À medida que seus olhos se fixavam na entrada cintilante da caverna de ametista, uma irresistível onda de fascínio envolvia o rapaz. Uma força sutil, mas inegável, o impelia na direção daquela escuridão reluzente. A curiosidade dançava em seus olhos, traduzindo-se em uma expressão de encantamento e anseio.
Sem desviar o olhar, ele iniciou uma jornada hesitante, um passo de cada vez, como se estivesse prestes a desvendar segredos cósmicos há muito tempo guardados. A cada passo, a atração aumentava, e a entrada da caverna se aproximava como um portal para o desconhecido.
Ao atravessar o limiar, uma sensação única o envolveu. O solo frio sob seus pés oferecia uma realidade palpável, contrastando com a luminosidade celeste das paredes de ametista. A dualidade de sensações era hipnotizante, um convite para explorar o universo encapsulado naquelas pedras preciosas.
O toque gélido da rocha reverberava em suas solas, enquanto a luminosidade roxa envolvia seu ser. Cada detalhe da caverna parecia sussurrar segredos antigos, chamando-o para uma jornada interior. A profundidade das emoções se misturava com a atmosfera mágica, transformando o frio da rocha em uma carícia celestial.
A cada passo adiante, o rapaz sentia uma conexão inexplicável com o cosmos contido naquele espaço sagrado. A caverna não era apenas um refúgio físico; era um mergulho nos recônditos de sua própria alma. A incerteza inicial se transformava em uma entrega gradual à maravilha que o cercava, como se estivesse prestes a desvendar os mistérios entrelaçados na luz pulsante da ametista.
A cada respiração, o garoto absorvia não apenas o ar frio da caverna, mas também a essência transcendental que permeava o ambiente. Um eco de admiração e reverência preenchia seu coração, enquanto ele se via imerso na magia indescritível da caverna de ametista, um lugar onde o universo e a alma se entrelaçavam numa dança mística e inesquecível.
— uau, é uma bela caverna, o que será que tem no final?
De repente, o chão sob seus pés cedeu repentinamente, como se toda a terra estivesse conspirando contra ele. Seus gritos ecoaram pela caverna enquanto ele era arrastado para baixo, em meio à escuridão que o engolia vorazmente. A sensação de queda livre o deixou desorientado, incapaz de distinguir entre cima e baixo na escuridão opressiva que o envolvia. Rochas ásperas roçavam sua pele enquanto ele descia cada vez mais fundo na escuridão impenetrável da caverna.
O ar úmido e pesado o envolvia, sufocando seus gritos e tornando cada respiração um esforço árduo. A sensação de desamparo era avassaladora, como se ele estivesse sendo consumido pelas próprias trevas que o cercavam. Enquanto continuava sua queda descontrolada, o som ensurdecedor do seu coração batendo ecoava em seus ouvidos, uma sinfonia de medo e desespero que ameaçava consumi-lo por completo.
Na floresta, Ghottic caminhava tranquilamente, sentindo a úmida grama acariciar seus pés nús, a brisa fresca daquele céu azulado a convidava a se aproximar de seu destino.
— Bem… onde estão os lobetes que nasceram?
Ghottic subiu com determinação até o ponto mais alto do bosque, onde os raios de sol se filtravam através das folhas verdes, criando uma aura mágica ao redor das copas das árvores. Lá, sob o majestoso ipê de flores brancas, repousavam os dois lobetes, Dayo e Akin, em meio a um mar de pétalas perfumadas.
O perfume do ipê misturava-se ao ar fresco do entardecer, criando uma atmosfera serena e acolhedora. Os lobetes, com seus olhos gentis e atentos, observavam Ghottic se aproximar, sabendo que ele trazia consigo a sabedoria ancestral que os ajudaria no momento sagrado do nascimento de sua ninhada.
À medida que Ghottic se aproximava, os lobetes erguiam suas cabeças em saudação, reconhecendo a presença daquele que tinha o dom de fazer as flores desabrocharem e os campos florescerem. Era um momento de grande expectativa e reverência, pois o nascimento dos filhotes representava não apenas a continuidade da vida na floresta, mas também a renovação constante do ciclo da natureza.
