto dele sem sentir medo — confessou Celma, a voz trêmula.
— Lucas é alguém em quem você confia? — perguntou Dra. Marília, com interesse.
— Sim, confio. Ele é meu melhor amigo, mas desde que tudo isso aconteceu, eu... eu me afasto dele. Tenho medo de que ele queira mais do que eu posso dar agora — respondeu Celma, olhando para o chão.
Dra. Marília assentiu, compreendendo.
— É importante que você comunique esses sentimentos a Lucas. Ele precisa entender pelo que você está passando para poder apoiá-la da melhor forma. Vamos trabalhar na construção dessa comunicação, para que você possa expressar seus limites e necessidades de maneira clara — sugeriu a psicóloga.
Celma levantou os olhos, encontrando consolo na compreensão de Dra. Marília.
— Eu não sei se consigo, doutora. Sinto-me tão fraca, tão... quebrada — admitiu Celma, com um suspiro pesado.
— Você é mais forte do que pensa, Celma. Reconhecer suas fragilidades e procurar ajuda já é um sinal de grande força. Vamos passo a passo, ok? — disse Dra. Marília, sorrindo de maneira encorajadora.
As sessões com a Dra. Marília tornaram-se uma âncora para Celma. A cada encontro, ela se permitia abrir um pouco mais, explorar suas dores e medos, e encontrar maneiras de reconstruir sua vida. Mas as noites ainda eram difíceis. Em uma dessas noites, Celma teve um pesadelo particularmente angustiante.
No sonho, ela estava presa em um quarto escuro. Ouviu passos pesados se aproximando, o coração disparado em seu peito. Tentou gritar, mas nenhum som saía. Quando a porta se abriu, ela acordou com um grito estrangulado, os olhos arregalados de terror.
— Não... Para, por favor! — gritou, despertando.
O quarto estava vazio, mas o medo era real. Abraçou os joelhos, balançando-se lentamente, tentando acalmar a mente. Sentia-se sozinha, aterrorizada pelo silêncio da noite.
Quando dia clareada e o sol começava a nascer, Dona Teresa ligou para Lucas. Ele ainda estava dormindo em seu apartamento quando o som do celular o despertou. Espreguiçando-se, esticou o braço para alcançar o celular, e ficou surpreso ao ver o nome no ecrã tão cedo.
— Olá, Dona Teresa — atendeu Lucas, com a voz ainda sonolenta.
— Bom dia, filho, desculpe pela hora! — disse Dona Teresa.
— Não tem problema, Dona Teresa, eu já estava quase acordando — respondeu Lucas, tentando soar mais acordado.
Dona Teresa pediu a Lucas que conversasse com Celma, para ver se ela se abriria com ele como amigo, pois nos últimos dias ela quase não dormia. Por volta das sete e meia, o carro de Lucas estacionou em frente à casa dos pais de Celma no bairro 21 de Julho. Quando a família Rodrigues terminou o café da manhã, o toque da porta despertou Sr. Augusto, que lia seu jornal na sala.
— Olá, Dona Teresa — atendeu Lucas, com a voz ainda sonolenta.
— Bom dia, filho. Desculpe pela hora! — disse Dona Teresa, com um tom de desculpas.
— Não tem problema, Dona Teresa. Já estava quase acordando mesmo — respondeu Lucas, tentando disfarçar o cansaço.
— Lucas, será que você poderia conversar com a Celma? Ela tem estado muito abalada ultimamente, quase não dorme. Estou preocupada — pediu Dona Teresa, com um suspiro preocupado.
— Claro, Dona Teresa. Passo aí mais tarde — prometeu Lucas, já se levantando da cama.
Quando o relógio marcou sete e meia, o carro de Lucas estacionava em frente à casa dos pais de Celma, no bairro 21 de Julho. A família Rodrigues havia terminado o café da manhã, e o toque da porta despertou Sr. Augusto, que lia seu jornal na sala.
— Teresa, a porta! — gritou Sr. Augusto, chamando pela mulher.
Na cozinha, Dona Teresa saiu aos murmúrios.
— Oh, Augusto, estou na cozinha lavando a louça. Não pode abrir para mim? — respondeu ela, levemente irritada.
