Marina x Alexandre

Depois de uma noite tranquila, eu acordo pronta para mais um dia. Saber que os meus dias de descanso estão chegando em um litoral maravilhoso do nordeste, eu quero mais ser feliz. Nada vai abalar minhas estruturas nesse dia, disso eu tenho certeza.

Conversei com Laila ontem e já está tudo certo para nos encontrarmos em breve. As meninas já estão indo para ilhéus, nesse final de semana, pois vamos passar as festas de final de ano na fazenda dos pais de Laila e já ficaremos para o casamento.

Pedi minha secretária que compre minha passagem, quero resolver todos os meus casos o mais rápido possível nesses cinco dias, pois o fórum entra em recesso dia vinte e hoje já é quinze. Eu quero chegar no mesmo dia em que as meninas, temos planos de muita praia, água de coco e o descanso da beleza.

Chego no escritório e minha secretária está atolada de serviço e vem com minha agenda para a semana.

__ Doutora Marina, eu não consegui passagens para a senhora, somente um voo de madrugada, na primeira classe no dia vinte e quatro.

__ Como assim, dia vinte quatro? Eu marquei de estar com as meninas dia vinte.

Eu paro, penso...

__ Isso pode ser um sinal!

Eu tenho pavor de viagem aérea, na verdade eu morro de medo de avião. E agora não acho passagem. Eu devo rever meus conceitos e aceitar meu destino. Deve ser algum livramento, é melhor eu aceitar, do que morrer.

Penso milhares de besteiras do tipo: Avião caindo, pane, tempestade de neve... Espera!!! ...Não cai neve no nordeste. Então são hipóteses infundadas.

Rio da minha loucura e quando dou por mim, estou rindo sozinha e falando comigo mesma e a secretária me olhando sem entender nada.

__ Pois não, Gislene. O que você deseja?

Falo tentando parecer normal, quando pareço surtada:

__ É que a senhora tem uma audiência de conciliação no fórum hoje às quatorze horas.

A audiência de conciliação é

conduzida por um mediador ou conciliador, os advogados conversam com o casal tentando transformar o divórcio litigioso em consensual, expondo as vantagens de se fazer um acordo. Caso haja, o juiz homologa o acordo, decreta o divórcio e o processo acaba, e eu saio de férias sem dores de cabeça para quando voltarmos e tudo estará resolvido.

Ela me entrega a pasta, me deixa a par do casal em questão, dou uma arrumada no cabelo e uma ajeitada na roupa e saio toda de nariz em pé.

Espero que Rafael aceite as condições impostas por mim e por minha cliente, assim ficará fácil para todos nós.

Ao chegar no fórum já dou de cara com Natália, sinceramente eu me separaria dela a vendo nesse estado. A mulher está descabelada, um conjunto de moletom surrado e o cabelo em um coque malfeito, com cara de quem não lava a muitos dias.

Impossível que um término de casamento deixe uma mulher nesse estado. Ela parece ter sido atropelada pela debandada do rei leão, porém não morreu ainda. Será a próxima com certeza se não levantar essa cabeça.

__ Doutora Marina, a senhora demorou. Eles já estão lá dentro, esperando a gente.

__ Venha aqui!

A puxo pelo braço entrando no banheiro, tiro uma blusa que sempre deixo na bolsa, caso haja um imprevisto, retiro sua blusa de moletom e jogo no lixo do banheiro, pego um pente e dou uma ajeitada em seu cabelo o prendendo em um coque bem-feito e lhe faço uma maquiagem leve.

Ela me abraça em agradecimento e uma mulher que sai do banheiro nos olha espantada:

__ Aqui é um local sério, não é lugar de mulheres ficarem se esfregando.

Olhamos uma para outra e nos afastamos.

__ Agora, mulheres não podem ao menos serem amigas.

Falo a fazendo dar um leve sorriso.

__ Vou te dar um conselho, Natália!

Falo em quanto caminhamos até o local onde será feita a conciliação.

__ Pode falar, você tem me ajudado muito.

Quando ela diz isso eu pego mais fôlego e paro diante de uma linda mulher que não está se valorizando:

__ Não existe homem no mundo que vale o seu sacrifício, essa dor e esse sentimento de derrota, ele não está sentindo. Mostre a ele que o coitado aqui é ele e que você quer seus direitos e os direitos dos seus filhos. Você tem a chance de se vingar da traição dele, mas não mostre que está sofrendo por ele, se for para sofrer, que seja no caribe e curtindo com o dinheiro dele.