— olá minha Alase
Ghottic sentiu-se honrada com a reverência do lobete Akin, reconhecendo a importância daquele momento para toda a comunidade da floresta. Com um sorriso suave nos lábios, ela retribuiu a saudação, mostrando respeito pela sabedoria e pela natureza dos lobetes.
Conforme os filhotes começavam a nascer, Ghottic envolveu Dayo com uma aura suave de energia mágica, canalizando as forças da natureza para acalmar e fortalecer a lobete durante o parto. Sua magia pulsava em harmonia com o ritmo da respiração de Dayo, criando um ambiente tranquilo e protetor ao seu redor.
Com um toque delicado, Ghottic guiou o fluxo de energia vital através do corpo de Dayo, aliviando qualquer desconforto e acelerando o processo de parto. Luzes cintilantes dançavam ao redor deles, refletindo a magia da vida que estava sendo trazida ao mundo naquele momento sagrado.
À medida que cada filhote nascia, Ghottic enviava uma bênção de boas-vindas, garantindo-lhes uma jornada segura e cheia de prosperidade na floresta. Sua magia fluía em sincronia com o ciclo da natureza, fortalecendo os laços entre os lobetes e o mundo ao seu redor. Ao final do parto, Dayo olhou para Ghottic com gratidão em seus olhos, reconhecendo o poder e a bondade que ela havia compartilhado com ela e sua ninhada.
— seria uma honra se a minha Alase desse o oruko¹ aos meus omodes²
Ghottic, com um sorriso sereno, concordou com o pedido da lobete. A atmosfera ao redor tornou-se impregnada de uma ternura palpável, enquanto os outros lobetes da alcateia, guiados pela aura tranquila de Ghottic, se aproximaram e formaram um círculo ao redor da garota.
Dayo, com olhos brilhantes, observava com admiração enquanto Ghottic nomeava cada filhote com palavras antigas carregadas de significado. Os lobetes, mesmo tão jovens, pareciam compreender a importância de seus nomes, balançando as caudas em aprovação enquanto eram apresentados à sua nova família.
— Deixe-me ver... — Ghottic começou, seu olhar refletindo a profundidade de sua intuição mística. — Esta animadinha se chamará Abayomi, uma promessa de alegria e vitalidade. Este fortezinho será Adeagbo, destinado a ser um líder valente e forte. Ah, e esta que está dormindo terá o nome Aiyetoro, uma paz serena que embalará a alcateia. Por fim, a que está mordendo a cauda da Abayomi será Ajagbe, uma futura caçadora astuta e ágil.
Os lobos, sintonizados com as palavras de Ghottic, uivaram em harmonia, expressando uma alegria ancestral pela chegada dos novos membros. Dayo e Akin, tocando seus focinhos, trocavam olhares cheios de felicidade e gratidão. As palavras proféticas de Ghottic traçaram o tecido do destino de cada filhote, e a alcateia se unia em celebração pela promessa de liderança e caça que se desenrolava diante deles.
Não demorou muito para os outros animais chegarem, com isso, a comemoração começou. Ghottic acendeu uma enorme fogueira cintilante como sol, os grilos começaram a tocar uma alegre sinfonia com os pássaros, a comida era abundante para os novos pais daquele lugar, haviam diversas frutas e ervas, os animais mais velhos se ofereceram para servir de futuro alimento para as crias, então, fizeram questão de se esbaldar naquela última festa das suas vidas. A bruxa, saltitava e rodava diante daquele fogo, a mesma já estava um pouco tonta, devido ao vinho de jabuticaba que a mesma havia feito antes da primavera começar. Ela usava uma coroa de flores na sua cabeça, assim como todas as fêmeas do local, os vaga-lumes lentamente começaram a ficar mais nítidos naquele céu alaranjado, iluminando ainda mais o topo daquele local, a alegria dominava o mundo de Ghottic.
O lobo Akin rodeou a fogueira, tentando falar com a bruxa, que dançava sem parar.
- minha Alase, faltam poucos pedaços de céu até a lua chegar ao seu ápice, por favor não beba tanto vinho, preciso que a lua abençoe os meus omodes.
A atmosfera ao redor do fogo era uma dança de sombras e luz, enquanto a garota, envolta em risos e movimentos desajeitados, dançava próximo às chamas crepitantes. O calor do fogo contrastava com a leve brisa da noite, criando uma sensação aconchegante no local. Às vezes, um gole desajeitado de sua bebida escapava, mergulhando no fogo e fazendo-o estalar e brilhar com efervescência devido ao álcool inflamável.
