Capítulo 7: A solidão da liberdade

S/N

Ele quebra o contato visual abruptamente, levantando-se e se afastando de mim. O silêncio tenso paira no ar enquanto ele desaparece em outro cômodo, deixando-me confusa e desconcertada com o que acabou de acontecer.

A ausência dele na sala parece deixar um vazio, uma lacuna de perguntas não respondidas. Sento-me no sofá desgastado, tentando decifrar as entrelinhas daquele breve momento de contato e retirada. Tudo seria mais fácil se ele apenas respondesse as minhas perguntas e me dissesse o porque eu estou aqui. Mas de uma coisa eu tenho certeza, quando o meu tornozelo melhorar, não esperarei um segundo a mais para fugir daqui!

Minutos depois, ele retorna, guardando o mesmo celular descartável — de antes — num dos bolsos de sua roupa militarizada. Em suas mãos, duas latas de feijão enlatado são carregadas e colocadas perto da lareira para serem aquecidas, enquanto o som dos trovões lá fora intensifica a atmosfera.

O homem permanece de costas, alheio à minha luta contra o frio. Tentando me aquecer, eu me abraça, mas as minhas roupas molhadas se tornam um obstáculo. O tremor perpassa o meu corpo, e seus dentes parecem bater levemente enquanto me perco em pensamentos sobre o que aconteceu na festa.

A incerteza sobre a presença da polícia intensifica-se. Me pergunta se as autoridades já sabem onde estou e se estão a caminho. A cabana, antes um refúgio, torna-se uma ilha isolada na tempestade, e a dúvida sobre o desenrolar dos eventos paira no ar, tão palpável quanto o frio que me envolve.

Ele pega a faca do seu coldre novamente e começa a abrir as latas. Em silêncio, ele se levanta e se aproxima de mim, oferecendo a comida que parece estar quente, mas não consigo sentir fome no momento, apenas recuso, balançando negativamente a cabeça.

— Estou sem fome. – Digo.

Ele estende mais o braço, ainda persistindo.

— Não.

Ele finca a faca com força ao meu lado, no braço de sofá, e volta a aproximar a lata com raiva nos olhos.

— Ou você come essa merda ou eu enfio na sua boca e te faço engolir.

Arregalo os olhos, e com receio, pego a lata das suas mãos, surpresa pelas suas palavras. Ele se vira e pega a outra lata, sentando no chão, encostado no sofá e logo começa a comer, levantando um pouco o capuz, porém, eu não vejo porque ele está de costas.

Olho a aparência dos feijões e franzo o nariz com o cheiro. Parece que estava guardado há meses, mas a validade ainda está no prazo. Deixo a lata ao meu lado enquanto escuto o som da madeira estralando na lareira e a chuva atingindo o telhado da cabana.

— Eu me chamo S/n... – Digo, mesmo sabendo que a última coisa que ele quer é conversar comigo. — S/n Sinclair.

Sorrio, pensando no quão ridículo o meu sobrenome é, principalmente porque vem de uma família soberba que se importa mais com o dinheiro do que com os próprios filhos, a minha mãe é claramente um exemplo disso.

— Antes de ser sequestrada, eu estava fazendo um show. Acredita? – Rio comigo mesma. — Estava cantando uma clássica, e eu nem gosto de música clássica.

Ele se mantém em silêncio, mas sei que escuta as minhas palavras.

— Eu estava há cinco dias no meu quarto, justamente porque a minha mãe me fez treinar a voz durante dez horas para tudo ser perfeito ontem. Mas aqueles homens claramente estragaram os planos dela. – Novamente, Sorrio, enquanto uma lágrima solitária me escapa. Eu só queria saber se ela e o meu pai estão bem.

Pego novamente a latinha, enquanto, com receio, começo a comer, sentindo o meu estômago se embrulhando, mas de longe, é a refeição mais quente que já comi na minha vida, e não por ter sido aquecida, mas porque não foi feita num restaurante caro com chefes renomados... Foi feito por um desconhecido que me mantém presa e praticamente me ameaçou duas vezes, mas isso me faz sentir mais livre do que eu era quando estava com a minha mãe.

— Essa foi a conversa mais longa que eu já tive... – Enxugo a lágrima, enquanto me calo e volto a comer.

Mais populares

Comments

Dia Cassexe

Dia Cassexe

É muito triste quando filhos se tornam mero objectos, neste caso bem valioso pois gerava lucros. E os pais se esquecem do que do amor, carinho e atenção que tb fazem parte do pacote para criação dos filhos.

