Sonho

Era oito da manhã quando acordei, ainda me sentindo mal pela sessão de quimioterapia do dia anterior. Precisava levantar para trabalhar, mas eu estava suando frio e me sentindo fraca. Estava acordada, porém não conseguia ficar de pé. Senti algumas lágrimas escorrerem pelo rosto, pensando que estava sozinha.

— Como você está se sentindo? – ouvi uma voz.

— Pensei que estava sozinha... – respondi, tentando sentar na cama.

— Passei a noite aqui com você. – Mikaela disse, ajeitando o travesseiro atrás de mim.

— Obrigada, Mika... – Eu disse, chorando.

— Não precisa chorar, somos amigas... É bom finalmente ter uma amiga... – Mikaela respondeu com um sorriso, sentando na cama.

— É bom sim... Como vou trabalhar?

— Temos o dia de folga.

— Como? – Perguntei confusa.

— Disse que íamos nos mudar e, por isso, precisamos do dia de folga. Apolo não perguntou, só disse que tudo bem. Então você pode passar o dia na cama. – Ela respondeu em um tom sério.

— Mika, tá tudo bem?

— Está sim. Só estou cansada. Passei a noite segurando sua cabeça. E vou dizer, para alguém com uma cabeça mediana, sua cabeça é bem pesada, como se fosse cabeçuda... – Mikaela respondeu rindo, o que me fez rir também.

— Cabeçuda? – respondi rindo e continuei. — Se eu não estivesse com tanta dor, ia jogar um travesseiro em você...

— Não seja por isso! – Ela pegou o travesseiro e jogou em mim.

— Aí! – disse rindo.

— Vou fazer algo para você comer. Mas não tem nada para uma sopa nessa casa, vou sair para comprar.

— Tem alguma tara por sopa?

— Não, minha mãe fazia para eu me sentir melhor. – Ela respondeu, entristecendo a voz.

— Sinto muito.

— Tudo bem. Deixa eu trazer seu café, aí eu saio…

Mikaela estava diferente, como se não soubesse o que dizer. Pelo menos ela não fugiu e me deixou sozinha, como minha mãe fez. Aliás, tenho que ligar para saber como ela está... Peguei o celular e liguei para a casa de reabilitação onde minha mãe estava, e eles me informaram que ela estava bem. Parecia até outra mulher, estava comendo e definitivamente estava limpa, pronta para voltar para casa. Essa notícia me animou, mas eu me perguntei se a minha situação atual de saúde poderia ser um gatilho para ela voltar às drogas. Eles responderam que nessa situação existem duas opções: ou ela volta para esse mundo, ou luta para ficar limpa pelo amor que tem por mim... Eu decidi acreditar no amor dela por mim, pois mesmo sendo quem ela é, ela nunca deixou de cuidar de mim e me dar amor. Minha casa atual só tinha um quarto, então como eu faria para minha mãe dormir?

Desliguei o celular e Mikaela entrou.

— Trouxe seu café, frutas vermelhas e uma vitamina. – disse ela, colocando a bandeja nas minhas pernas.

— Está muito saudável, um café da manhã cheio de cor. – respondi rindo.

— Ouvi a ligação, está preocupada com o tamanho do apartamento?

Eu apenas acenei com a cabeça enquanto comia um morango.

— Podemos trocar de apartamentos?

— Por que trocaria de apartamento comigo? – perguntei confusa.

— Eu sou solteira e não preciso de um apartamento com dois quartos, dois banheiros, sala, cozinha e uma linda varanda. – arregalei os olhos.

— É uma proposta tentadora, mas posso dividir a cama com a minha mãe. Seria injusto trocar.

— O que? Acha que seria de graça? – ela disse rindo.

— Você falou em trocar... – disse balançando a cabeça e comendo uma ameixa.

— Você precisa de mais espaço, e você pode me pagar o valor restante, já que não precisa se preocupar em pagar o tratamento. Assim, teria mais conforto, e esse apartamento em que você mora é lindo e fofo para uma pessoa... – eu a interrompi.

— Não podia usar o dinheiro da venda da casa para comprar um apartamento maior, mesmo que mais barato. Tive que guardar para o tratamento.

— Não precisa guardar mais, e também, a varanda do meu apartamento dá acesso ao seu quarto para algum cavalheiro subir até lá. – ela disse com um sorriso malicioso.

— Mika! – disse rindo.

— O que? Já comprovei essa teoria. Assim, o Rafael poderia subir pela varanda até você, como o Romeu, e lhe dar muitos beijos…

Nós duas rimos. Eu não sabia por que ela de repente tocou no nome do Rafael. Naquele momento, achei que era apenas para descontrair e não para saber se eu lembrava da noite anterior.

— Bom, pense nisso... Vou sair e volto logo... – ela disse estendendo a mão e segurando a minha.

— Ah, a sopa... Vou pensar. Obrigada novamente.

Mikaela saiu e acho que demorou umas quatro horas para voltar. Enquanto isso, assisti ao filme de Romeu e Julieta, que tem três horas de duração. O jeito que ela falou me fez querer ver um romance trágico de Shakespeare. E novamente, eu não entendia por que eles se mataram se poderiam simplesmente fugir. Naquela época, não havia tecnologia e eles não seriam encontrados facilmente, ou não seriam achados se fossem para longe o suficiente em navios cargueiros. Mas ainda assim, o sacrifício mostrava que o amor era verdadeiro. Não sei se beberia veneno pelo Rafael... Ri dos meus próprios pensamentos, e então me lembrei de estar abraçada com ele na minha cama, enquanto assistia a esse romance trágico, quando Mikaela voltou.

— Demorei muito? – ela perguntou, parecendo cansada.

— Só a manhã inteira, assisti a Romeu e Julieta. – respondi, debochando.

— Hum... filme longo... Desculpe, eu me enrolei...

— Tudo bem, não precisa ficar comigo o dia todo...

— Não mesmo, mas você é a única amiga que tenho, e gosto da sua companhia tóxica, então não é um sacrifício. – Ela disse revirando os olhos e rindo.

— Vou fazer a sopa.

Sentia uma estranha tensão no ar, então decidi levantar da cama, mesmo ainda estando um pouco debilitada. Queria ficar perto de Mikaela, jogar conversa fora, sei lá, qualquer coisa que me livrasse dos meus pensamentos. Cheguei na cozinha e sentei no banco do balcão, começando a falar.

— Sonhei com o Rafael ontem... – ela parou por um segundo e se virou para mim.

— Sonhou o quê? – perguntou, com os olhos brilhando.

— Que ele estava aqui, segurando minha mão e ficando abraçado comigo. – eu disse, emocionada.

— Sem sacanagem então? – ela disse rindo.

— Mikaela, você cortou minha lágrima! – respondi rindo. — Ele dizia que estaria ao meu lado, queria que esse sonho fosse real.

— É só você contar a ele e ver se ele vai fugir...

— O que te faz pensar que ele não vai embora?

— Eu simplesmente acredito nele, em todas as coisas que você falou. Já disse para você, não seja tola. Conte a verdade.

— Tudo bem.

Voltei para a cama decidida a contar a verdade para ele no dia seguinte. Depois que Mikaela terminou a sopa, nós nos sentamos e assistimos a alguns filmes, até que dormimos juntas.

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