O Rei Mafioso Obcecado por Mim
Capítulo — Liberdade Sangrenta
Alexia
Tenho que correr.
Tenho que ser rápida.
Tenho que salvar minhas filhas.
O pensamento martela dentro da minha cabeça como um tambor de guerra. Meus passos são apressados, mas silenciosos, o coração disparado ecoa mais alto que os meus próprios passos pela escuridão fria do corredor de concreto. A masmorra que me aprisionou por quinze anos parece se despedir com um sussurro gélido em minha nuca. O "lar" onde fui despida da minha identidade, da minha dignidade, da minha liberdade.
Mas não hoje.
Hoje, eu fujo.
Hoje, eu recomeço.
Na saída dos fundos, o vulto de um homem me espera. Meu tio Marcus. A primeira alma viva a me estender a mão sem exigir nada em troca desde que meu pesadelo começou.
— Aqui está a sua nova identidade. — Ele me entrega uma pasta com documentos falsos. — A das meninas também. A casa está no nome de uma antiga namorada, não tenho nenhum vínculo com ela. Um amigo meu garantirá a segurança de vocês lá. Ele… — Marcus limpa a garganta, os olhos varrendo os arredores. — Ele me prometeu que a cidade é segura, arrumou um emprego para vocês duas. Aqui estão as chaves do carro e da casa. Tudo está pronto.
A mochila nas minhas costas está pesada — não pelo peso do dinheiro que roubei dele nos últimos cinco meses, mas pelo risco que ela representa. Cada nota foi retirada com cautela, cada plano traçado no silêncio dos meus pensamentos, sufocados por gritos que nunca cheguei a soltar.
Meu braço direito lateja. O local onde arranquei o chip rastreador pulsa com dor crua, um sangramento quente e espesso escorrendo sob a manga. Mais uma cicatriz entre as dezenas espalhadas por meu corpo.
Uma lembrança.
Uma marca.
Um lembrete do inferno que estou deixando para trás.
— Aqui está a senha do cofre que você vai encontrar na nova casa. — Ele desliza um bilhete para minha mão. — Mia já está no carro com as meninas. Vamos, temos que aproveitar enquanto ele está em reunião com os homens no hotel Lenux. Essa pode ser nossa única chance. Se ele descobrir… ele vai colocar vocês de novo em jaulas de ferro.
Marcus se agacha, pegando duas das gêmeas no colo com agilidade surpreendente para um homem da idade dele. Eu me abaixo e pego a terceira menina. Seu rostinho sonolento repousa contra meu ombro. Ela não faz ideia do quanto sua vida depende do silêncio dessa noite.
Corremos.
Sem olhar para trás.
Sem tempo para hesitar.
Do lado de fora, o ar noturno me fere como uma bofetada. Frio, cortante, sujo. Mesmo assim, é liberdade. É diferente do ar viciado e úmido da masmorra onde minha respiração era contada em soluços.
O carro nos espera, um utilitário escuro com placas clonadas. Cadeiras de bebê já instaladas. Documentos no porta-luvas. Tudo meticulosamente preparado.
Mia está no banco do motorista. Minha prima. Firme. Séria. O olhar dela cruza com o meu e um entendimento silencioso passa entre nós. Aceno. Ela retribui. Nenhuma palavra é dita — não precisamos.
Marcus me ajuda a prender as meninas com rapidez, o gesto hábil de um homem que já resgatou pessoas de zonas de guerra. Quando termina, me puxa para um abraço.
— Vamos nos encontrar daqui alguns meses, quando as coisas acalmarem. Não é um adeus, Alexia. É um até logo. — Ele sussurra contra meu cabelo, com a voz embargada, e me conduz ao banco do carona.
— Vão. — Ele bate duas vezes no capô.
Mia liga o motor e acelera, abandonando a cidade maldita que nos tragou por tanto tempo. O carro serpenteia por uma estrada escondida, longe das vias principais, exatamente como Marcus havia traçado.
Na paisagem, os prédios e ruas vão sumindo, substituídos por florestas densas e uma escuridão mais profunda — mas, dessa vez, sem grades.
Por um momento, deixo minha mente vagar.
Um novo nome.
Uma nova vida.
Um novo começo.
Era tudo o que eu queria.
