7– O lobo mau

 A escuridão não era um problema para Ronni, que saiu na madrugada sem chamar a atenção do porteiro que ressonava sentado em uma cadeira, na sala de recepção.

 Seguiu pelo silêncio das ruas até a área portuária, onde o único segurança que encontrou, estava adormecido num canto. Esgueirou-se por dentro do porto, tendo o cuidado de manter-se na escuridão, a roupa preta que usava, ajudava na camuflagem dos seus movimentos furtivos. Sentiu o cheiro do medo, estava próximo.

 Medo... luxúria...fome...

 Ronni teve apenas as que seguir o seu faro.

 — Não foi isso que combinamos.

 — Shh! Fique quietinha que não vai doer.

 — Você... você disse que Collins estaria aqui! — falou entre o medo e o desespero.

 Ronni aproximou-se mais, com o rosto encoberto pelo capuz do blusão, ficou na escuridão e apurou o seu faro. A maresia mascarava o cheiro de cão, mas estava lá, ele podia farejar.

 — Me solta... Por favor, quero voltar para casa. — implorou a voz feminina com um tom choroso.

 — Calma, minha linda. Eu darei a você o que veio buscar. — O homem estreitou o abraço, ela gritou. — Só m beijinho, eu garanto que te levarei para o céu.

 O homem irritou-se com a tentativa dela de se soltar, sem controle, deixou os olhos vermelhos como fogo, fazendo com que a "preza" começasse a chorar em desespero.

 De onde estava, Ronni pôde ver a mão de garra rasgando delicada blusa da garota, o grito foi silenciado por um beijo violento.

 — Ei, idiota! Não acredito que tenha o consentimento da moça.

 A voz firme vinda de um canto escuro, serviu para paralisar momentaneamente o homem, que largou a garota.

 — Acredita mesmo que pode aparecer assim e interromper a minha diversão? — A voz do homem era quase um rosnado quando empurrou a garota, fazendo com que ela caísse no chão.

 — Corra criança. Corra como se o próprio demônio estivesse atrás de você.

 A voz sou na escuridão enquanto o agressor tomava a forma de lobo. Ao notar a garota fugindo, Ronni saiu das sombras e antes que o outro lobo se desse conta, roupas negras transformaram-se em trapos e cada parte do corpo de Ronni ficou coberta de um pelo castanho-avermelhado.

 As duas feras chocaram-se no ar. Um ganido foi ouvido, Ronni foi certeiro, cavando os seus caninos no pescoço do outro lobo, que foi ao chão sem demora.

 Com as poderosas patas segurando o inimigo no chão, Ronni manteve os dentes cravados, sentindo o cheiro do sangue tomando conta dos seus sentidos, mas tinha pleno controle do seu lobo. Não comia carne dessas bestas.

 Quando sentiu que a vida já não existia ali, com um forte puxão , dilacerou a garganta do lobo inimigo. Separou com os dentes, a cabeça do corpo do cão.

 Morreu em forma de lobo, lobo seria... não sobraria nenhum vestígio do homem.

 Sem demora, arrastou o corpo e jogou nas águas salgadas do mar, assim fez também com a cabeça.O seu lobo também jogou as roupas esfarrapadas no mesmo local. Sem provas, sem culpado.

 O seu lobo seguiu para a pensão, no silêncio da madrugada apenas o barulho das patas contra o chão.

 Ao chegar em frente à pensão, ficou um tempo sentado na calçada. Em sua forma de lobo não o deixariam passar, mas também não poderia passar nu pela portaria.

 O lobo observou a sua volta, até que decidiu que apenas o lobisomem poderia ajudar nesse momento crítico. Só teria acesso em seu quarto se fosse pela janela aberta.

 Com os ossos estalando e um leve granito o lobo-homem deixou a sua forma aparecer e saltou numa árvore próxima, em seguida pendurou-se no parapeito da janela e sem muito esforço, saltou para dentro do quarto.

 Lentamente voltou a forma humana, controlando as dores da mutação. Ele suportava com tranquilidade toda a dor, sempre foi assim, mesmo antes da mordida.

 Foi direto para o chuveiro, queria livrar-se do cheiro do outro cão impregnado nele.

 Com as mãos espalmadas na parede, a cabeça baixa, deixou que a água morna caísse nas suas costas, numa tentativa de aliviar a tensão. Nesse momento, os seus pensamentos vagavam. Essa agora era a sua vida, mas talvez se eliminasse todos os lobos maus, a vida de Philip e os seus filhos teria paz.

Afinal, era por isso que andava por aí matando sem permissão ou aviso. Queria limpar o mundo, acabar com a existência de bestas com o a que encontrou essa noite.

Havia perdido as contas de quantos foram, mas sabia que eliminou muitos lobos com índole deturpada.

......................

Observava através da janela, os primeiros raios de sol. Era verão na Irlanda, Ronni sorriu ao lembrar-se de como gostava dessa época do ano. Antes de se tornar esse monstro, ele gostava de festas, de estar rodeado de pessoas e se ter sempre uma mulher diferente nos braços.

A amargura tomou conta dele ao perceber que os seus dias não poderiam mais ser com o antes. Ele devia apenas seguir em frente, sem sonhar com um futuro ou se prender ao passado.

Esmagou o seu cigarro no cinzeiro cheio. Olhou desolado para a pequena cama vazia, as vezes desejava ter um corpo macio ao seu lado…

Esse pensamento fez o seu lobo se agitar. O seu amigo Marcus explicou-lhe sobre "A companheira", quando ela aparecesse, ele saberia e não teria como fugir, o lobo iria urrar.

"Besteiras de um lobisomem apaixonado ".

Com esse pensamento, Ronni deitou-se para descansar. Andava inquieto ultimamente, era como se o seu lobo quisesse fugir. Decidiu que ficaria só mais um dia naquele lugar, a Cornualha era sua próxima parada.

Iria para uma pousada no interior, ela era cercada por uma extensa mata e o seu lobo ficou feliz nas últimas vezes em que correu livre por lá.

Seria bom o isolamento e ficar afastado de problemas por um tempo, por ser próximo da ilha de Marcus, poderia matar saudades do casal de amigos.

Com um plano traçado, tudo seria fácil, esse foi o seu último pensamento antes do sono tomar conta dele.

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