A manhã em Aurora revelava-se com uma luminosidade delicada, tingindo o céu de tons de índigo e ouro. Adrian acordou cedo, a última conversa com o Rei Valorian reverberando em sua mente como o ressoar de uma antiga melodia. Enquanto se vestia, as palavras do soberano entrelaçavam-se com os pensamentos de seus entes perdidos e os sorrisos daqueles que ainda estavam ao seu lado.
Caminhando pelo corredor que levava aos seus deveres diários, encontrou Mara, a silenciosa aprendiz de curandeira que surgira em sua vida como uma rajada de vento fresco em dias abafados. Seus olhares se cruzaram, e sem uma palavra, Adrian sentiu a compreensão mútua do peso que carregavam. A jovem lhe ofereceu um sorriso reconfortante.
“Bom dia, Adrian,” disse ela, a simplicidade das palavras envolta em genuína preocupação. “Como carrega o amanhecer em seus ombros?”
“Com algum esforço,” ele confessou, permitindo-se um breve sorriso. “E você, Mara? Espero que seu espírito esteja mais leve que o meu.”
Ela assentiu. “Cada dia é um novo desafio, mas tenho encontrado força nas pequenas coisas - o rir de uma criança ou o desabrochar de uma flor.”
A conversa fluía com facilidade, como um riacho superando pedras em seu caminho. Era reconfortante para Adrian saber que, apesar de todas as tempestades internas e externas que Aurora enfrentava, existiam pessoas como Mara que mantinham a esperança viva, encontrando beleza nas sutilezas da vida.
O dia prosseguiu com suas ocupações habituais. Adentrando a sala de armas, viu Jaime, o Cavaleiro, cujo respeito e amizade ele havia conquistado a custo de muito suor e uma devoção férrea. O homem robusto, com seus cabelos curtos e cicatrizes contando histórias de batalhas passadas, acenou para Adrian ao vê-lo.
“Venha cá, garoto,” chamou Jaime, com uma voz que parecia capaz de comandar exércitos. “Vamos ver como anda esse pulso com a espada hoje.”
O treino foi intensivo. Cada movimento que Adrian fazia era um reflexo de sua determinação em se tornar mais forte - não apenas fisicamente, mas para carregar as responsabilidades que caíram sobre ele tão jovem. Sob a orientação de Jaime, cada golpe e esquiva o aproximava do guerreiro que precisava ser.
Quando a tarde se aproximou, Adrian foi até os jardins, onde esperava encontrar Liz. Queria agradecer-lhe pela conversa da noite anterior, que, de uma forma que ele não conseguia entender completamente, havia aliviado a sua alma. Contudo, ao chegar, encontrou o jardim levemente diferente; as flores pareciam mais brilhantes e o ar carregava um tom de expectativa.
E ali estava ela, Liz, não mais a princesa indescritível, mas uma amiga. Uma amiga cuja presença fazia a diferença em seus dias sombrios.
“Adrian,” Liz exclamou com prazer, “veio visitar novamente tão cedo?”
“Vim agradecer,” ele respondeu, caminhando ao lado dela. “Pelos palavras que você me disse… elas me trouxeram alguma paz.”
“Estamos aqui um para o outro,” disse Liz, sua mão tocando levemente a dele em um gesto de camaradagem. “Aurora pode estar envolvida em escuridão, mas juntos, talvez possamos encontrar luz.”
Eles riram juntos, e foi um som tão humano, tão cheio de vida, que por um momento as preocupações de Adrian foram levadas embora pela brisa.
Adrian e Liz caminhavam lado a lado pelo jardim, suas sombras dançando juntas sobre a grama orvalhada pelo toque gentil do entardecer. Ao seu redor, as flores exalavam um perfume suave, e o zumbido das abelhas trabalhando nas últimas flores do dia tecia uma melodia tranquila.
“Você já notou como as pétalas da flor de lótus se fecham ao anoitecer?” Liz perguntou, parando para admirar as extensas lagoas que emolduravam o jardim.
“Sempre imaginei que elas guardassem seus segredos para si mesmas à noite,” respondeu Adrian, observando as flores com um novo apreço. “Como se recolhessem seus pensamentos mais íntimos antes da chegada da lua.”
