A Professora Da Minha Filha
Seis anos antes
— Mas eu não quero ir embora, mãe...— resmunguei chorosa.
— Eu sei, querida, mas precisamos.— Minha mãe insistiu, seus olhos escondiam uma dor e desespero, mas ela tentava aliviar com um sorriso fraco.
— Ao menos devia me dizer o porquê, desta saída repentina! Não posso nem contar para ninguém...?
Ela me deve uma explicação, quem muda de estado de um dia para outro sem um motivo convincente?
— Não tenho tempo para explicar agora, filha, mas me promete que vai fingir ser um dia normal na escola?
Apenas a encarei, ela segurava meus ombros apavorada por uma resposta.
— Rebeca, eu sempre cuidei de você, confia em mim quando digo que devemos fugir daqui... é para sua segurança.— Ela estava muito aflita.
— Minha segurança?! Vou deixar todos meus amigos, namorado... por minha segurança? Somos ricos e eu não fiquei sabendo? — falei com indignação.
— Por favor, Beca, me prometa que não vai contar para ninguém e quando estivermos longe daqui, eu vou esclarecer tudo para você. Agora vá para escola, ainda tenho umas coisas pra resolver. Já terminou de arrumar suas malas?
Suspirei decepcionada, mas confiava na minha mãe, no fundo ela estava certa, sempre cuidou muito bem de mim.
— Já terminei a mala...
— Colocou apenas o necessário, né?
— Sim...
...****************...
Ruth (mãe da Rebeca)
Com o coração apertado, juntei tudo o que podia carregar, o restante tinha que abandonar sem pensar nos apegos sentimentais. O que importava era a segurança da Rebeca. Olhei os móveis velhos, mas que muito me serviram, a casa antiga foi nosso abrigo desde que Rebeca nsceu. Suspirei pesadamente e deixei uma lágrima cair, é difícil dar adeus a tudo o que tem.
Ainda emocionada com o momento, ouvi batidas fortes na porta, e automaticamente meu coração paralisou no peito, para depois bater freneticamente. A entrada que não havia permitido, mas não podia evitar, o homem que eu mais temia e que um dia me enganou, quebrando meu coração, agora estava diante de mim, com seu olhar ferino.
— R-rodrigo...? — gaguejei olhando o pai da minha filha entrar brutalmente em casa, junto dos seus capangas.
— Vai sair de férias, meu amorzinho?— Rodrigo perguntou olhando as malas arrumadas.
Meu desespero devia estar estampado em meu rosto, ele havia dito que só viria amanhã. Ele estava prestes a acabar com todo meu plano.
— Estava planejando fugir de mim, amor? E levar a nossa filha, logo agora que estou disposto a conhecê-la e dar tudo para ela? —
Rodrigo falou calmo, mas sua expressão era de puro ódio.
Fechei os olhos aterrorizada, respirei fundo buscando o ar. Precisava de um plano de emergência.
— Você nunca quis saber da minha filha, a criei sozinha, agora vem com esse "papinho" de querer conhecê-la? Tem segundas intenções nisso, não sou idiota, Rodrigo!
Ele sorri diabolicamente. — Eu sou um homem de negócios, Ruth. Confesso que criou uma filha linda, quando descobri que era virgem, vi a oportunidade perfeita de dá-la em um casamento de negócios. Ela vai me dar muitos territórios, expandir minha mercadoria e me render alguns milhões!
— JAMAIS! A essa hora ela já está longe! — Arrisquei uma mentira.
— Eu tenho maneiras de fazê-la falar, querida! — Ele me ameaçou.
— Pode fazer o que quiser comigo, eu nunca entregaria a Rebeca para você! — falei convicta.
Ele deu sinal para os capangas andarem pela casa, e logo um deles retorna com a passagem de ônibus que comprei. Meu coração chegou a gelar no peito.
— Florianópolis? É muito longe do seu lugar de origem, doçura. — Rodrigo diz irônico, enquanto rasga a passagem.
