Capítulo 3

Brasil 🇧🇷

Helena

Eu não sei quantos dias ou horas já se passaram que estou parada, sentada no sofá ao meio da sala esperando alguma notícia se quer de Bruna. As lágrimas secaram, junto com o meu coração que está em pedaços, mal o sinto, as batidas já não importam mais. Abaixo a cabeça. Só de lembrar do sorriso dela, do jeito alegre de ser, de suas palhaçadas... Eu não consigo. Eu não consigo continuar sem minha irmã.

Não foi fácil quando perdi meus pais. Eu era um pouco mais velha que Bruna e me vi numa situação que quase paralisei. Uma depressão imensa invadiu meu peito, ansiedade, angústia, não sabia como eu conseguiria cuidar da minha irmã sem eles, sem a nossa base, sempre foram tudo pra mim. Nossa avó Bené nos pegou para criar. A vida não foi fácil com ela. Uma senhora muito trabalhadora, muito esforçada mas extremamente rígida. Isso também ajudou ainda mais os meus medos e anseios evoluírem. Ela nunca soube ser de outro modo, mas a amo assim mesmo. Ela é nossa referência de mulher forte. Perder a filha assassinada não foi fácil, e agora a neta desaparecida. Está seguindo a base de remédios fortes. Continua trabalhando, continua seguindo sua rotina, só que sem o brilho de antes, está apática, apagada. Eu juro por Deus que eu faria de tudo para resolver isso e vê-la feliz novamente.

A campainha toca. Limpo meu nariz na roupa mesmo, seco as lágrimas e logo estou a abrir a porta.

—Lena, você está horrível!

Bia, uma das amigas de infância de Bruna entra sem ser convidada. Eu sei que estou horrível, com meu cabelo preso ao coque frouxo, não preciso que ninguém me fale isso.

—Quem você pensa que é para sair entrando na minha casa? -bato a porta. —Foi por causa de você e dessas suas amiguinhas que a minha irmã sumiu, ela estava com vocês naquela noite.

—Lena... calma. -arqueia os braços.

—Não me mande ter calma!

—Helena!

Vó Bené aparece a porta. Olho desconfiada. Ainda agora eu tinha lhe dado um remédio para dormir.

—Vó nao era para levantar, tem que esperar o remédio fazer efeito.

—Eu não tomei aquele caralho que você me deu. ‐balanço a cabeça em negação. —Não vou ficar dormindo esperando sua irmã aparecer.

—Foi você que chamou ela?

—Sim.

Faço um chiado a boca.

—Vou ir para meu plantão. -viro as costas.

—Espera Helena! -fecho os olhos. —Beatriz sabe que errou, que não deveria estar meia noite, aos 16 anos, num baile funk, bebendo, fumando, usando droga. Mas ela se arrependeu! -fala rígida. Olho para Bia que abaixa a cabeça. —Ela sabe que não foi certo, mas isso ela resolve com os pais dela. Quem não tem pai e mãe para resolver, é você e sua irmã, e eu sou responsável por Bruna. -suspiro fundo. —Ela tem informações sérias, que vão nos ajudar a saber o que aconteceu naquela noite, então cala essa boca e senta. As duas.

Solto outro suspiro. Vó Bené me olha séria. Não posso deixar de me irritar estando ao lado de uma das pessoas que sumiu com minha irmã.

—Eu não ajudei a sumir com sua irmã, se é isso que tá pensando Lena.

—O que houve naquele dia então Beatriz? -abro os braços. —O que você tem para nos contar?

//

Bruna

O sol invade as janelas sem pena. O clima aqui é bem quente por sinal, parecido com o Brasil só que mais seco. Não sei muito ainda, não tive a oportunidade de andar por aqui. Reviro os olhos com o pensamento. Para que eu estou pensando nisso, se a única coisa que eu quero é ir embora desse lugar. Com toda a tensão de ontem, mal consegui analisar o quarto que estou. As paredes são de cor bege e azul, com os desenhos tradicionais na cor branca. Móveis rústicos, tapete vermelho com pinturas, e uma pequena divisão como se fosse um biombo no meio do quarto separando a cama do banheiro privado. Os lençóis, meu Deus. O que dizer desses lençóis? Nunca vi algo tão macio na minha vida, é como deitar literalmente em pelos de cordeiro.

Espreguiço-me. Estou a vestir uma espécie de túnica branca que eu detestei. Nunca que na minha vida iria usar isso, só estou a usar pois a minha roupa estava fedorenta de bebida e de algum produto que eu não soube identificar o que. Caminho até o banheiro que aliás é muito chique, bem maior do que todo cômodo do meu barraco. Escovo os dentes com o dedo mesmo, pois não há nenhuma escova nova a vista. Gargarejo e logo estou ao quarto novamente.

