Minha Alada
Certo dia, a família decidiu explorar um vale desconhecido em busca de alimento. Os animais ao redor de sua casa já haviam sido caçados ou fugido para longe, escapando do frio implacável que tomava conta das montanhas de Airen. As montanhas, antes prósperas, agora eram um deserto gelado e desolado. Outros moradores da região já tinham partido, deixando para trás apenas casas vazias e memórias.
O pai, um homem forte e determinado, apesar das cicatrizes em seu corpo que contavam histórias de batalhas passadas, liderava o grupo. Ele sabia que os recursos estavam se esgotando e que era necessário arriscar para encontrar algo que pudesse alimentar sua família. A mãe, mesmo com os ossos frágeis e doloridos pela falta de comida, mantinha a esperança viva, cuidando dos dois filhos com carinho e responsabilidade. O irmão mais velho, obediente e sério, seguia de perto o pai, tentando aprender tudo o que podia sobre a caça e a sobrevivência. Kiay, por outro lado, era o oposto do irmão: travessa, curiosa e sempre desobediente, mas com um coração bondoso e valente, herdado de seus pais.
Enquanto caminhavam pelo desfiladeiro íngreme, Kiay não conseguia conter sua curiosidade. As paredes de rocha ao seu redor eram imponentes, e o vento gelado soprava entre as fendas, criando sons que pareciam sussurros de um mundo antigo e esquecido. A menina se afastou do grupo, atraída por uma formação rochosa que brilhava sob a luz fraca do sol. Era uma camada de pedras finas que se estendia como uma ponte natural sobre um abismo escuro. "Kiay, volte aqui agora!" gritou sua mãe, percebendo o perigo. Mas a menina, encantada com a descoberta, deu um passo em falso.
O chão sob seus pés cedeu com um estalo alto, e Kiay soltou um grito agudo enquanto sentia o mundo desmoronar ao seu redor. Seu corpo foi puxado para baixo, caindo em direção ao abismo. Mas enquanto caía, algo extraordinário aconteceu. A menina atravessou uma barreira invisível, um portal que estava escondido sob a fina camada de pedras. Era como se o ar ao redor dela se tornasse líquido, puxando-a para uma correnteza desconhecida. A sensação era assustadora, mas ao mesmo tempo fascinante. Kiay sentiu seu corpo ser envolvido por uma energia estranha, como se estivesse sendo transportada para um lugar além do mundo que conhecia.
Quando finalmente emergiu da queda, Kiay aterrissou com um impacto suave em um chão coberto de musgo. Ela estava em uma caverna escura, onde o silêncio era interrompido apenas pelo gotejar ocasional de água que caía das estalactites. A menina ficou deitada por um momento, ofegante, tentando entender o que havia acontecido. A caverna era imensa, suas paredes eram irregulares e cobertas de líquenes luminescentes que brilhavam suavemente, proporcionando uma iluminação fraca, mas suficiente para que Kiay pudesse ver ao seu redor.
"Pai? Mãe? Onde estão vocês?" A voz de Kiay ecoou pelas paredes da caverna, mas não houve resposta. Apenas o vazio. Sozinha e assustada, ela se levantou lentamente, sentindo cada parte do seu corpo dolorido pela queda. Com passos hesitantes, começou a explorar o lugar. Cada sombra parecia esconder perigos, e o medo crescia em seu coração.
Ela se lembrou das histórias que seu pai contava sobre criaturas que habitavam as profundezas da terra, monstros famintos que espreitavam na escuridão, esperando por presas inocentes. Kiay tentou não pensar nisso, mas seus pensamentos foram interrompidos por um som estranho. Era um rosnado, baixo e ameaçador, vindo de algum lugar nas sombras. Ela parou, o coração disparado, tentando localizar a origem do som.
Antes que pudesse reagir, os rosnados se intensificaram, e Kiay percebeu que não estava sozinha. Criaturas famintas, atraídas por seus gritos e pelo cheiro de medo, estavam se aproximando. Ela não conseguia vê-las claramente, mas podia sentir seus olhos brilhando na escuridão, fixos nela.