Sorte que não acharam a passagem da Rebeca, ela devia ter pegado e colocado na mala.
— Procurem a Rebeca! Revirem a cidade se for preciso! — Rodrigo ordenou aos capangas.
— Nunca vai achá-la! Já está longe uma hora dessas!
Ele se aproximou de mim, passou os dedos no meu rosto e me deu um beijo. Cuspi nele enojada.
— Ousada, linda e gostosa. Exatamente como há dezessete anos! Uma pena que me desafiou, não me serve mais e preciso manter minha posição durona, como um dos principais chefes do tráfico de drogas aqui do Rio de Janeiro. Não é pessoal Ruth, eu sinto muito.
Rodrigo não tinha nenhum sentimento enquanto falava. Ele simplesmente sacou seu revólver com aqueles olhos frios e apontou para mim. Podia ver o meu fim nos olhos dele, minha vida acabou ali. Sem hesitar ele deu dois tiros na minha barriga e eu nem senti nada, foi como se tivesse sentindo uma socos no estômago.
— Esta é a minha marca, vai sofrer um pouco antes de morrer. Pena que foi tudo em vão! Sabe que vou encontrar a Rebeca, Florianópolis não é tão grande quanto o Rio de Janeiro.
Ele se virou e saiu com seus capangas, me deixando jogada no chão. Com toda adrenalina ainda não estava sentindo a minha realidade, mas alguns minutos mais tarde uma dor aguda dominou meu abdômen e corpo inteiro. Levei as mãos aos buracos e pressionei, como se fosse possível estancar o sangue que jorrava.
Rastejei até o celular, precisava falar com a Rebeca. Gravei um áudio para ela, não sabia como estaria até voltar para casa.
A dor dos tiros não era maior do que a dor de deixar a minha filha sozinha neste mundo, exatamente como eu fui deixada. Só podia pedir a Deus que a protegesse do pai, e que ela conseguisse fugir para sempre.
...****************...
Rebeca
Estava muito triste e confusa, mas segui as instruções da minha mãe e agi naturalmente na escola. Foi estranho pensar que nunca mais veria meus amigos, me namorado...
Enquanto caminhava para casa, recebi um áudio da minha mãe, então fui ouvir.
"Filha... me perdoe por não falar sobre seu pai... ele é um traficante de drogas perigoso, e nunca se importou com você, tudo que eu quis foi te poupar da dor da rejeição. Agora ele está atrás de você, e não posso deixar que ele te pegue. Eu te imploro, Beca, vai embora daqui, e não olhe para trás! Você tem a oportunidade de ter uma nova identidade. Vai precisar usá-la para não ser encontrada pelo seu pai. Ele quer casar você com outro traficante, para rendimento dos negócios dele... coff...coff... me prometa que quando chegar em casa só vai pegar as suas coisas e ir embora! Não espere polícia, ambulância, nada! Só vá! coff...coff...Filha eu te amo, vai precisar ser forte agora... não desista dos seus sonhos... coff..."
Bastou ouvir as primeiras palavras para sair correndo feito um raio, a voz da minha mãe estava muito estranha, o que era aquela tosse? Com o coração apertado no peito eu corri com toda velocidade que meu corpo permitia. O que será que aconteceu? Pai traficante?
Cheguei em casa ofegante, fui entrando e observando como tudo estava revirado, cadeira de um lado, gavetas abertas e roupas jogadas. Num canto caída, estava a minha mãe sangrando. Corri até ela completamente desesperada.
— Mãe!? Meu Deus! Mãe!? — gritei a sacudindo e chorando.
Ela abriu os olhos bem devagar e tossiu sangue.
— Mãe... O que aconteceu? — Estava chorando amargamente, meu instinto foi abraçá-la.
Precisava fazer alguma coisa, peguei o celular e liguei para emergência. Com muito custo me entenderam e disseram que iam enviar uma ambulância.
— Filha vá embora, eu imploro! Coff...coff... — Ela parecia estar usando os últimos suspiros.
— Eu não posso deixá-la, mãe!