Há muitos cômodos e gavetas aparentemente "velhas" aqui, decido vasculha-las. Há muitos papéis, coisas escritas em árabe que não entendo uma palha. Encontro uma agenda marrom, trancada com cadeado. Hmm,  deve ser importante. Passo levemente as mãos sobre a capa dura, há desenhos que não consigo identificar, são como listras grossas. Deixo de lado.

Em meio a minha expedição, encontro uma tesoura de aço, franzo o cenho. Olho para minha túnica. Isso daria um belo vestido. Retiro o traje que estou a usar. Dou graças por sempre ter me interessado pela costura, amo recriar peças novas em cima de outras. Faz alguns anos que minha avó tinha me colocado no curso de corte e costura, mas nunca pensei em tornar isso algo profissional, é como passar tempo, eu me sinto bem.

Estico o tecido na cama. Começo a cortar os braços arrancando as mangas, deixando como se fosse uma regata. Na gola, corto em um decote, o deixando em tamanho mediano, gosto de ressaltar meu colo, meus seios não são tão grandes, mas tem um belo tamanho. Na barra do vestido deixo em um comprimento de cinco dedos acima do joelho. O levanto.

Está perfeito!

//

Decido ir tomar banho. A ducha é muito boa, grande e forte. Ain. O chuveiro é quentinho. A água escorre por meu corpo, com ele, lavo junto toda a angústia de ontem, todo o medo. É difícil, eu ainda não sei bem com quem eu estou lhe dando. Um assassino? Um psicopata? Na minha mente só passa as piores coisas. Balanço a cabeça, é melhor eu esquecer isso e tentar ver o melhor plano para que eu possa me livrar dessa. Estou nua e sem roupas literalmente. Nao tenho nada, o vestido da festa está podre e a única lingerie era a que eu usava, obviamente não colocarei novamente.

Ainda no banheiro, penteio meus cabelos, eu os amo, são muito bem cuidados. A escova cai ao chão, reviro os olhos, sou muito desastrada mesmo, na minha vida inteira fui assim. A pego descendo o corpo minimamente. Quando levanto, solto um grito arranhando a garganta. Ihab me olha fixamente. Tento me cobrir colocando as mãos aos seios e na parte íntima. Ele fala algo em árabe que obviamente não entendo, fecha a porta imediatamente.

Arfo, com a mão ao peito suspiro pesado. Como esse infeliz entrou em meu quarto e nem ao menos percebi? A quanto tempo estava aqui...

//

Desço apressada, estou morrendo de fome. Logo vejo os funcionários posicionados ao pé da mesa, incluindo dois homens que não vi quando cheguei. Tenho o desprazer de ver Ihab sentado, pensei que já pudesse ter saído para sei lá onde, ainda estou constrangida em ter o pego me vigiando. Aceno para Nádia que retribui um tanto desconfortável, não entendo o porquê. Sento-me a mesa.

—Mas que palhaçada é essa! -em um pulo levanto ao estrondo que Ihab faz a mesa. Todos se assustam. Café, bandeijas, sucos caem todos ao solo. —Que porcaria está usando?

—Minha roupa?

—Esse pedaço de pano ridículo! -levanta alterado.

—Ah! -reviro os olhos. —O que tem de errado?

—Não tem vergonha! -rapidamente ele tira seu terno e o joga por cima de mim. —Não tem modos, não me respeita, não respeita minha casa! Mas agora você vai aprender a me respeitar então!

Fico sem entender nada até que reparo que meus seios estavam super a mostra no tecido transparente, não tinha visto isso. Solto um grito, meu corpo é levantado, estou por cima de Ihab. Sinto minha bunda aparecer, grunho quando recebo um belo tapa.

—Ihab!

Com toda velocidade sobe as escadas, em um estrondo abre a porta de meu quarto. Joga-me a cama sem nenhuma delicadeza.

—Aqui não é bagunça igual seu país! laenat aimra'atin. -maldita mulher!

—Eu não fiz porcaria nenhuma!

—Me humilhou na frente dos meus funcionários, você acha pouco? Ontem não fiz nada, mas hoje não... Hoje você vai sentir o peso da minha mão!

Senta a cama, puxa meus pés e envolve meu corpo ao seu. Arregalo os olhos quando vira minha bunda, e começa a estapeá-la.

—Ihab, não!

Grito tentando sair de seu aperto. Quanto mais tento, mais ele bate forte. Não consigo. Dói, dói muito. Ah! Expremo os olhos. O som de meus gritos ecoam por toda a casa, não há outro barulho, todos então quietos.