- minha Alase?
Akin, se sentiu um pouco frustrado ao perceber que Ghottic não prestou atenção nele, aproximando-se com uma expressão mesclada de preocupação e irritação, tentava instigar um pouco de sobriedade na garota. Seu olho, refletindo a luz dançante do fogo, buscava um entendimento entre o desejo de diversão e a necessidade de responsabilidade.
- aaah Akin, relaaxa, eu me controlo
A resposta da garota, sua voz arrastada e gargalhadas desordenadas, revelavam o efeito já perceptível da bebida. Sua coroa de flores, agora torta, adicionava um toque peculiar à sua imagem enquanto ela dançava despretensiosamente.
Com um rugido baixo, Akin dirigiu um olhar furioso para Aren, o tucano, cujas penas se eriçaram em resposta ao arrepio de medo. Os olhos do lobete faiscavam com uma intensidade que ecoava sua irritação, enquanto ele mantinha sua postura de protetor da alcateia diante da aparente negligência de Aren. O tucano, nervoso, bateu as asas rapidamente e voou em direção à garota, buscando refúgio em seus ombros como se buscasse proteção contra a fúria contida de Akin. Seu bico se abriu e fechou em uma série de estalidos ansiosos, enquanto ele buscava explicar-se diante do olhar acusador do lobete.
- a-aham, minha Alase, que tal você deitar um pouco no grande ipê junto com as outras fêmeas?
A sugestão de descansar sob o grande ipê, junto com as outras fêmeas, era uma tentativa de orientar a energia descontrolada da garota para um repouso merecido. Aren, sério em sua abordagem, empurrou-a delicadamente em direção à árvore, onde as fêmeas da região desfrutavam do banquete e cuidavam de seus filhotes recém-nascidos.
— ah, Aren! Eu bebi só só um pouquiiinho pouco assim ó
A resposta alegre e levemente alterada de Ghottic, acompanhada pela exibição de sua garrafa de cristal quase vazia, trouxe um sorriso indulgente ao rosto de Akin. No entanto, Aren, o tucano, olhou para ela com seriedade enquanto insistia para que ela se deitasse.
— deite-se, Ghottic. Ai ai, irei buscar um pouco de gengibre e mel para ver se você melhora.
A garota, agora deitada próxima à beira do penhasco, soluçava entre risadas. O tucano voou para longe em busca de remédios naturais. Ghottic, por sua vez, expressava sua frustração em relação à condição de ser uma Alase, jogando a sua garrafa de cristal com um misto de raiva e descontentamento. O líquido se perdeu na escuridão junto com a garrafa, enquanto a garota murmurava seu desgosto pelo fardo que carregava.
— aaah como eu odeio ser uma alase
A bruxa suspirou profundamente, sentindo o peso do mundo sobre seus ombros enquanto encarava um ponto fixo no meio do nada. Seu olhar perdido refletia uma mente inquieta, repleta de pensamentos que dançavam em torno dela como sombras fugazes.
O vento sussurrava entre as folhas das árvores, trazendo consigo fragmentos de memórias e desejos não realizados. Ela ansiava por um momento de paz, onde pudesse deixar para trás as preocupações e mergulhar em devaneios tranquilos, longe das pressões daquele mundo mágico.
Cada suspiro de alívio era uma tentativa de liberar a tensão que se acumulava em seus ombros. Ela fechou o olho por um instante, buscando encontrar a serenidade no vazio da mente, mas os pensamentos teimosos persistiam, como murmúrios indesejados que se recusavam a desaparecer.
No entanto, mesmo diante da tumultuada torrente de pensamentos, a bruxa permanecia firme em sua determinação de encontrar paz interior. Ela sabia que, com o tempo e a prática, seria capaz de domar a tempestade que rugia dentro de si e encontrar o equilíbrio tão almejado.
Enquanto isso, não muito distante dali, o garoto ruivo ainda despencava na imensidão daquela caverna.
— aaaaaahh...aí!
