Deitado num leito do hospital, Miguel retomou a consciência, mas manteve seus olhos fechados, pois queria ouvir e entender as falas que soavam próximo de si.
Eram falas do diálogo entre o médico e Eloísa, que já se encontrava ali há quase uma hora. Ela estava decidida a pagar os procedimentos cirúrgicos que Miguel sentindo as dores pulsando de baixa para alta intensidade e vice-versa precisava realizar o quanto antes, pois as agressões sofridas lhe causaram sérios danos ao corpo, principalmente a duas costelas do lado esquerdo quebradas pelos constantes chutes daqueles homens malvados.
— Em alguns minutos vamos levá-lo à sala de cirurgias — disse o médico a Eloísa. — Aliás, o que você é mesmo dele?
— Noiva — respondeu, de imediato, desviando o olhar para o lado.
— Imagino então que a senhorita esteja muito preocupada com o seu noivo — pôs ele a mão desocupada sobre o ombro dela. — O seu noivo vai ficar bem — assegurou, antes de sair do quarto.
Eloísa encostou-se no leito e, focada na porta fechada pelo médico após a saída, não notou quando Miguel abriu os olhos e passou a admirar o corpo dela visto por trás: seus longos cabelos castanhos desciam até a cintura e sua bondade podia ser sentida exalando de seu corpo angular.
Miguel pôs sua mão sobre a dela, sobreposta no colchão do leito, causando-lhe uma reação de espanto.
Eloísa virou o rosto no susto, mas ao perceber que não era nenhum perigo, acalmou-se, indagando-o:
— Como se sente, Miguel?
Ele, de imediato, ficou todo surpreso por ela saber o seu nome e, mesmo sem dizer uma palavra sequer, Eloísa percebeu o que Miguel desejava saber.
— Você pode não se lembrar de mim — disse Eloísa —, mas nós estamos matriculados na mesma universidade, inclusive pagamos uma disciplina na mesma turma no ano passado.
Miguel permanecia a olhando em silêncio, à medida que ela prosseguia a própria fala. A mão dele continuava sobre a dela.
— Sei que você não fala e — retirou ela a mão de debaixo e pôs sobre a dele —, talvez seja isso o porquê estou aqui — acrescentou, elevando a mão e, após beijá-la, fez o inusitado pedido: — Miguel, case-se comigo?
A noite que se encontrava sem luar devido às densas nuvens carregadas que fechavam o céu noturno tornou-se chuvosa naquele instante. As gotas de chuva começaram a chocar-se contra a janela de vidro daquele quarto, desejando ocupar o melhor lugar para ouvir a resposta de Miguel, que nada disse, mas virou o rosto de lado, expressando, mesmo sem a intenção, um aparente não.
As gotas de chuva deslizaram-se então pela janela, decepcionadas com a resposta. Eloísa largou a mão dele no ar, que por ação da gravidade acabou retornando ao fino colchão do leito.
Antes que o médico retornasse ao quarto acompanhado por um casal de enfermeiros, Eloísa sentou-se na poltrona ao lado do leito dele e, cruzando as pernas, ressaltou:
— Não pense que não sei que você é pobre e que quase não tem dinheiro para se manter na universidade LC e fora dela. Como sei disso? Não vem ao caso no momento, mas se não aceitar o meu pedido de ser o meu amado e servo, terei de cancelar os seus tratamentos médicos particulares e deixá-lo à mercê do demorado atendimento público. Então, o que vai ser?
Mais tarde, Eloísa retornou a recepção do hospital, onde encontrou a melhor amiga, preocupada, que se levantou da cadeira acolchoada, assim que a viu. Eloísa a deixou a par da conversa que teve com o até então mudo Miguel.
— O que vai fazer? — quis Tânia, muito curiosa, saber.
— Vou levá-lo para a minha casa, já que os meus pais querem tanto que eu me case, então que seja com ele — referiu-se a Miguel.
— Depois tu dizes que a louca sou eu, não é?
Eloísa havia se perdido nas lembranças daquele dia, ao passo que o percurso até a empresa Beleza dos Anjos chegou ao fim. Por isso, ela achou a viagem mais breve do que esperava.
Miguel parou o carro quase em frente ao enorme prédio, onde ela já trabalhava há quase seis meses.
— A que horas quer que eu venha te buscar, Eloísa?
“Por que ele só me chama pelo meu nome?” indagou-se em pensamentos, desejando externar o incômodo. “Achei que eu também tivesse deixado claro no acordo de que se ele pudesse falar deveria me chamar carinhosamente…”
— Eloísa? — tocou Miguel o ombro dela, despertando-a para a realidade. — Eloísa? — repetiu, deixando-a irritada.
— Venha no horário de sempre — respondeu ela, rispidamente, afastando a mão dele de seu próprio ombro.
E então, saiu do carro e seguiu rumo a entrada da empresa sem dizer mais nada. Não era mesmo preciso, pois Miguel já estava falando o suficiente pelos dois.
— Tenha um bom dia de trabalho, Eloísa! — gritou ele, deixando-a ainda mais irritada, pois ao redor já havia muitos olhares que se atraíram pelo som da voz dele.
Só após entrar na empresa, Eloísa livrou-se dos aborrecimentos e do constrangimento e, mesmo negando os repentinos pensamentos, sabia que por várias vezes fez o marido passar por diversas situações similares, nas quais o aborrecia e o constrangia com seus próprios caprichos.
“Ele não está tentando devolver o que eu já fiz com ele… ou está?”, questionou-se a caminho do laboratório.
Enquanto isso, Miguel pôs o carro em movimento em regresso a casa da família Sousa. No meio do caminho, sentiu o relógio de pulso vibrar, notificando uma mensagem recebida no dispositivo celular.
Ele parou o carro e conferiu o que havia recebido. Era uma mensagem de texto de Laura Anjos, a prima ruiva do prefeito local.
“Venha a minha casa”, dizia ela na mensagem. “Já tenho em mãos o que me pediu.”
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Atualizado até capítulo 102
Comments
Rosmari Furlanetto
meeee
2022-09-06
3
Miriam Doroty Medeiros
quantos capítulos são?
2022-07-13
1