Verdade Parcial

PONTO DE VISTA DE CAUÃ BLACKWOOD 

Saí da sala do Conselho rumo ao meu quarto. 

Quando comecei a subir a escada escutei uma voz irritante:

— Alfa! 

— Irina, o que está fazendo aqui? Não mandei chamá-la.

— Cauã, precisamos conversar. O Conselho propôs…

— Primeiro, para você sou o Alfa, o meu nome só pode ser proferido por quem é próximo a mim. E você não é uma dessas pessoas. Quanto ao Conselho, esqueça. Jamais me casarei com você. A partir de hoje, você está proibida de entrar na casa principal sem a minha autorização. Guardas, nunca mais deixe-a entrar aqui. SAIA!

Ela saiu correndo e chorando.

— Você acha que vai ocupar o lugar que supostamente deveria ser de Sakari? Nunca. — Sussurrei.

Subi as escadas que davam acesso ao primeiro andar da casa. 

Entrei na minha suíte, arranquei a minha roupa. Estava tão cansado que elas pareciam pesar mais que o normal. Fiquei por um tempo nu, olhando pela janela e contemplando o pátio, o lugar onde tantas vezes brincamos juntos, eu, Sakari, Wally e tantos outros filhotes. E não poderia deixar de lembrar do fatídico dia que cometi o maior erro da minha vida. Chutar uma bola, quebrar a vidraça da sala do Conselho e culpar a minha possível companheira…

Após tanto tempo imerso nos meus pensamentos, tomei um banho demorado e fui até o centro de treinamento falar com Jake novamente.

Quando ele me viu, disse:

— Alfa, eu sabia que viria.

— Então deve saber o motivo.

Ele assentiu com um movimento de cabeça.

— Vamos sair daqui. 

Jake se transformou em lobo e eu também. 

O dele era marrom e o meu era negro. De uma cor preta intensa e brilhante, porém com o reflexo do sol, alguns pontos pareciam pêlos azulados.

Saímos em disparada pelo interior da floresta. As árvores foram ficando cada vez mais próximas e com formas estranhas.

Diminuímos a velocidade após passar por uma demarcação com uma placa que dizia Entrada Proibida. Continuamos por mais alguns quilômetros, chegando quase ao fim da mata. Paramos em frente a uma cabana em ruínas

Ele voltou a sua forma humana e eu também. 

— Foi aqui que tudo aconteceu. Tem duas informações que não falei na reunião. A primeira, foi que enquanto a bruxa fazia o seu feitiço, uma tatuagem preta começou a ser desenhada desde o pescoço até o antebraço de Sakari. Acho que se lembra sobre eu ter mencionado sobre ela antes…

— Sim. Fiquei muito intrigado, inclusive passou a ser mais uma referência física nas buscas.

Jake abriu a porta e mostrou o pilar, as cordas podres ainda estavam no chão. Um monte de cinzas no canto da parede.

— Quando tudo terminou, já era noite, foi muito estranho, pois não percebemos o tempo passar. Eu corri, desamarrei as cordas que lhe prendia e peguei a Pequena no colo para levar embora. Não tinha onde segurar nela. Ela não respirava mais. — Suspirou e continuou: — Eu realmente achava que ela estava morta. Não ouvia seus batimentos cardíacos e nem a sua respiração. O seu cheiro já não era mais da nossa espécie e sim de uma humana. O seu pai já havia sido avisado pela bruxa que provavelmente, ela não aguentaria, mas mesmo assim, ele exigiu que fizesse o feitiço.

Eu queria perguntar algo mais, mas as palavras não sairam.

—  Antes do Alfa Kall e os outros membros do Conselho saírem,  tinham dado a ordem para jogá-la numa vala, caso ela morresse. Sem o mínimo de remorso ou tristeza. 

— Jake, ainda não entendo, por que ele fez algo tão abominável. Se ele tinha medo dela, por que só não a baniu? Era preferível tê-la tornado uma Renegada do quê…

Eu não conseguia pronunciar "matá-la"...

