A chuva caía impetuosa sobre uma região distante da cidade mais próximo, Manauba, cidade vizinha de Angenopolis. Ali havia somente uma pequena cabana rodeada de frondosas e verdejantes árvores, e à frente da moradia, uma varanda, onde dormia um menino, deitado diante da porta de entrada, sob o frio daquele amanhecer sem sol, pois as nuvens carregadas não cessavam as agressivas lágrimas caindo do céu, ora em vertical, ora em diagonal quando o vento, vez que outra, soprava o ar gélido contra o rosto do menino, que, não tardando a sentir a ponta do nariz congelar, despertou dando um abrupto espirro.
— Atchim!
Ele roçou o nariz e um novo espirro se sucedeu antes que pudesse perceber que se encontrava num lugar desconhecido, sem a ciência de como havia chegado ali, pois se lembrava somente de ter ido dormir no próprio quarto após ordenarem os pais quando o jogo de cartas que estavam jogando sobre a pequena mesa da sala de estar havia chegado ao fim da última partida.
"Agora vá dormir, Miguel, outro dia você terá a oportunidade de ganhar também", rememorou o menino a fala do pai e o riso dele, tal como o carinho da mãe, que o acompanhou até o quarto. “Durma bem, meu filho. A mamãe te ama.”
O menino levantou-se do chão e andou de um lado a outro da varanda, tentando avistar alguém mais além de si mesmo. Mas nem sequer havia um inseto avista devido ao tempo chuvoso e gélido.
Diante disso, ele começou a chamar pelos pais. Assustado, bateu na porta, chamando ainda mais alto:
— Pai! Mãe!
Continuou a chamá-los, à medida que lágrimas começavam a escorrer por seu rosto de adolescente, pois havia recentemente completado doze anos e, com a força que lhe dispunha nos músculos em desenvolvimento, bateu ainda mais forte na coitada da porta, que, assustando-o ainda mais, foi aberta por um velho de olhos estreitos e enrugados, barba comprida e grisalha, testa franzida e chapéu de palha sobre a cabeça de cabelos longos e brancos como a neve.
O velho trajava calças de cintura alta, camisa social de mangas longas e sandálias de couro e, sobretudo, portava consigo um cachimbo sob os lábios úmidos.
— Menino, não aprendeu a ter bons modos? — questionou o velho, repreendendo-o. — Não se pode bater assim na porta dos outros.
— Quem é o senhor? — perguntou Miguel, que não se lembrava de já tê-lo visto na vida.
Na verdade, era a primeira vez que ele estava vendo o velho da cabana que ouvia ser narrada pelos pais em histórias fantásticas de um homem que combatia o mal que ninguém mais podia ver devido à cegueira provocada pelos maus desejos e pensamentos.
— Menino, primeiro se diz “bom dia!”, depois se fala ou pergunta o que deseja saber — retrucou o velho. — Espero que não esqueça disso da próxima vez.
O velho se aproximou da beira da varanda e pôs uma mão à frente do corpo, sentindo as gotas de chuva atingi-la, ao passo que permanecia tragando o ópio do cachimbo e, o menino, confuso, o observava com certo receio de falar algo a mais depois do que ouviu.
— Aproxime-se — pediu o velho.
Miguel atendeu ao pedido, mas com uma certa lentidão, como se fosse tímido, mas não havia timidez nele senão uma gama de pensamentos e desejos eufóricos de ver os pais.
— Repita o que estou fazendo. Toque-a também — orientou o velho.
Vagarosamente, Miguel estendeu uma mão diante do corpo, pondo-a em contato com as gotas de chuva e com as gotas que caíam da biqueira das velhas e escuras telhas do telhado.
— Perceba como são magníficas as gotas de chuva — disse o velho, ora fitando Miguel, ora fitando a própria mão, na qual escorria as gotas da chuva. — Elas não param diante de um obstáculo em seu destino, neste caso o solo deste lugar, pois, em vez disso, contornam esse obstáculo com maestria e, assim, alcançam ou continuam a seguir.
No rosto de Miguel a incompreensão era nítida. Parecia que o velho havia falado diversas coisas num outro idioma. Contudo, não era nada disso que o menino desejava ouvir, pois, antes de ele baixar o braço e sair correndo, o velho explicou:
— Você deve ser como uma gota de chuva submetida a um obstáculo.
Miguel, por sua vez, adentrou a chuva, pisando seus sapatos sobre as poças d'água formadas no solo relvado. Distanciando-se do velho, que não o chamou, nem sequer correu atrás dele. Em vez disso, retirou o cachimbo da boca, cuspiu no solo molhado pela chuva e então retornou ao interior da cabana, fechando a porta que não desejava que tivesse sido aberta.
Enquanto isso, corria Miguel entre as árvores, saltando sobre as raízes, arriscando escorregar e cair no solo molhado. Contudo, não desistiu de alcançar a saída daquela floresta, almejando chegar a casa dos pais, localizada a muitos quilômetros dali.
Ele só parou de correr quando chegou à beira de um rio agitado, que cortava o seu caminho. No interior das águas correntes haviam rochas enormes que de certa forma ligavam as margens do rio.
Sem pensar muito, Miguel tomou a escolha de saltar sobre elas, pulando de uma para a outra, visando chegar ao outro lado do rio.
Ele, então, pulou sobre mais uma das rochas e, balançando o corpo em busca de equilíbrio, quase caiu na correnteza do rio.
Por muito pouco, conseguiu manter o equilíbrio e, restando só mais duas rochas, preparou-se para saltar e saltou no mesmo instante que as águas cobriram a pedra, fazendo Miguel perder a confiança e o equilíbrio ao ponto de cair nas águas e ser levado rio abaixo.
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Atualizado até capítulo 102
Comments
Alexandra Moreira da Silva
estranho esse capítulo
2022-09-16
3
Rosmari Furlanetto
hummmm
2022-09-06
1
.nizete
voltando a leitura
2022-07-23
1