O grito rasgou o ar quando o rapaz se encontrou abruptamente de frente com a áspera grama do chão. Seus olhos, ainda arregalados pela surpresa, piscavam diante do inesperado mergulho. Ofegante, ele se sentou, a expressão de incredulidade transformada em um olhar atônito ao encarar a enorme parede de pedras que envolvia o buraco recém-formado pela sua queda. A entrada da caverna revelava uma paisagem em constante movimento, com a terra deslizando como uma vasta rampa natural, adicionando uma camada de imprevisibilidade à sua exploração inusitada.
- Eu caí por onze horas?! - A exclamação sobre a duração do tombo, era uma mistura de choque e exaltação. O humor não abandonava o rapaz, que, mesmo em meio à surpresa eminente – isso foi mais bizarro que o insano do praia parque, mas pelo menos foi de graça haha
No entanto, a euforia inicial cedeu espaço à realidade implacável. Ao sentir a ardência em várias partes de seu corpo, ele se conscientizou da sujeira e dos arranhões, resultado do encontro com a grama e os cristais de ametista. O suspiro que escapou dele denotava não apenas a aceitação do desconforto físico, mas também uma reflexão sobre as consequências de sua aventura inesperada.
Ao tentar se levantar, o gemido de dor indicou que não escapara ileso. O pulso machucado adicionava um toque de desafio à situação. A caverna, antes carregada de mistério, agora assumia uma atmosfera mais crua, onde os riscos da exploração eram evidentes. O ambiente ao seu redor, antes marcado pela magia da ametista, agora ganhava uma nova perspectiva, uma mistura de beleza e perigo que permeava a experiência do rapaz.
— aah ah okay... o meu pulso tá molinho e dormente, tá feio... tá bem feio, inchado e doendo muito, eu tô no meio do nada, todo cagado de terra, machucado e quebrado, meu Deus o que eu faço...okay não se desespere, tá tudo bem, tá tudo bem!
O rapaz, consciente da coloração arroxeada de seu pulso, que pulsava pela lesão, tomou uma decisão sábia ao evitar o olhar constante, reconhecendo que cada observação podia ser uma pontada extra de dor. Optando por desviar seu foco do desconforto físico, sua mente se tornou um campo de estratégias, procurando soluções para enfrentar a situação desafiadora em que se encontrava.
— ah que benção! O meu celular tá sem área! Okay Isaac, se acalma...você sabe muito bem que em parques florestais assim tem sempre um guarda-florestal, tudo bem, já assisti todas as temporadas de a sobrevivência de tudo e não sou burro para entrar numa cabana abandonada ou seguir algum som estranho.
O rapaz respirou fundo, sentindo o ar fresco e puro encher seus pulmões enquanto começava a caminhar em direção oposta à caverna. Seus passos ecoavam suavemente pelo chão irregular, ecoando pela vastidão silenciosa da floresta. Cada som da natureza ao seu redor era uma sinfonia serena, uma melodia que o acolhia em meio à solidão.
Ele se viu imerso na escuridão encantadora da floresta, onde a luz da lua mal conseguia penetrar entre as densas copas das árvores. Os galhos retorcidos e as folhas sussurrantes pareciam envolvê-lo em um abraço acolhedor, convidando-o a explorar os segredos ocultos da mata.
Enquanto avançava com determinação, seus sentidos estavam alerta, captando cada pequeno ruído que ecoava na floresta. Ele prestava atenção aos sons da vida selvagem, à suave correnteza de um riacho distante ou a qualquer sinal de presença humana nas proximidades.
— pelo que o moço do sobrevivência a tudo disse, um rio da a dois caminhos, ao mar e a uma cidade, em algum deles tenho que chegar.
O rapaz avançava pela mata, uma trilha sombreada que se aprofundava lentamente na escuridão crescente. Ansiedade palpitava em seu peito, cada passo era um eco de incerteza, suas pernas, apesar de tremulas, teimavam em resistir ao impulso de correr para longe. O ambiente, agora mergulhado em sombras, parecia fechar-se ao seu redor, aumentando a sensação de isolamento.
Seus sentidos estavam aguçados, cada som, cada ruído da floresta, era uma nota na sinfonia do desconhecido. O farfalhar das folhas, o sussurro do vento entre os galhos e até mesmo os mínimos estalos sob seus pés eram captados por seus ouvidos atentos. Seus olhos, vasculhando o ambiente em busca de qualquer movimento, estavam aflitos por antecipação.