Ela abre um sorriso e eu aprumo seu corpo e digo:

__ É agora ou nunca!

Entramos na sala e ambos ficam de pé a nossa frente. Ao nos ver juntas, Rafael desejou ser abduzido por uma nave mãe e levado para outra galáxia.

__ Que coincidência, doutor Alexandre, nós dois frente a frente em mais um caso de família.

__ Sim, doutora Marina. Já está ficando clichê, você não acha?

__ A frequência dos nossos encontros, se justificam pela nossa profissão.

Falo pegando na mão dele e o cumprimentando com formalidade e a mesma coisa faço com Rafael que não sabe se me olha, ou olha para a linda mulher que está a sua frente e que ele perdeu por mais um deslize ridículo, agora não está tão abatida como antes e pronta para o desafio:

__ Estamos bem! As crianças ficaram com minha mãe.

Ele parece querer falar e perguntar mais algumas coisas, mas eu sinto que só está fazendo isso para convencê-la a mudar de ideia.

Entrego a eles a proposta dentro da lei, eles tentam um acordo. Percebo que Natália não olha na cara do advogado do marido, parecem ter um vínculo ou uma rixa antiga.

__ O meu cliente quer que o divórcio seja consensual, e não precisa ser levado para o litigioso.

__ Doutor Alexandre, isso é fácil de resolvermos. Aceite nossa proposta, terminaremos com isso em dois tempos:

A guarda das crianças ficam com a mãe e as visitas duas vezes por mês, com data e horário a combinar.

A divisão dos bens adquiridos durante os últimos seis anos.

E uma pensão de sessenta mil reais por mês.

__ Você só pode estar louca, eu não aceito esse acordo.

Rafael fala áspero e batendo a mão a mesa.

Eu me levanto, aceno a cabeça para Natália que faz o mesmo. Arrastando as cadeiras com as nossas pernas, começo a juntar todos os documentos.

__ Espere! Deixe eles conversarem a sós, foram casados por seis anos e podem entrar em um acordo amigável.

Doutor Alexandre fala querendo chegar a um acordo amigável para não estender essa história.

Natália concorda e eu os deixo sentados a mesa. Eu a orientei a não se enganar por aquele charme, ele é esperto e vai tentar convencê-la.

Saio para a porta e fico de olho na conversa, doutor Alexandre se aproxima e seu perfume é do tipo que deixa a mulher desnorteada:

__ Você jogou alto, pelo visto tem algum trunfo na manga.

Ele fala com um charme irresistível, mas em mim, não cola.

__ Sempre tenho, e conheço os homens, sei o que mais os atinge.

__ Há possibilidade de um acordo no valor da pensão?

__ Sim, vamos para o litigioso, eu provo com documentação que ele pode pagar bem mais que isso e algumas propriedades do seu cliente que estão em nome de laranjas e sonegação de impostos.

Dou-lhe um sorriso e ele retribui com um sorriso nervoso como se chegássemos a um acordo.

__ Pronto, preciso falar com você, Rafael.

Ele sai de perto de mim apavorado, leva seu cliente no canto da sala, conversa por alguns instantes e Natália está nervosa. Eu lhe dou um sorriso de confiança e pisco para ela que retribui o sorriso.

__ Meu cliente aceita, podemos assinar o acordo.

Dou um sorriso de vitória e Natália solta os ombros com um alívio imediato.

Ao sairmos do fórum eu cumprimento o advogado que está com muita raiva de mim e a Rafael. Em um momento em que fico sozinha guardando os papéis na pasta, Rafael se aproxima e diz:

__ Você está muito satisfeita, conseguiu se vingar de mim.

__ Não, eu não me vinguei de você, apenas vi você cair em seu erro, e por incrível que pareça, no mesmo erro. E se errar de novo eu vou fazer meu trabalho como cortesia, apenas para ver sua cara de cachorro que caiu do caminhão de mudança.

O deixo bufando e espumando feito cachorro bravo. Faço meu trabalho no fórum e estou saindo, quando sou surpreendida por doutor Alexandre.

__ É impressão minha ou você e o Alexandre tem uma desavença?

Não é da conta dele, mas posso ser mais gentil.

__ Da minha parte está tudo tranquilo, mas e você e Natália, tem alguma coisa?

__ Não, eu não tenho nada com ela.

Você aceita um café?

__ Agradeço, fica para uma outra hora.

Se eu tomar um café com esse homem, corro o risco desse perfume me enlouquecer.

Saio e ele fica me olhando, ele não me engana, tem alguma coisa errada com ele e com Natália e coitado dele, se acha que me ganha com um cafezinho...

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