_Katherine_
Ao entrar no meu quarto, percebo que o tempo parece ter parado. Cada detalhe permanece intocado, como se esperasse minha volta. Inclusive a antiga caixa de música onde escondi a joia que Gael me deu — a mesma do dia anterior à nossa última vez juntos. Tudo está exatamente onde deixei.
Pego uma maleta com meus equipamentos e a guardo no cofre. Em seguida, desço para a sala de estar, que está vazia. Caminho até a garagem, acendo um cigarro e, como se o universo conspirasse contra minha paz, recebo uma ligação.
Esse cara não vai me deixar em paz.
— Já se instalou, Kate?
— Sim. O que você quer?
— Quero que você ligue para a Unidade de Inteligência. Eles já estão esperando a sua ligação.
— Pensei que verificariam minha chegada no aeroporto. É o protocolo básico…
— Acho que você ainda não entendeu a sua posição. Você é a agente mais aguardada — e confiável — da agência. Eu construí sua reputação. Agora ligue para eles.
— Ok.
Mais que merda…
Sempre fiz as coisas do meu jeito. Odeio receber ordens.
Depois de fazer a ligação, fui informada que deveria comparecer à base militar no dia seguinte. O problema é que amanhã preciso entregar meus documentos na faculdade… e isso exigirá um plano alternativo.
Subo até o quarto de Ana e bato à porta. Ela abre com um sorriso encantador.
— O que foi, mana?
Perguntou ela se levantando da cama.
— Vai fazer algo amanhã? — Perguntei curiosa.
— Pretendo ir à faculdade. Por quê?
— Preciso que entregue algo lá.
— O quê?
— Meus documentos.
— Vai fazer o quê amanhã?
— Procurar um emprego. — Respondi coçando a cabeça.
Péssima mania de quem não sabe mentir. Mais ela acreditou, ela sempre acredita em tudo o que eu falo.
— Tudo bem, eu levo.
Assim que saio do quarto, dou de cara com meu irmão mais velho, Jhonatan. Vinte e cinco anos. Ele é frio e arrogante como eu, mas valoriza a família acima de tudo.
— Vai aonde amanhã?
— Procurar um emprego.
— Por quê? Somos ricos.
— Justamente por isso. Quero sair das garras do nosso pai.
— Não imaginei que você ainda seria tão ingênua.
— Acredite, irmão. Eu não sou.
— Qual o problema em arrumar um emprego?
— Nenhum. Vai em frente. — Respondeu ele indiferente, porém ao contrário de Ana o seu olhar era desconfiado.
Ele se vira e entra em seu quarto. Sempre me protegeu quando éramos crianças… Parece que, no fundo, isso não mudou.
Na manhã seguinte, me levanto, me arrumo, pego o capacete e sigo para a garagem. Ao passar pela sala de jantar, vejo Jhonatan comendo sozinho. Ele ergue os olhos.
— Vai sair sem comer?
— Estou sem fome. — Falei pegando apenas uma maçã.
— Só não desmaia na rua.
Chegando na garagem, monto na moto e sigo para a base militar. O lugar está movimentado. Reconheço, à distância, o idiota do avião sentado num dos bancos. Passo direto pela recepção sem falar com ninguém, e, claro, ele me vê.
— Ora, ora... Estão aceitando vadias por aqui agora?
Ignoro o inseto e sigo em frente.
— Sua...
Ele tenta me alcançar, mas é barrado pelo soldado na porta.
No gabinete, a presença dele me tira o ar. Adrian. Meu ex. Agora chefe da companhia militar. Sabia que ele estaria aqui — foi designado com honras para este país. Ele me encara com aquela maldita arrogância.
— Quando disseram que uma nova agente estava chegando à S.W.A.T., jamais imaginei que seria você.
— Legal.
— Por que veio?
— Trabalhar. Estar perto da minha família.
— Continua arrogante.
— Não posso fazer nada.
— Deve ser bom ser filha de bilionário.
— Você mais do que ninguém sabe do que sou capaz.
Ele se cala. Joga alguns papéis sobre a mesa com violência.
— Assina logo. Quero me livrar da sua fuça.
Enquanto assino, ele solta mais uma provocação:
— Estou noivo. A mulher mais linda que já conheci. Inglesa. Corpo perfeito. Só de pensar nela fico...
Meu estômago revirou.
— Que bom. Felicidades.
Minha indiferença o deixa ainda mais irritado.
— Nunca tinha conhecido algo belo, afinal... só namorei você.
Otário. Como se eu não soubesse que sou uma deusa.
— Terminei.
Assim que vou sair, uma loira entra na sala.
— Meu amor! — Falou ela com uma voz estridente.
Acho que os meus ouvidos já eram depois dessa.
— O que está fazendo aqui?
— Vim ver meu docinho.
Ao passar por ela, a idiota se joga no chão como uma atriz de quinta.
— Ai! Por que fez isso?
— Você está maluca, Kate?! Sei que está com inveja, mas não precisava empurrar! Se machucasse um dedo dela, eu faria você sofrer, sua vadia!
— Que canseira... Toda vez é a mesma merda, Adrian! Vai se tratar! Quantas vezes preciso dizer que eu não te quero?
Ele me encara com puro ódio e parte pra cima.
— Vou fazer você aprender, vagabunda!
O soco que recebo no rosto me faz sangrar, mas também desperta a fera dentro de mim. Com o sangue fervendo, revido. Bato nele até meu corpo doer. Quando paro, vejo a loira mijando de medo.
— Que nojo.