Cada sombra, cada forma na penumbra, provocava um leve estremecimento em sua espinha. A escuridão, agora densa, parecia esconder segredos insondáveis, e o rapaz ansiava por uma sensação de segurança. Cada passo era uma jornada na busca por um refúgio, uma fuga do desconhecido que o envolvia.
CRECK! Foi o som que a garrafa de Ghottic fez ao cair a centímetros de distância do corpo do rapaz, que na hora gritou como uma gralha.
- aaaaaaaah!
O coração do rapaz batia descompassado, como um tambor selvagem ecoando na noite sombria da floresta. Seus pés batiam o chão com urgência, chutando folhas e galhos enquanto ele corria sem direção, guiado apenas pelo puro instinto de sobrevivência.
A escuridão ao seu redor parecia abraçá-lo suavemente, como um buraco negro abraçando a luz aos seus redor, cada som se transformando em um sussurro desconfortável em seus ouvidos já atentos. Seus olhos, brilhantes pela adrenalina, escaneavam o horizonte escuro em busca do perigo eminente.
Então, como uma cena de uma comédia irônica, uma jabuticabeira surgiu em sua trajetória, uma massa escura no meio da noite serena. O impacto foi como um abraço desajeitado, sacudindo seu corpo com uma risada surpresa e despretensiosa.
O rosto do rapaz contorceu-se em dor quando sentiu seu nariz fazendo contato com um galho mais baixo, uma batida tão forte quanto um trovão fez ele cair para trás. O calor do sangue começou a escorrer por suas narinas, preenchendo seus lábios com o gosto metálico do líquido.
Ele tentou se erguer, balançando a cabeça para afastar a tontura momentânea, suas pernas movendo-se desengonçadamente como se dançassem uma coreografia improvisada. Cada movimento era tão doloroso que apenas de respirar seus olhos lacrimejavam, cada respiração uma nota em uma sinfonia de seu desespero.
E então, em um último suspiro de dor, sua visão turva cedeu à escuridão, seu corpo desabando no chão macio e acolhedor da floresta. O silêncio da noite envolveu seu desmaio, fazendo a floresta ficar silenciosa novamente
Ainda deitada na grama, Ghottic ergueu sua cabeça ao ouvir barulhos altos vindos da floresta abaixo daquele penhasco
— ouviram isso?
Perguntou Dayo com as orelhas levantadas, Ghottic fez o mesmo e ergueu o suas orelhas pontudas.
— parece que uma gralha se machucou
Disse Zuri, uma morcego-beija-flor que estava pendurada no ipê, bebendo o néctar das flores com seus filhotes.
— vou dar uma olhada, se algum animal se machucou, ele é minha responsabilidade
Disse Ghottic, animada pois teria uma desculpa para sair de seus deveres naquela celebração
— mas Aren disse para a nossa Alase ficar aqui, ele já deve estar voltando com o seu chá.
Respondeu Dayo, com um olhar que possuía uma mistura de preocupação e desaprovação, Ghottic bufou, determinada a fazer o que ela queria naquele momento e levantou daquela grama úmida.
— eu vou voltar antes dele, prometo. Asé!
De pé, suas asas voltaram a se formar nas suas costas, Ghottic pulou daquele penhasco e começou a voar em direção ao som.
— espero não ter machucado nenhum animal com a garrafa.
Não demorou muito para ghottic chegar ao local, porém já estava um pouco mais escuro quando pousou, com isso, a sua visão foi prejudicada.
— Asé!
O colar de Ghottic, normalmente sereno, irradiou uma luz vívida que cortou a penumbra ao seu redor. A magia contida na joia começou a se entrelaçar com a carne delicada ao redor de seu olho, desencadeando uma metamorfose.
A luz emanada do colar banhou cada detalhe do rosto de Ghottic, criando uma atmosfera onde o ordinário se curvava à influência do sobrenatural. A carne ao redor de seu olho tornou-se o palco dessa transformação, cada contorno, cada sombra ganhando vida sob o toque mágico.
Os primeiros sinais da metamorfose revelaram-se, a textura da pele alterando-se sutilmente, como se as linhas da realidade estivessem sendo reescritas. A luz intensificou-se à medida que a forma do olho começou a se modificar. O globo ocular, antes humanoide, transformava-se em algo que transcendia a natureza convencional, assumindo as características marcantes de um olho de lobete.