Liz riu, uma risada leve que parecia florescer diretamente do coração. “E você, Adrian, guarda seus segredos para si mesmo quando a noite chega?”
Ele a olhou, surpreso pela profundidade da pergunta, e depois sorriu com a sinceridade que aprendeu a compartilhar com ela. “Talvez,” ele disse. “Mas nos últimos dois anos em Aurora, aprendi que alguns segredos são mais leves quando compartilhados com amigos.”
A certeza por trás dessas duas palavras atingiu Adrian como uma tempestade de verão rápida mas revigorante. Naquele instante, com o dourado da noite caindo suavemente ao redor deles, as relações forjadas em Aurora pareciam tão reais e tangíveis quanto as estátuas de mármore que guardavam o jardim.
E assim, o dia em Aurora fechou-se não com opressão ou trevas, mas com a promessa tácita de alianças profundas e amizades sinceras. Era nesse solo fértil que Adrian acreditava que a verdadeira resistência começaria a brotar. E com Liz ao seu lado, talvez o amanhã fosse um dia de mais risos do que lágrimas.
Enquanto a aurora se despedia, concedendo lugar a um sol que prometia um calor considerável, Adrian já treinava no campo de prática. O aço de sua espada cortava o ar, uma e outra vez, em movimentos que eram agora mais dança do que luta, cada passo e giro uma extensão do próprio corpo. Jaime, que observava, não poupava elogios à técnica refinada que o jovem nobre exibia naquela manhã.
“Seus movimentos estão mais precisos, Adrian. A espada e você parecem cada vez mais um só,” comentou Jaime, cruzando os braços e acenando com satisfação.
Adrian arfou, o suor escorrendo pela testa, mas seus olhos ardiam com uma determinação indomável. “Eu preciso ser mais do que preciso, Jaime. Eu preciso ser inabalável.”
Antes que Jaime pudesse replicar, uma algazarra fez-se ouvir nos corredores além do campo de prática. Curioso e alerta, Adrian aproximou-se da fonte do burburinho: um grupo de nobres discutindo fervorosamente algo que, definitivamente, merecia sua atenção.
“… não é possível!”, exclamava um deles, um senhor de idade com um peitoral decorado que indicava sua alta posição. “Lord Bolton ajudando os vilarejos? Desde quando ele tem pretensões filantrópicas?”
Outro, mais jovem e cujas vestes insinuavam menos influência, mas nem por isso menos interesse, retrucava: “É o que os mensageiros dizem. Ele está lá, ajudando a reconstruir casas e até doando parte de suas colheitas.”
Adrian permaneceu à margem, sua mente abordando rapidamente o novo tabuleiro que se desenhava. Lord Bolton nunca fora conhecido por sua generosidade ou empatia. Havia algo ali que merecia uma investigação mais aprofundada. Mas, qual seria seu jogo?
Esgrimindo suas próprias preocupações, Adrian dirigiu-se até os nobres, com a diplomacia natural dos que aprendem a negociar com palavras e espadas.
“Senhores,” Adrian os interpelou com um respeito calculado, a calma em sua voz destoando do fervor que os cercava. “Se é verdade que os vilarejos estão recebendo ajuda de Lord Bolton, isso não seria um desenvolvimento positivo?”
O mais velho dos nobres virou-se para ele com um esgar de desdém. “E desde quando a caridade é simples caridade, nobre Adrian? Sabemos que gestos como esses costumam preceder expectativas… políticas.”
“A benevolência, por vezes, mascara o interesse,” Adrian concordou, contemplativo. “Mas também não pode ser descartada. Talvez seríamos sensatos em observar as ações de Lord Bolton antes de julgarmos suas intenções.”
As palavras de Adrian plantaram uma semente de reflexão. Ainda que houvesse suspeitas, o ato em si merecia reconhecimento. Afinal, quem poderia condenar a boa fortuna que, enfim, sorria para aqueles vilarejos?
A conversa dispersou-se com o compromisso de manter uma vigilância discreta sobre as ações de Lord Bolton. Adrian, por sua vez, decidiu investigar por conta própria. Se havia algo que aprendeu em seus anos em Aurora era que as águas mais calmas escondem correntes profundas. E estava disposto a mergulhar até o fundo para descobrir a verdade.
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Atualizado até capítulo 26
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