Me aproximo e seguro seu pescoço.
— Já ouviu falar da Judaica doida do México? Pois é. Sou eu. Amanhã seu noivinho estará preso por desacato. Meu cargo aqui é superior. Estou gravando tudo desde que cheguei. Inclusive investigando... a sua família.
Solto seu pescoço. Ela chora descontroladamente. Dou um beijo em sua bochecha e saio, com os punhos cobertos de sangue. O idiota do avião me olha pálido. O soldado nada faz — já havia recebido ordens. E isso assusta a todos.
Tomo um banho no posto mais próximo, troco de roupa, acendo outro cigarro e sigo para casa.
Lá, vejo Dante conversando com Jhonatan. Quando os nossos olhares se cruzam, ele me lança um sorriso debochado, sexy... mais lindo do que qualquer outro que já vi.
Concentre-se, Katherine.
— Você demorou. — Falou meu irmão me olhando como uma águia desconfiada.
— Estava resolvendo uns assuntos...
— Vai começar amanhã? — pergunta Dante.
— Sim.
— Estou no penúltimo ano. Se precisar de algo, me avisa... Só não fica falando comigo lá, tá? A Lisa me obrigou a te ajudar.
— Tudo bem. Não vou precisar.
Subo as escadas com o coração apertado. Tranco a porta e vou direto para o banho. Depois, deito na cama. Há quanto tempo não durmo em um colchão decente?
Mas não consigo parar de pensar no olhar dele… Na chuva do lado de fora… e no passado.
Ele costumava me abraçar quando eu tinha medo de trovões. Um dia, meu pai me jogou sozinha sob a tempestade, sem abrigo. Gritei o nome do Dante até desmaiar de frio. Tive hipotermia e quase morri.
Preciso tirá-lo da minha mente… Antes que tudo se repita.
_Dante_
Não sei mais o que fazer. Toda vez que vejo a Katherine, meu coração dispara. Sinto uma vontade incontrolável de beijar a sua boca… e o maldito pescoço. A forma como ela me olha, o jeito como caminha, tudo me tira do controle.
Eu quero ela. De novo. Mais não posso!
Essa chuva me lembra da primeira vez que acariciei os seus cabelos… quando os nossos corpos ainda descobriam o desejo. A pele dela era quente e delicada. Sua voz... manhosa, doce, implorando que eu parasse, mas eu já não podia. Meu corpo já havia se entregado.
Na escola, ela era a minha obsessão. E no dia do nosso aniversário, fizemos de novo. Na casa na árvore. Nossos olhos se cruzaram, ela mordeu os lábios, e tudo aconteceu como num incêndio que ninguém podia apagar.
Foi ali que percebi… não queria mais só ser seu melhor amigo perante as pessoas.
Namoramos escondidos. Eu era viciado nela. Até que Lisa contou para o nosso pai. Fui espancado até babar sangue. Trancado por dois dias. Sem água. Sem comida. E depois, proibido de vê-la.
Dois meses longe dela foram um inferno. Tudo me lembrava a Katherine. Sua risada. Seu cheiro. Sua pele.
Até que um dia, entrei em seu quarto pela janela. E tudo recomeçou.
Na madrugada seguinte, comprei um colar. Cadeado e chave. Dei o cadeado para ela. A chave, eu guardei comigo.
Eu queria prendê-la ao meu destino. Para sempre.
Depois disso, ela foi mandada para o exterior. Fiquei sete anos sem vê-la.
Sete anos de silêncio.
Sete anos em que mandei cartas todos os meses, sem falhar. Eu estava desesperado. Nada mais importava — nem escola, nem família, nem amigos. Tudo o que eu queria... era ela.
Até que um dia, uma miserável carta chegou.
Quando abri e li aquelas palavras, desabei.
Ela havia escrito que não queria mais me ver. Que era melhor eu esquecê-la... porque ela já havia me esquecido.
Cada frase era uma lâmina.
Aquilo me destruiu.
A esperança que eu mantinha viva com tanto esforço morreu ali.
E como se não bastasse, ela ainda disse que tudo o que tivemos... não significou nada para ela.
Nada.
Mas o maldito sentimento continuava me corroendo. Eu tentava seguir em frente, tentava apagar sua imagem... Mas sempre que eu me deitava com outra mulher, era dela que eu lembrava.
E foi assim que se encerrou a lembrança mais dolorosa da minha vida.
Depois disso, me alistei no exército. Precisava fugir de mim mesmo.
Quando saí de lá, comecei a beber e fumar — não era vício, era fuga.
Viajei com meu "pai", conheci o mundo. Me envolvi com diversas artes marciais e me dediquei a cada uma com disciplina. Com o tempo, despertei interesse por negócios e entrei para a faculdade de Administração.
Tenho três irmãos. Frederick — ou Frede — o mulherengo da família. Miguel, o bonzinho, que me segue em tudo e nunca hesita em me defender. E Lisa.
Miguel esteve ao meu lado o tempo todo.
Nos momentos em que pensei em desistir, ele foi meu apoio silencioso.
Hoje, ele cursa Medicina.
Frede está fazendo Direito.
De repente, escuto minha mãe gritando na sala.
Meu corpo reage antes da minha mente. Corro até ela, com o coração disparado...
Capítulo revisado.
Continua...
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Atualizado até capítulo 48
Comments
Grace 🌻🌷
Se o irmão mais velho tem 25. Então ela é um prodígio, com menos de 25 já é uma agente com renome dentro da unidade policial ⁉️
2024-08-05
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