2024-05-08

1

Ver todos
Capítulos
1 Avisos
2 Capítulo 1: Nos bastidores
3 Capítulo 2: O sequestro
4 Capítulo 3: Kortac
5 Capítulo 4: A dança da liberdade
6 Capítulo 5: A cabana
7 Capítulo 6: Laços improváveis
8 Capítulo 7: A solidão da liberdade
9 Capítulo 8: A verdade
10 Capítulo 9: Os sussurros da noite
11 Capítulo 10: Noite de revelação
12 Capítulo 11: O peso das escolhas
13 Capítulo 12: De volta ao início
14 Imagem
15 Capítulo 13: Meia-noite
16 Capítulo 14: O peso da culpa
17 Capítulo 15: A vista dos sentimentos
18 Capítulo 16: A corrosão da ansiedade
19 Capítulo 17: O combustível do desejo
20 Capítulo 18: Incoveniente
21 Capítulo 19: Experiência
22 Capítulo 20: Sonho ou pesadelo?
23 Capítulo 21: Pé na estrada
24 Capítulo 22: Fuga
25 Capítulo 23: Acidentes acontecem
26 Capítulo 24: Se arriscando
27 Capítulo 25: E se...
28 Capítulo 26: Fugir ou ficar?
29 Capítulo 27: O fim da Kortac?
30 Capítulo 28: No meio do nada
31 Capítulo 29: A primeira lua
32 Capítulo 30: O retorno
33 Capítulo 31: Mundos opostos
34 Capítulo 32: Quarto de hotel
35 Capítulo 33: A realidade machuca
36 Capítulo 34: De volta ao lar
37 Capítulo 35: Interrogatório
38 Capítulo 36: De volta à rotina
39 Capítulo 37: Um novo motivo para continuar
40 Capítulo 38: O jantar sangrento
41 Capítulo 39: Reprimindo
42 Capítulo 40: Bem-vindos ao Um-quatro-um
43 Capítulo 41: O passado ainda queima
44 Capítulo 42: Fantasma do passado
45 Capítulo 43: Sentimentos vazios
46 Capítulo 44: A última ligação
47 Capítulo 45: Sonhos vazios, pesadelos conscientes
48 Capítulo 46: A realidade assusta
49 Capítulo 47: A esperança é a última que morre
50 Capítulo 48: Apostando a confiança
51 Capítulo 49: L' asta
52 Capítulo 50: O inesperado acontece
53 Capítulo 51: Cara a cara com o diabo
54 Capítulo 52: Revelações surpreendentes
Capítulos

Atualizado até capítulo 54

1
Avisos
2
Capítulo 1: Nos bastidores
3
Capítulo 2: O sequestro
4
Capítulo 3: Kortac
5
Capítulo 4: A dança da liberdade
6
Capítulo 5: A cabana
7
Capítulo 6: Laços improváveis
8
Capítulo 7: A solidão da liberdade
9
Capítulo 8: A verdade
10
Capítulo 9: Os sussurros da noite
11
Capítulo 10: Noite de revelação
12
Capítulo 11: O peso das escolhas
13
Capítulo 12: De volta ao início
14
Imagem
15
Capítulo 13: Meia-noite
16
Capítulo 14: O peso da culpa
17
Capítulo 15: A vista dos sentimentos
18
Capítulo 16: A corrosão da ansiedade
19
Capítulo 17: O combustível do desejo
20
Capítulo 18: Incoveniente
21
Capítulo 19: Experiência
22
Capítulo 20: Sonho ou pesadelo?
23
Capítulo 21: Pé na estrada
24
Capítulo 22: Fuga
25
Capítulo 23: Acidentes acontecem
26
Capítulo 24: Se arriscando
27
Capítulo 25: E se...
28
Capítulo 26: Fugir ou ficar?
29
Capítulo 27: O fim da Kortac?
30
Capítulo 28: No meio do nada
31
Capítulo 29: A primeira lua
32
Capítulo 30: O retorno
33
Capítulo 31: Mundos opostos
34
Capítulo 32: Quarto de hotel
35
Capítulo 33: A realidade machuca
36
Capítulo 34: De volta ao lar
37
Capítulo 35: Interrogatório
38
Capítulo 36: De volta à rotina
39
Capítulo 37: Um novo motivo para continuar
40
Capítulo 38: O jantar sangrento
41
Capítulo 39: Reprimindo
42
Capítulo 40: Bem-vindos ao Um-quatro-um
43
Capítulo 41: O passado ainda queima
44
Capítulo 42: Fantasma do passado
45
Capítulo 43: Sentimentos vazios
46
Capítulo 44: A última ligação
47
Capítulo 45: Sonhos vazios, pesadelos conscientes
48
Capítulo 46: A realidade assusta
49
Capítulo 47: A esperança é a última que morre
50
Capítulo 48: Apostando a confiança
51
Capítulo 49: L' asta
52
Capítulo 50: O inesperado acontece
53
Capítulo 51: Cara a cara com o diabo
54
Capítulo 52: Revelações surpreendentes

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!