Cada fase da metamorfose era uma fusão de delicadeza e poder, a magia moldando a anatomia de Ghottic de maneiras além da explicação científica. A íris do olho de lobete ganhava uma luminosidade única, como se capturasse a essência da noite em sua profundidade.
Ao final da transformação, o olho de lobete de Ghottic emanava uma luz suave, como um farol lunar que revelava os segredos ocultos na escuridão. O brilho do colar diminuiu, deixando para trás uma testemunha silenciosa da alquimia entre magia e carne, transformando a visão de Ghottic em algo além do humanoide, um presente extraordinário concedido pela metamorfose mágica.
— Enle-o³? Tem alguém aí?
A garota olhava por todos os lados, mas não via nada de diferente, até que percebeu que pisou em algo estranho.
— a minha garrafa...
Ao olhar para baixo viu que a garrafa de cristal estava estilhaçada e acidentalmente ela havia pisado nos cacos, mas nada como um pouco de ardência nos pés para lhe dar uma motivação extra a explorar o local do acidente.
— Enle-o?! Tem alguém aí?!
Disse a bruxa mais alto, enquanto andava lentamente pelo local.
— a-ai...minha cabeça...
Resmungou o rapaz botando a mão no rosto, lentamente ele levantou e ao ficar de joelhos no chão, o mesmo gelou ao ver um brilhante olho amarelado andando perto dele.
— merda...
Sussurrou o rapaz, congelando no mesmo momento, ele estava confuso e assustado, mal lembrava de onde estava, sentia fome, frio e não sabia se aquilo era um animal ou um monstro, ou pior, se aquilo era o ET Bilu prestes a lhe dar um pouco de conhecimento, pois se fosse, ele teria a certeza de que havia pirado de vez.
— Enle-o? Enikan wa⁴?
O rapaz ouviu uma voz feminina perto do mesmo, ele não entendeu o que ela dizia, mas seu primeiro instinto foi gritar.
- Ei! Socorro! Eu tô aqui!
A bruxa ouviu alguém gritar, mas não sabia o que o ser havia falado, assim, olhou em direção do som e gritou ao ver o que era.
— Kàn⁵ ko-dara⁶! (Um humano!)
O rapaz gelou ao ouvir a garota gritando algo que ele não entendia, era como se tudo que ela falasse se embolava em sua mente, logo, sentiu o seu corpo estremecer ao perceber que aquele olho amarelo brilhante vinha dela, Aquilo deu um gatilho no vale da estranheza em sua mente, ao mesmo tempo que aquilo era humano, ao mesmo tempo não era e por isso a sensação de perigo fez sua mente formigar.
— aaaaah! Por favor, não me mata!
Ghottic se assustou ao ver aquele menino gritando algo que se embolava na sua mente, aquele menino deu um gatilho no vale da estranheza da bruxa, pois ao mesmo tempo que ele parecia um celtiano, também não parecia, seu alerta de perigo aumentou quando o viu se debatendo-se no chão, como uma barata tentando fugir do veneno, num grito de nojo e medo, ela apontou a sua mão para ele.
— Asé, Asé, Asé!
Ghottic gritou desesperada, seu olho brilhando com uma intensidade sobrenatural enquanto sua mão se iluminava em um tom magenta. Uma energia pulsante irradiava dela, formando pequenas esferas de luz vermelha que se assemelhavam a estrelas em miniatura.
As bolas de energia voaram em direção ao rapaz com uma velocidade impressionante, cortando o ar com um zumbido elétrico. Isaac tentou desviar, mas era como se as próprias estrelas estivessem determinadas a alcançá-lo.O brilho intenso das esferas iluminava o ambiente ao redor, criando uma cena surreal de beleza e perigo. O rapaz podia sentir o calor irradiando delas, uma sensação que o fazia tremer de medo e fascínio ao mesmo tempo.
— aaaaah!
Sua perna e ombro foram queimados. As pequenas estrelas marcaram a pele do ruivo como tatuagens cósmicas, ele caiu no chão como uma presa indefesa. Com as mãos trêmulas Ghottic prendeu o rapaz dentro de um domo de energia, com suas mãos brilhando, um brilho magenta encobriu o rapaz como uma enorme estrela oca.