Desde o momento em que descobri que ele não planejava apenas me manter como prisioneira, mas moldar as minhas filhas para serem o que fui para ele — brinquedos quebrados.
O sangue esfria em minhas veias com a lembrança. A urgência que me guiou até aqui foi alimentada por esse terror.
— Finalmente… — sussurro, com a voz embargada. — Depois de meses de planejamento, estamos fora.
— Sim — responde Mia, o olhar fixo na estrada escura. — Devemos começar a nos chamar pelos novos nomes. O que o vô Marcus não te contou é que vamos para o outro lado do país. Ele escolheu uma cidade onde ninguém daqui tem contatos. Pesquisou a fundo. O amigo dele é alguém influente, que garantiu proteção total. Nada foi feito em papel ou rede. Sem digitais. Tudo pago em dinheiro vivo, e por intermediários que nem sequer sabem quem somos.
— Meu Deus… — suspiro, impressionada.
— Você tem um emprego garantido na universidade local. Mas só começa em três meses. Eu vou trabalhar num estúdio de tatuagem. As meninas estão matriculadas numa creche de alto padrão. Já está tudo pronto. Lá, eu serei a mãe oficial delas. Por causa da aparência, é mais seguro assim. Teremos que mudar o visual — cabelo, roupas, tudo. Nada de redes sociais, fotos, rastros digitais. Somos fantasmas, Alexia.
Assinto.
Isso não é liberdade plena — é sobrevivência disfarçada.
Mas ainda assim, é vida.
— Tem um jato nos esperando três cidades depois. Você precisa descansar. Sei que não está curada… da última vez. — Ela faz uma pausa delicada. — Seus antibióticos estão no porta-luvas. Também tem um kit de primeiros socorros. Enfaixe o braço, estou sentindo o cheiro do seu sangue daqui.
Minhas costelas protestam com cada respiração.
Minhas partes íntimas… ardem, inchadas, doloridas.
O sangramento, apesar dos pontos, escorre devagar entre minhas pernas.
Um lembrete de que ele não esperou minha recuperação após o parto.
Mais uma vez, ele me usou, me rompeu, me esvaziou.
Mas não me matou.
E isso, agora, é o erro dele.
— Obrigada… — murmuro, alcançando os remédios.
Tomo os comprimidos secos, sem reclamar do gosto. Enfaixo meu braço como posso. O sangue empapa a gaze, mas pelo menos o ferimento está coberto. Reprimo o gemido quando a dor atravessa meu peito. Não posso acordar as meninas. Elas merecem ao menos esse sono tranquilo.
Encosto a cabeça no vidro. Lá fora, as árvores parecem nos observar, cúmplices silenciosas da nossa fuga.
Eu prometo que vou protegê-las.
Com a minha vida, se for preciso.
Meus olhos pesam.
Não consigo evitar.
O sono me vence.
Mas não é descanso.
É um mergulho em pesadelos.
Vejo as correntes.
Ouço os gritos abafados.
Sinto o cheiro de suor, sangue e esperma.
Revivo cada vez que fui usada. Cada vez que ele me olhou como se eu fosse um objeto. Cada vez que ele me lembrou que eu era dele.
Não sou mais.
Acordo sobressaltada quando Mia encosta o carro no acostamento de uma trilha escondida. Ela me olha com um leve sorriso.
— Estamos quase lá. Falta pouco. Você dormiu por quase duas horas. Não gritou nenhuma vez, isso já é um progresso.
— Eu estava cansada. — Murmuro, ajeitando a blusa sobre o peito dolorido.
Ela suspira.
— Quando estivermos na casa nova, você vai precisar de cuidados médicos de verdade. O vô Marcus já providenciou alguém que atende sem perguntar nada. Vai te examinar com cuidado. As costelas, os pontos, os danos… tudo.
Agradeço em silêncio. Não consigo falar. A garganta está seca demais. A mente, cheia demais. O coração, despedaçado demais.
Minhas filhas ainda dormem.
Tão pequenas. Tão inocentes.
Ainda não sabem o que foi preciso para chegarmos até aqui.
Mas um dia, talvez, eu conte.
Não para chocar.
Mas para que saibam que a mãe delas sobreviveu ao inferno… por elas.
E que mesmo quebrada, ferida, exausta, lutou até o fim.
Até que, enfim, fomos livres.
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Atualizado até capítulo 38
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