Sr. Augusto sorriu enquanto a esposa foi até a porta.
— Bom dia, Lucas — saudou Dona Teresa ao abrir a porta.
— Bom dia, Dona Teresa. — Lucas entrou e cumprimentou Sr. Augusto. — Celma está no quarto?
— Está sim, se arrumando. Pode subir — respondeu Dona Teresa.
Lucas dirigiu-se até o corredor e parou na porta do quarto de Celma, que estava entreaberta. Ele tocou suavemente na porta, mas o som não foi suficiente para ela ouvir, pois estava no banheiro.
— Celma? — chamou Lucas, entrando no quarto e se sentando no sofá.
— Já estou saindo, Lucas — respondeu ela, a voz abafada pelo barulho do banheiro.
— Está tudo bem? — perguntou Lucas, ao ouvir sons que indicavam alguém passando mal.
— Está sim, só um instante — respondeu Celma, saindo do banheiro com uma toalha limpando o rosto. — E aí, Lucas? Não está atrasado?
— Estou, mas tive de passar na casa da minha mãe primeiro. Você sabe como é a Dona Margarida — respondeu Lucas, sorrindo. — Sua mãe me ligou cedo. Está preocupada contigo.
Celma tentava manter uma distância de Lucas, e o receio e medo eram visíveis em seus olhos.
— Está tudo bem, Celma? — perguntou Lucas, preocupado.
— Só estou um pouco cansada — respondeu ela, evitando contato visual.
— Dona Teresa me contou que você tem tido pesadelos terríveis e que mal tem dormido à noite — disse Lucas, com preocupação evidente.
Celma hesitou antes de responder.
— Eu... eu não sei, Lucas. As noites são horríveis. Eu sinto tanto medo — confessou Celma, a voz tremendo.
Lucas se aproximou lentamente, enquanto Celma recuava, mantendo uma distância respeitosa.
— Sua família está preocupada contigo e eu também. Por que você não fala daquela noite? Estou aqui para você, Celma. Não precisa ter medo. — disse Lucas, suavemente.
Celma olhou para ele, as lágrimas ameaçando cair novamente.
— Não há nada mais para falar daquela noite, Lucas. O que você ainda não sabe? Hugo tentou tirar a própria vida diante de mim — admitiu Celma, a voz carregada de dor.
Lucas assentiu, compreendendo.
— Eu sei disso, foi o que você nos contou. Será só mesmo isso? Eu só quero estar ao seu lado, como seu amigo. Vou respeitar seus limites. Não precisa ter medo de mim — disse Lucas, os olhos fixos nos dela.
Celma sentiu uma onda de alívio e gratidão.
— Obrigada, Lucas. Eu sei que posso contar contigo — disse Celma, com um sorriso tímido.
Lucas sorriu de volta, aliviado por ver um vislumbre de esperança nos olhos de Celma.
— Sempre estarei aqui para você, Celma. Não importa o que aconteça — disse Lucas, com firmeza.
Os dias seguintes foram uma batalha constante, mas Celma sentia que estava começando a encontrar seu caminho. As sessões com Dra. Marília continuavam a ajudá-la a lidar com seus traumas e a reconstruir sua confiança.
Uma tarde, durante uma das sessões, Celma compartilhou um avanço significativo.
— Dra. Marília, tive um sonho diferente na noite passada. Eu estava em um campo de flores carregando um bebê lindo em meus braços, e não senti medo. Foi a primeira vez que não acordei assustada — disse Celma, com um sorriso tímido.
Dra. Marília sorriu de volta, contente com o progresso.
— Isso é maravilhoso, Celma. Significa que sua mente está começando a encontrar paz novamente. Continue focando nas coisas que trazem conforto e segurança para você — disse a psicóloga, com encorajamento.
Celma sentiu uma onda de esperança. Sabia que ainda havia um longo caminho pela frente, mas estava começando a acreditar que poderia encontrar a paz que tanto desejava. Com a ajuda de Dra. Marília, o apoio de Lucas e a força que descobria dentro de si mesma, Celma estava pronta para enfrentar as sombras da noite e, eventualmente, encontrar a luz do dia novamente.
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Atualizado até capítulo 62
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