— Eca! Eca! Eca!
A menina dava pulinhos e estremecia, com nojo do que estava na sua frente. Não demorou muito para a mesma ouvir sons de passos e asas atrás da mesma.
— o que houve minha Alase? Que gritaria foi essa?
Perguntou Aren, logo pousando no ombro da garota, os outros machos da floresta estavam atrás dele, caso precisassem atacar algo. Ghottic não disse nada, apenas apontou para o rapaz, que se contorcia de dor dentro daquele domo.
- Oh pela deusa! Um ko-dara!
Exclamou o tucano com suas penas arrepiadas, logo, os lobetes, em estado de alerta, começaram a rosnar, se preparando para atacar o rapaz.
- Ghottic! Precisamos oun-pa⁷!
Disse Akin já espumando, a garota, assustada, deu alguns passos para trás. Ghottic, envolta por uma mistura intensa de medo e curiosidade, contemplou o rapaz aprisionado no domo de energia. Ele era a personificação do desconhecido, o primeiro humano que ela havia visto, um enigma que pulsava com uma essência que desafiava as fronteiras do que ela conhecia.
Seu coração, como um tambor frenético, ecoava os batimentos da incerteza. Cada pulsação era uma dança entre o receio do desconhecido e a fascinação pelo humano à sua frente. Sua cabeça, formigando com uma mistura de adrenalina e intriga, era um turbilhão de pensamentos enquanto tentava decifrar o que se desdobrava diante dela.
As pernas de Ghottic, traídas pelo tremor da ansiedade, pareciam hesitar entre o recuo e o avanço. Era um dilema interno, uma dança delicada entre a precaução e a atração pelo mistério. Cada passo em direção ao domo era um confronto com o medo, enquanto a curiosidade persistente a puxava para mais perto.
A dualidade emocional se refletia em seus olhos, que oscilavam entre a cautela e o fascínio, como estrelas que brilham em meio à escuridão. O encontro com o humano tornara-se uma experiência avassaladora para Ghottic, uma jornada emocional onde o desconhecido se entrelaçava com a inquietação de sua alma.
Assim, diante do humano aprisionado, Ghottic experimentava a complexidade de sentimentos que a ligava a esse enigma vivente. Medo e curiosidade, duas forças opostas, dançavam no palco de suas emoções, criando uma sinfonia única que ecoava no cerne de sua existência bruxa.
— beko⁸! Ele está ferido, eu machuquei ele! Eu...eu quero ajuda-lo!
Sons de protesto foram ouvidos atrás dela, Aren olhou para Akin e o mesmo mostrou as suas presas para o pássaro, para o mesmo seguir obediente.
- a-ahm...minha alase, ele é um humano, ele nos faz mal, deixe que os lobetes cuidam dele, você não precisa fazer nada.
A bruxa fechou o olho e cerrou os punhos, ela não queria fazer aquilo, mesmo que fosse sua obrigação. Com raiva e com o coração batendo fortemente e como uma cachoeira cheia, lágrimas escorreram de seu olho.
— beko! Você sempre diz que devo proteger qualquer vida! Cuidar deste bosque é meu dever! Ele é uma vida e está no bosque! Por favor, deixe-me salva-lo e amanhã de manhã o mandarei embora! Por favor Aren!
O tucano suspirou e com os olhos fechados deixou a menina aproximar-se mais do rapaz, que estava indefeso como um animal preso em um zoológico.
— amanhã, quero vê-lo longe daqui e apague-o, não quero que ele saiba o caminho de sua casa.
Disse o pássaro rispidamente, Ghottic, apesar da aura de medo que permeava o ar, sorriu com uma expressão mista de compaixão e intriga. A distância entre ela e o rapaz diminuiu a meros centímetros, criando uma proximidade que contrastava com o temor visível ainda estampado em seu rosto, que gotejava com gotas de suor.
- Obrigada, Aren. Asé!
Agradeceu Ghottic, invocando novamente a magia contida em seu colar. A luminosidade que emanava dele intensificou-se, destacando a presença mágica da bruxa em toda sua esplêndida complexidade.