Desesperada, Kiay começou a correr, buscando uma saída, qualquer lugar que pudesse oferecer segurança. Ela correu sem direção, apenas seguindo uma luz distante que parecia prometer um refúgio. Mas à medida que se aproximava, a luz revelou algo ainda mais terrível: uma gigantesca ave alada, de penas azuladas que brilhavam como estrelas na escuridão. A ave estava dormindo em um ninho feito de galhos e musgo, seu corpo iluminava suavemente a caverna.
Kiay parou de repente, o medo e a fascinação lutando dentro dela. A ave era magnífica, mas também assustadora em sua grandiosidade. "O que eu faço?!" pensou a menina, seu coração batendo como um tambor em seu peito. Mas antes que pudesse decidir, a ave abriu seus olhos, que brilharam com uma luz intensa, fixando-se diretamente em Kiay. A menina congelou, incapaz de se mover.
A ave, porém, não demonstrou agressividade. Seus olhos refletiam uma curiosidade calma, como se estivesse tentando entender o que era aquela pequena criatura humana à sua frente. Mas o momento de calmaria foi interrompido pelos rosnados cada vez mais próximos. Kiay olhou para trás e viu o motivo de seu pavor: dois cães enormes, um deles com características mais próximas a um lobo, com olhos vermelhos e brilhantes, emergiram das sombras, prontos para atacar.
Em um impulso desesperado, Kiay correu para debaixo da asa da ave, buscando proteção. Surpreendentemente, a ave permitiu que ela se escondesse ali, como se entendesse o perigo que a menina enfrentava. Os cães rosnaram, mostrando os dentes afiados, mas a ave ergueu a cabeça e soltou um grito poderoso, que ecoou pela caverna. O som foi tão forte que os cães recuaram momentaneamente, mas não desistiram.
Eles estavam famintos, e a presença da ave não os intimidava o suficiente para afastá-los. A ave alada, percebendo que os cães não recuariam, estendeu suas asas imensas e avançou sobre os invasores. Kiay, encolhida e tremendo, assistiu à batalha com os olhos arregalados, lembrando-se de sua mãe, que sempre a protegera com a mesma ferocidade.
A luta foi brutal. A ave golpeou um dos cães com suas garras afiadas, cortando-o profundamente. O outro cão tentou atacar a pequena Kiay, mas a ave foi mais rápida, usando suas asas para empurrá-lo e, em seguida, perfurar o olho da criatura com seu bico. O cão ferido soltou um uivo de dor e fugiu, deixando um rastro de sangue pelo chão da caverna. O outro cão, já gravemente ferido, não demorou a sucumbir, caindo sem vida aos pés da ave.
Exausta e ofegante, a ave voltou ao ninho, suas asas ainda abertas, mas agora cobrindo Kiay como uma manta protetora. A menina, que antes estava em pânico, sentiu uma onda de alívio e segurança ao ser envolvida pelo calor da ave. Seus olhos começaram a se fechar, o cansaço e o alívio tomando conta de seu pequeno corpo.
Antes de adormecer, Kiay olhou para a ave e sussurrou, "Obrigada... por me proteger..." A ave, como se entendesse, inclinou a cabeça e tocou suavemente a testa da menina com seu bico, transmitindo uma sensação de conforto e segurança. Kiay finalmente fechou os olhos e adormeceu, sentindo-se segura pela primeira vez desde que havia caído no buraco.
Ela não sabia que havia sido transportada para um mundo diferente, um lugar onde a magia e o mistério se entrelaçavam com a realidade. Tudo o que sabia era que, por enquanto, estava segura na companhia de sua nova protetora, a majestosa ave alada de penas azuladas, que agora guardava seu sono.
Fim do Primeiro Capítulo.
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Atualizado até capítulo 111
Comments
Pollyana Silva
😘😘😘☺️☺️☺️
2024-06-12
2
Pollyana Silva
ooo
2024-06-12
2