Uma estrangeira

Quando chegamos na casa de Samir percebo que está amontoada de gente, as pessoas parecem exaltadas. Vejo Samir gritando, uma mulher chorando, ele se parece com ela, talvez seja sua mãe. Ele sai com pressa, e eu fico lá, totalmente perdida. Acredito que eles estão discutindo, em árabe talvez? Não entendo nada. Com Samir vinha conversando em português, ele fala um pouco e também não conversamos tanto, eu falo muito bem inglês, francês e espanhol, pois os meus pais sempre fizeram questão de quê eu estudasse nas melhores escolas, mas o que eles estão falando aqui não consigo entender. E agora, o que eu faço? Estou tão cansada de tudo o que aconteceu e ainda sinto o meu corpo meio fraco.

Me encosto num canto da parede, como está quente aqui e tumultuado de gente e vozes, olho ao redor e busco alguém conhecido ou pelo menos amigável, gostaria de deitar um pouco, tirar essa roupa quente, esse lenço deixa-me agoniada, sufocada. Volto a sentir as sensações que senti no avião, estou com dificuldade para respirar, e vejo pontos escuros na minha frente, até a minha vista escurecer completamente, perco a força das pernas e não vejo mais nada.

Quando acordo vejo que estou num sofá, algumas mulheres ao meu redor, uma me da um copo com uma bebida que parece chá, bebo e ela fala comigo, continuo sem entender. Até que ela fala em francês:

-Quem é você, minha filha?

-Sou Virgínia-Respondo.

-Como se sente?

-Um pouco tonta, mas melhorando agora.

-De onde você veio? Ninguém te viu aqui antes.

-Eu vim com Samir, eu sou brasileira.

-Com Samir? -a senhora me pergunta sem entender a situação.

-Sim, nós nos casamos no Brasil, sou esposa de Samir agora.

-Alaah abençoe sua vida, seja bem vinda a nossa casa, agora você também é a minha filha- A senhora fala me abraçando ardentemente.

Eu fico feliz e emocionada com ela, eu estava precisando tanto disso, a abraço de volta e meus olhos também ficam marejados, ali me sinto reconfortada.

-Vamos, todos vocês, vamos trazer meus filhos de volta, e digam na praça em alto e bom som que Samir está casado e Sâmia agora também pode se casar, não haverá desonra, e nem sofrimento em nossa casa, vamos, vão todos-Vejo o senhor falando, de barba e cabelos brancos, seria ele o pai de Samir? Não sei, mas permaneço sentada, meio atônita.

Em alguns minutos vejo o senhor entrar pela casa, muito irritado, trazendo uma moça pela mão, chorosa, machucada, Samir entra também com uma expressão péssima, e atrás dele um outro homem, estranho, com um olhar sombrio e enfurecido. Vejo Samir me procurando com o olhar, eu estou num canto, ainda meio atordoada...

O senhor ordena para nos sentarmos, e começa a falar:

-Samir, esta moça aqui afirma ser sua esposa, isso é verdade, filho?

-Sim, pai- Samir fala me chamando para perto dele- Eu ia contar e quando cheguei me deparei com toda essa confusão, conheci Virgínia quando viajei ao Brasil ano passado, e agora resolvi me casar com ela, pai, essa é sua nora. Virgínia cumprimente seus sogros...

Eu fico meio sem jeito e estendo a minha mão para o senhor que Samir me mostra, vejo que ele não me retribui, fico sem jeito, já a senhora vem em minha direção e novamente me abraça e me chama de filha, me deseja boas vindas, dou um sorriso amarelo enquanto ela diz:

-Filho, porquê não nos falou antes o que estava acontecendo?

-Eu não tive tempo mãe. Samir responde também sem jeito.

-Que Alaah os abençoe- Ela fala nos abraçando.

-Uma estrangeira, Samir? Onde você estava com a cabeça? Você não tem medo dos castigos de Alaah? Olhe para ela, olhe como ela se comporta diante de mim.

Eu fico constrangida, não fiz nada de errado.

-Pai, ouça, ela vai se adaptar, ela acabou de chegar e já se deparou com tudo isso-Samir diz

-Eu não aceito, eu não aceito essa qualquer aqui na minha casa, ela não será a minha filha, não será mãe dos meus netos, eu quero ela fora daqui.

Eu já cansei de tanta confusão, sabe, desisto. Eu sabia que tudo estava estranho, mas já está além da conta, eu vou embora. Pego a minha bolsa que estava na mesinha de centro e digo:

-Sabe, eu não vou ficar onde não sou bem vinda, não se preocupem, estou indo embora agora mesmo.

-Virgínia, espere, fique filha, por favor-Ouço a voz da mãe de Samir falando comigo- Além de quê agora a pouco você acabou de desmaiar aqui mesmo, fique.

-Desmaiar?- Samir disse espantando. Virgínia o que você tem? Eu esqueci do médico.

-Nada, eu não tenho nada. Eu só estou cansada disso, por isso vou embora agora.

-Virgínia, você não pode ir a lugar algum-Samir me disse.

-Claro que posso, você não é meu dono.

-Não sou seu dono, sou seu marido e você deve me obedecer, você está proibida de cruzar aquela porta ou não respondo por mim.

-Claro, agora além de sequestrador você virou assassino? Eu digo em tom de revolta.

-Filho, o que essa qualquer está dizendo? Faça com que ela se cale ou eu mesmo farei- O pai de Samir fala me jnterrompendo.

-Pai, ela só está assustada, deixe que eu castigarei minha esposa, o senhor cuide de achar o bastardo que desonrou Sâmia e providencie esse casamento ao cair da noite de amanhã. chega disso tudo. Vocês todos, vão para suas casas agora, a noite teremos um casamento aqui, e quem está falando sou eu, o chefe do clã, retirem-se imediatamente e espalhem que Samir está casado e Sâmia também se casará e reparará sua honra, enquanto a você-Samir me puxa pelo braço-

-Que história é essa de sequestro, Samir?

-Pai, ela errou a palavra, ainda está aprendendo o idioma, não é mesmo, querida? Nos entenderemos lá em cima, vamos agora!

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