capítulo 10

Lua

Senti os lábios dele no meu, e um carinho suave no meu rosto, mas como sempre a mão apertando forte a minha cintura demonstrando que ele estava no controle.

Senti tanta saudade dessa boca, do gosto dele, da sensação boa de estar nos braços dele, o cheiro dele ainda era o mesmo, amadeirado e forte, queria me perder naquele cheiro, na suavidade dos seus lábios no meu.

Queria morar naquele abraço pra sempre.

Mas eu sei que o André é como uma droga, se eu experimentar vou me destruir, porque ele vai embora, ele sempre vai.

Quando nos separamos eu olhei nos seus olhos e vi o mesmo brilho de 15 anos atrás, ele parecia ser o mesmo garoto desajeitado que me amava. Mas então porque ele foi? Porque ele me deixou se me amava tanto? Eu precisava de uma resposta, precisava entender o que aconteceu naquela época.

- Porque você me deixou?

As lágrimas já corriam pelo meu rosto, e minha voz soava desesperada.

- Minha linda...

Era assim que ele me chamava antes, minha linda. Sentia tanto carinho, tanta devoção naquelas palavras e eu amava ouvir ele me chamar assim.

- Era um grande oportunidade, porque você não ficou feliz por mim? pela minha conquista?

- Você sabia o quanto eu precisava de você, André você sabia porque eu te contei, eu chorava no sei colo de medo toda vez.

Eu tinha decisões pra tomar que estavam me deixando louca, as coisas que eu ia ter que enfrentar não seriam fáceis e você não ia estar lá pra me dar apoio!

- Por isso você não fez, por minha causa?

Você se arrependeu? me culpa por isso?

- Não eu não fiz, eu tive que passar pela puberdade masculina, tive que ver meu corpo mudar e muitos pelos crescendo por toda a parte, mesmo tomando hormônios pra controlar a minha voz mudou porque os hormônios era em dosagem insuficiente, oscilações de humor terríveis e muita dor, muita solidão.

- O que aconteceu?

Ele ainda me segurava em seus braços como seu eu fosse de vidro e fosso quebrar de ele me soltasse.

- Eu só poderia usar a quantidade de hormônios necessários pra impedir a puberdade se quisesse passar pela cirurgia de redesignação sexual, mas eu não quis fazer, então foi muito mais difícil.

- Porque você não fez amor?

Ele me tratava como se nada tivesse mudado, como se aqueles 16 anos não fossem nada.

- Minha mãe me ensinou a me amar, e eu aprendi, eu amo meu corpo como ele é, e mesmo assim ainda me sinto mulher, independente do que meu corpo aparenta.

Fazer a cirurgia seria mais fácil, mas era muito delicado e perigoso em todos os sentidos, então eu entendi que não preciso de nenhuma cirurgia pra ser quem eu sei que eu sou.

- Você é perfeita minha linda, sempre foi e sempre vai ser.

Ele queria voltar a me beijar mas eu ainda tinha muita coisa pra falar, 16 anos de muita mágoa enraizada em meu coração queria sair pra fora.

- Sabe que eu chorei por dias sentindo sua falta, me tranquei no quarto por semanas, me sentia feia e desajustada, nada na minha aparência fazia sentido, e eu não tinha mais você pra me dizer palavras doces, pra me elogiar e dizer que eu estava bonita, a escola voltou a ser um inferno, você mudou de escola pra ficar comigo e me proteger, mas depois que você se foi, tudo piorou. Os apelidos, as agressões, as palavras cruéis.

Todas essas lembranças me deixavam ainda mais triste e com mais raiva dele ainda.

- Sabia que o Juninho do terceiro ano tirou fotos minhas no vestiário do colégio? Eu estava sem camisa só de calcinha shortinho ele editou a foto colocando um homem pelado na minha frey, como se minha mãe estivesse no pau dele, escreveu aberração em cima da minha cabeça e distribuiu pra escola toda, foi horrível, eu me afundei ainda mais na depressão, desenvolvi vários comportamentos compulsivos, tinha medo de sair de casa, medo das redes sociais, de ler comentários ofensivos pra mim, fotos e montagens pra me humilhar, muitos dos comentários dizima pra eu me matar porque eu era uma aberação anormal.

Sentia como se estivesse voltando aquele lugares novamente, a dor era tão forte agora quanto foi na época.

- Um dia eu sentia tanta dor e tanta tristeza, me sentia rejeitada pelo mundo e meu coração doía. Estava sentada de frente pro espelho tentando gostar da pessoa que via na minha frente, mas as palavras , as mensagens daquelas pessoas não saiam da minha cabeça, em cima da minha cômoda tinha uma navalha pequena que eu usava no meu rosto, eu só queria que aquela dor passasse, eu não pensei muito bem naquela hora eu estava desesperada e queria deixar de sentir dor.

- Lua por favor para, por favor me diz que você não fez isso por favor...

- Nem a dor do corte eu conseguia sentir, antes que o corte ficasse fundo demais , minha mãe chegou, tirou aquilo da minha mão e me levou pro hospital, lá me encaminharam para um psiquiatra e eu comecei o meu tratamento. Fiquei dependente de antidepressivos e remédios pra dormir por doze anos. Só depois desse tempo eu me permiti viver outra vez , logo em seguida já formada eu conheci meu ex, e o resto você já sabe.

- Minha linda, eu sinto muito, sinto muito de verdade.

- Sabe o que mais doía André ? É saber que você sabia o que eu ia passar e mesmo assim não me escolheu. Eu passei aquilo tudo sozinha sem você, a minha maior dor era saber que tudo poderia ser mais fácil se o homem que eu amava estivesse do meu lado como prometeu que sempre estaria.

- Lua porque você nãoe ligou? porque não me falou o que estava acontecendo?

- Quando voce foi embora deixou bem claro que não me queria mais, eu poderia tá depressiva o quanto fosse, meu orgulho ainda estava intacto, eu jamais rastejaria por migalhas suas, não importa o quanto eu ainda te amasse, eu me amo primeiro!

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