Com gestos precisos e confiantes, Ghottic recolheu um punhado de terra, sua aparência agora tingida por um brilho verde enigmático. Diante do domo de energia, ela abriu um portal, uma fissura entre o real e o místico, e despejou a terra brilhante no interior. Uma metamorfose rápida ocorreu, a terra se transformou em uma atmosfera carregada, envolvendo o rapaz ruivo em seu abraço.
Em poucos segundos, o cheiro forte da terra mágica fez com que o rapaz sucumbisse, desmaiando diante da potência sensorial da magia. Ghottic, agora com um sorriso intrigante, observou o efeito da sua magia, uma mistura de curiosidade e determinação moldando sua expressão enquanto o mistério ao redor do rapaz se aprofundava.
- amanhã o espantarei, prometo.
Sua mão brilhou e ela ergueu o domo o envolvendo com sua áurea magenta, a bruxa começou a caminhar para ir embora, mas Akin protestou.
— e os meus omodes? Eles não vão ser abençoados pela lua?
Ghottic suspirou e olhou para trás.
— eles vão ser abençoados pela lua comigo fazendo o ritual ou não, não sou eu que mando na lua, se quiser tanto assim um ritual peça para o ancião da alcateia uivar para a lua.
A bruxa disse num tom bravo e cansado, enquanto olhava com desprezo ao animal, a mesma já estava cansada de tantas responsabilidades, ela parecia mais uma empregada do que uma líder, agora era hora de fazer algo que ela queria. Com essa decisão, a mesma foi caminhando em direção ao seu salgueiro.
Akin, com uma seriedade cortante, se aproximou de Aren, seu olhar fixo no tucano como se pudesse discernir a verdade nos olhos da criatura alada.
- Como esse selvagem descobriu o caminho?
Indagou Akin, sua voz carregada de desconfiança e urgência.
- Eu não sei! Nenhum humano atravessou a caverna desde...desde aquele dia
Respondeu Aren, seu tom carregado de nervosismo, um nó na garganta denunciando a inquietação que o envolvia.
Akin, o líder da alcateia, mantinha seu rosto sério, como se cada palavra fosse um teste de lealdade.
- Certifique-se de que Ghottic não descubra a caverna. Se ela souber a verdade sobre a floresta, nossa segurança estará em risco.
O tucano engoliu em seco, sentindo o peso da responsabilidade em suas penas suadas.
- Ah, mas... não deve ser tão ruim assim se ela sair da floresta. Pode ser que tenha alguns celtianos pelo mundo afora e...
Akin não permitiu que Aren concluísse. Em um salto, o lobete investiu contra o tucano, sua expressão feroz e a baba raivosa pingando em suas penas.
- Ghottic nunca vai sair daqui! Alika fez a gente prometer isso! Se você não quer que nossa espécie seja destruída e que a magia morra, você vai trancá-la aqui, por bem ou por mal!
Após pisar nas asas do tucano, Akin se afastou, deixando Aren voar desorientado pelo céu escuro. Outros lobetes se aproximaram, observando a cena com uma tensão palpável no ar.
- O que faremos se ela sair da floresta junto com o humano?
Questionou outro lobete, sua voz rispidamente cortante.
Akin respondeu com frieza, seu olhar refletindo a dureza de uma decisão inevitável.
- Mate-os.
A tensão na alcateia atingiu um ápice, as palavras ecoando como trovões na escuridão da floresta. O dilema entre proteger o segredo mágico e enfrentar as consequências de uma revelação iminente pairava como uma sombra sobre todos, enquanto Akin, o líder, delineava as linhas de uma escolha cujas ramificações seriam profundas e irrevogáveis.
...•Dicionário celtiano•
...
...Oruko: nome
...
...Omode: filho, criança
...
...Enle-o: olá, oi
...
...Enikan wa: há alguem?
...
...Kàn: um
...
...Ko-dara: ruim
...
...Oun pá: mate-o
...
...Beko: não
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Atualizado até capítulo 30
Comments
Luna006
o iwa é muito engraçado kakakaakakakakak
2023-09-19
1
Ana pontel
AHHHH MN essa história fica cada vez melhor!!! como é possível?? kkksks tô adorando o rumo pra onde essa história tá indo, tem mtos segredos e mistérios pra serem descobertos, o q sinceramente, só me dá mais vontade de ler ✨
2023-07-18
2
Safira Cahon
gostei
2023-06-20
2