— Você pode, querida! Você ainda tem uma vida pela frente, não deixa seu pai estragar isso. Eu lutei para que tivesse uma vida melhor que a minha... vá... pegue a minha bolsa e uma mala sua e vá... tem tudo o que precisa para recomeçar a sua vida... coff...coff...
— Não mãe... eu não quero! Eu não posso!
— Filha, por favor... coff... realiza um último desejo para sua mãe... eu quero partir desse mundo crendo que fiz tudo o que estava ao meu alcance, quero saber que será livre! Vá embora... coff... A ambulância vai chegar... seu pai chama Rodrigo Torres, lembre desse nome para se afastar dele...coff...eu te amo filha... vá...
— Eu te amo mãe, eu vou embora, só porque eu te amo...
Beijei minha mãe e logo em seguida ela deu um último suspiro.
Sem poder lamentar a sua morte precoce, minha mãe tinha apenas trinta e cinco anos, me levantei tentando desligar meus sentimentos. Ao longe as sirenes tocavam, sem perder tempo, peguei a bolsa da minha mãe, uma das minhas malas e saí de casa antes da ambulância chegar.
Observei tudo de longe, escondida num beco, mas quando a polícia chegou tive medo e fui embora em direção ao ponto de ônibus mais longe que pude ir.
Abri a bolsa e dentro de um envelope havia um novo RG com minha foto, porém com o nome Ângela Novaes, ao invés de Rebeca Camargo. A data de nascimento que constava, me deixava seis meses mais velha, me tornando uma garota de dezoito anos. Tinha um histórico escolar, um cartão de banco com o nome da minha nova identidade, e um papel com uma senha.
Não achei as passagens, onde foram parar? Para onde eu vou agora? Como vou me virar sem minha mãe? Sem direção e completamente só, minha única esperança era a fé que minha mãe tinha em mim, então me confortei com suas palavras e dei tudo de mim para seguir em frente.
...****************...
Dias atuais
Olhei o reflexo da mulher no espelho, tentei encontrar algum resquício da Rebeca Camargo, os cabelos originalmente loiros, agora estão castanhos. Do meu verdadeiro eu, só restou os olhos verdes, porque nem mesmo a garota que costumava ser, está presente aqui dentro. Embora tenha vencido as dificuldades que a vida me deu, sou uma mulher solitária e deprimida, que tem por companhia os livros, meus desenhos e um gato, o Bob. Por sorte, tenho uma única amiga, a Nataly, que sem preconceitos, entrou na minha vida e me deu amizade maravilhosa, a conheci na faculdade de Pedagogia. O pai dela é dono da melhor escola particular de São Paulo. Por insistência dela, o seu pai me ofereceu um emprego, como professora suplente e ajudante do primeiro ano. Estou há cinco meses nesse novo emprego, finalmente um trabalho que envolve o meu currículo pedagógico. Trabalhando na escola, minha vida deixou de ser tão deprimente, estou amando o contato com as crianças.
Vinte três anos, pela "lei" vinte quatro, essa mulher que encarei no espelho, a Ângela, só trabalhou, estudou e hoje, mesmo tendo terminado a faculdade, continuou trabalhando e estudando. Pelo menos, tenho tido mais tempo para desenhar, um dos meus hobbies favoritos, além de ler.
Meu pai nunca me encontrou, mas vivo com um medo aterrorizante dele, não consigo me relacionar com ninguém, sempre acho que é um espião do Rodrigo, sair é uma tortura, sempre acho que alguém me persegue.
Suspirei e falei comigo mesmo, apontando o dedo no espelho. — Você tem que viver, Ângela! Quando vai sair das sombras? Já faz seis anos, seu pai não está mais te procurando!
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 100
Comments
🎀 𝒜𝒾𝓇𝓎𝓂
isso sempre acontece
2024-10-11
0
Tayrone Tayrone_oliveira
oi/Tongue/
2024-09-20
0
Aurisia Ivo da Silva
começando a ler 👀👏
2024-09-12
0