— Alfa, sei como se sente. Apesar de eu ter feito muita coisa errada a mando do seu pai, aquilo foi demais para mim. Por isso, omiti a segunda informação e a mais importante… Como eu poderia apenas jogar o corpinho de Sakari numa vala, sabendo o quanto aquela garotinha que me adorava? Assim que cheguei perto do local, coloquei um saco grande no chão, e depositei-a com todo cuidado sobre ele e comecei a cavar a terra. Eu daria pelo menos um enterro decente para ela. Não poderia queimar o seu corpo conforme costume, pois poderia chamar a atenção.

Nessa hora nós dois tínhamos lágrimas correndo pelo rosto.

— Depois de um tempo, eu vi que ela parecia respirar com dificuldade. Saí da cova, coloquei o ouvido no seu peito e seu coração tinha voltado a bater. Estava muito fraco, mas batia. Rasguei parte do seu pijama e joguei bem a frente na vala. Tapei o buraco. Minutos depois, ouvi o barulho de um carro. Corri, coloquei o seu corpo na estrada com cuidado. Sei que arrisquei, mas pelo barulho o carro parecia que estava em baixa velocidade. 

Limpei o meu rosto e Jake também.

— Um humano? Só os humanos dirigem assim nessa estrada de terra. — Eu constatei.

— Sim. Fiquei escondido. O carro parou. Um homem vestido todo de preto e boné saiu do interior dele e veio até a criança. Por sorte ou por providência da Deusa da Lua, acredito que era um médico humano, pois desceu com uma maleta e checou os sinais vitais de Sakari. Pegou algumas talas e as amarrou nos braços e pernas dela. Com muito cuidado a colocou no carro. 

— E a placa, você viu? — Perguntei ansioso por uma pista.

— Sim, dias depois um humano conhecido meu, fez a localização, porém o carro tinha ido para o ferro velho. 

— Pelo jeito, depois deste dia perdeu todos os seus rastros. Chegou a procurar uma bruxa, para tentar achá-la?

— Sim, mas não foi possível sem um objeto pessoal ou cabelo ou sangue dela... Todos vestígios dela foram apagados da comunidade. Até as minhas roupas que tinham o sangue dela foram queimadas assim que voltei, conforme ordem do seu pai. No entanto, quando me ordenou a procurá-la, eu fui em todos os hospitais humanos da região. Porém, como se passaram muitos anos, ninguém sabia e não havia o registro em nome dela.

— Não sei como, mas o meu coração diz que Sakari está viva. — Eu disse confiante.

— Eu peço a Deus da Lua, todas as noites por ela, apesar de saber que se ela sobreviveu, é apenas uma humana. Você sabe que se ela estiver viva, mesmo que seja a sua predestinada, nunca poderão ficar juntos, certo? Acredito que até o aroma de companheiros você não conseguirá mais sentir.

— Eu sei. Por saber disso, estou quase enlouquecendo. No entanto, preciso saber se ela ainda está viva. Quero vê-la pelo menos de longe. Não sei se terei coragem de encará-la de frente. Me sinto péssimo com tudo  isso. Reconheço que a culpa pelo que aconteceu com ela, foi minha. Se fosse eu no seu lugar… Eu me odiaria.

— Não pense assim. Vocês eram só crianças, cabia ao seu pai como adulto apaziguar e entender. Acredito que o seu pai só se aproveitou de uma situação. Mais cedo ou mais tarde, ele faria o que fez. Não foi sua culpa.

Na hora achei estranho esse comentário, mas precisava saber mais sobre a Sakari.

— Jake, eu sei que quer aliviar a minha culpa, mas não consigo ver de outra forma. Você ouviu algo se esse feitiço era reversível? 

— Não sei. Alguns dizem que quando uma bruxa morre os seus feitiços também acabam. Mas não sei se um feitiço proibido se enquadraria nesse contexto.