–P-para.

As primeiras lágrimas caem aos olhos, cansada rendo meu corpo, ele insiste nas batidas, meu choro é de soluçar, pesado, arrastado. A dor só não é maior do que a sentida em meu peito. Ser sequestrada, maltratada, humilhada sem ao menos saber o porquê. Não entra na minha cabeça nenhum motivo disso estar acontecendo comigo.

Após incansáveis minutos ele para. Jogo-me ao lado. Nunca me senti tão humilhada na minha vida. Retraio o corpo, dobro, como se fosse um neném a encolher-se. Os soluços continuam fortes, ardentes. Não tenho coragem de olhar em seu rosto. Sei que está a me encarar. Não acredito que teve coragem de me bater. Além da minha avó, das vezes que mereci, ninguém nunca ousou em me bater, nunca deixei, sempre fui do confronto, mas perto dele eu sou uma nanica indefesa.

Por alguns segundos, permanece ali mas sai logo em seguida.

Meu Deus por que eu vim parar aqui? Quando que esse pesadelo vai acabar? Eu não mereço ser maltratada. Com pensamentos turbulentos, chorando e debruçada, adormeço a cama.

//

—Bruna. Ao susto levanto com Nádia me chamando. — Desculpe te acordar, mas precisa comer alguma coisa, já está anoitecendo e você nem tomou o café da manhã.

—Eu não quero Nádia. Você ouviu a surra que ele me deu. ‐com o olhar pesado, assente. —Todos ouviram, e você ainda me diz para não ter medo dele.

—Menina, sei que o que ele fez não tem justificativa, mas entenda, ele ficou furioso quando te viu quase nua. Seus dois seguranças estavam também, claro que olharam pra você, os homens são muito ciumentos aqui.

—Não interessa, não justifica.

—Eu sei que não. -arfa.

Coloca a bandeja de comida na escrivaninha. Olho de soslaio. Há frutas, pães, e um prato feito da janta.

—O que é isso? -pergunto olhando por cima dos ombros.

—Ah, você vai gostar, é uma façulia, feijão branco com especiarias e carne, é muito saboroso, vai se deliciar.

—Parece bom.

—Foi o senhor que mandou prepará-lo, ele achou que poderia chegar ao paladar brasileiro.

—Pode levar. Não quero.

—Mm não seja assim. Tem que comer. Sei que está brava com as palmadas, porém, se não comer, vai cair dura! Por agora você poderá dormir tranquila, o senhor Ihab viajou, só volta daqui há 3 dias.

Arregalo os olhos. Tenho 3 dias para fugir.

—Veja a bandeija, tem outra coisa para você.

Olho imaginando o que poderia ser, se fosse a cabeça de Ihab em vez da refeição, seria muito bom. Espero alguns segundos, até que ela dá as costas e vou correndo devorar a comida, estou morrendo de fome. Hmmm. Delicioso esse feijão. Muito temperado, muito bom. Como as frutas, estão frescas e muito gostosas. Acabo com tudo.

Não percebi, mas ao final vejo um papel dobrado ao canto da bandeija. Desdobro e começo a ler.

"Bruna, não sou de me descontrolar como fiz hoje, na hora da raiva acabei descontando o cuspe que me deu ontem e a falta de respeito por ter aparecido nua na frente dos meus funcionários. Uma coisa que não admito é que mulher minha faça isso!

Quem falou que sou dele?

Ficarei fora por três dias para resolver alguns assuntos de trabalho, não apronte nada na minha ausência, terei pessoas a vigiando o tempo todo, e tenha certeza que posso mobilizar uma cidade ao meu favor. Deixei meu cartão com Nádia, faça algumas compras, se destraia, compre tudo que possa cobrir seu corpo!

Ihab!

Amasso o papel e jogo ao chão. A única coisa que me interessa é saber que ficará 3 dias fora, tempo suficiente para criar um plano de fuga. Eu vou conseguir me livrar desse maldito e voltar para o Brasil.

Eu vou fugir.

Mais populares

Comments

Juliana Vicentina Da Vo

Juliana Vicentina Da Vo

Tenho dó dela, porque não ouviu os conselhos da avó e da irmã antes , agora chora pelo leite derramado.

2024-09-12

0

Lucienne Costa

Lucienne Costa

negativo não tem que fugir,ele vai ajudar ela

2024-07-11

2

jeovana❤

jeovana❤

isso mesmo bruna ela tem que fugir e ser vingar da cachorra da carol e do Felipe

2024-07-01

2

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!