— A bruxa morreu? 

— Sim, quando acabou de fazer o feitiço. Ela virou cinzas. — Ele apontou para o monte no canto. 

Era um tipo de cinza estranha, não era leve como as normais. Se fossem normais não estariam no mesmo lugar após tantos anos. 

— Então, tenho uma chance, se ela realmente for a minha companheira… Eu preciso encontrá-la. — Eu falei ansioso.

— Alfa, não quero te desanimar. A bruxa falou alto que Sakari não teria mais um lobo depois de… perder os seus poderes. Pelo jeito, a bruxa deu a sua vida para garantir isso. Aquele não foi um feitiço qualquer.

Jake parecia esconder algo…

— Não pode ser. Não sei porquê, mas sinto que não está me contando tudo. — Eu falei.

— A única coisa que posso te dizer é que, se Sakari sobreviveu, ela deve nos odiar. — Ele disse e suspirou.

— Eu tenho plena consciência desse fato, mas não vou desistir. Espero que continue firme nesse propósito, também. Vamos continuar mantendo em segredo está parte da história até encontrá-la. 

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Comments

Lena Lima Lima

Lena Lima Lima

Ela deve ser um anjo.

2024-03-19

3

Lena Lima Lima

Lena Lima Lima

Que ansiedade pra saber o que acontecerá kkk

2024-03-19

0

Angela Valentim Amv

Angela Valentim Amv

Eu acho que ela virou uma bruxa

2024-03-17

1

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Capítulos
1 O Castigo
2 O Teste
3 A Busca
4 A Suposta Companheira
5 A Atrocidade
6 Verdade Parcial
7 Nova Identidade
8 O Cargo de Delegada
9 Reencontro
10 Observando Maia
11 Quem é Você de Verdade
12 A Casa de Maia
13 A Suposta Companheira do Alfa
14 O Rei Dos Vampiros
15 Esperança
16 O Lobo
17 Visitantes
18 Cauã X Vlad
19 Outra Visão
20 Emoções de Cauã
21 Conselho de Amigo
22 Branca Como Papel
23 Submetam-se
24 Novidades para Maia
25 Meu Irmão
26 Pedido de Perdão
27 Quase Te Chamei de Papai
28 Invasão de Privacidade
29 Presente de Aniversário
30 Agradecimentos Feitos Pessoalmente
31 Conversa a Sós
32 O Beijo
33 Mais novidades
34 A Aberração
35 Dádiva E Não Maldição
36 Especulações ou Certezas
37 Não Seja Um Lobo Mau
38 É Ela
39 Talvez Fosse Uma Despedida
40 O Medo de Maia
41 A Chegada de Lucena
42 Difícil Esconder Algo
43 Arquitentando Um Plano
44 Procrastinação e Descuido
45 Permissão do Supremo
46 Início do Plano
47 Ouvindo Rumores
48 Encontrando o Supremo
49 Ainda Tem Dúvida
50 Visita Rápida
51 O Grande Dia
52 Insegurança
53 Plano Concluído
54 Assunto Pendente
55 Ameaça do Supremo
56 Julgamento: Parte I – Os bruxos
57 Julgamento: Parte II — Sakari Vive
58 Julgamento: Parte III — O Filho
59 Julgamento: Parte IV – Verdades Expostas
60 Nova Voz do Oráculo
61 Final do Julgamento
62 Segunda Chance
63 A Nova Era
Capítulos

Atualizado até capítulo 63

1
O Castigo
2
O Teste
3
A Busca
4
A Suposta Companheira
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A Atrocidade
6
Verdade Parcial
7
Nova Identidade
8
O Cargo de Delegada
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10
Observando Maia
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Quem é Você de Verdade
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A Casa de Maia
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A Suposta Companheira do Alfa
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Esperança
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Cauã X Vlad
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Outra Visão
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Novidades para Maia
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Meu Irmão
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Quase Te Chamei de Papai
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