Voltando a rotina

Sai após um bom tempo, para almoçar na casa de Sabrina. Fiquei de pegar meus filhos e resolvi aceitar o convite delas para passar um tempo como se ainda fossemos uma família. Eu não tinha nada com Sabrina, apesar de ter que lidar com ela por causa de Gil, mas essas diferenças ficaram no passado doloroso para todos nós.

- Como ela desenvolveu, Túlio. Ontem ela estava segura e bem com todos na festa. E Ben já é um pequeno menino, não nos deram trabalho, só na hora de tomar banho.

- Eles estão nessa fase, brincam, se divertem, se sujam e não querem gastar seus preciosos tempos tomando banho.

- Fico feliz por eles estarem bem.

- Não deveria ser diferente disso. Vivo para eles. São crianças cuidadas, Estela ainda vai no psicólogo e fonoaudióloga. Benjamin agora que resolver me fazer perguntas.

- Ele perguntou para mim também.— disse Jaqueline.

- A mãe deles sempre será uma questão para eles. E você Túlio, não se vê casado um dia, com uma mulher, suponho?

- Ainda é muito cedo para isso Sabrina. Eu não estou preparado ainda.

- Entendo.

Não quis continuar aquele assunto, que pararia em muitos lugares até chegar no fato de ter traído a filha dela quando ela mais precisava de mim. Assim por volta das três da tarde, sai da casa de Sabrina e segui para a orla de Copacabana e dei um pulo no shopping também e no mercado para abastecer as lancheiras de ambos durante a semana.

Assim que cheguei em casa, vejo Vick novamente, estava sério segurando uma mochila e quando o carro de um dos amigos de Fabi saiu, acho que Beth tinha dito que era Breno o nome dele e seria sim o namorado de Vinícius.

- Boa noite, vizinho! — Ele disse sem muita conversa e logo se virou para sua porta enquanto eu tirava Ben da cadeirinha.

- Não vai falar comigo?

Estela se mete no meio da rua puxando assunto com ele.

Vick se vira deixando sua mochila encostada na porta e vem com o sorriso que estava sentindo falta tanto quanto Estela e se ajoelha a abraçando em seguida — nem eu sabia que Estela era tão apegada a Vick daquela maneira, mas ele cantava e isso era uma coisa que ela sempre gostou. Quando vi, até Benjamin foi abraça-lo e quando cheguei mais perto, ele se retratou comigo.

- Desculpa, estou pregado. Arraial do Cabo pode ser lindo, mas estava nublado e tivemos um dia cheio. Terei que voltar um dia no verão.

- É verdade. A sua perna melhorou?

- Sim. Eu tomei um anti-inflamatório, estou bem.

- A gente podia comer pizza agora a noite. — Disse Estela sorrindo e feliz por vê-lo.

- Estou cansado Estela. Vamos marcar outro dia?

- Está bem.

Senti que Vick não queria ficar sozinho e chamei meus filhos que queria ficar puxando assunto para dentro.

- Tem certeza que não quer pedaço de pizza? — Insisti numa reação espontânea da minha parte. Como se não tivesse pensado.

Vick me olhou sem graça e respirou fundo. Me senti um intrometido naquele momento, mas ele rodopiou brincando com meus filhos e disse:

- Só se esse lanche for muito rápido! — Vinícius tinha uma olhar fumante quando queria e eles tornava irresistível quando jogava seu cabelo que insistia em cair em seu rosto para trás.

Eu tremi involuntariamente naquele momento perdendo o alcance de Ben que correu para fugir de sua irmã.

- Onde vai, não pode sair para rua assim, pode vim carro! — disse Vick o segurando.

- Vamos entrar crianças está frio aqui. Você vem?

- Eu não sei, estou pregado mesmo.

- Vamos Vick, eu quero te apresentar minha porquinha. Você vai gostar dela, é de pelúcia. — Mas uma vez Estela insistia.

-  Farei o seguinte: vou guardar minha mochila lá dentro e depois eu venho, pode ser?

- Vai vim mesmo né?

- Sim. Eu prometo. Eu tenho refrigerante em casa e então eu levo e posso improvisar alguma coisa...

- Vick, ainda tenho pizza congelada e outras coisas já prontas que não damos conta de comer. Sua companhia já é suficiente.

- Legal. Eu vou lá, e volto, certo!

- Eu irei te aguardar, ou melhor, nós.

Não queria ser inconveniente, mas meu coração passou a bater descompensado e estava sem entender meus sentimentos naquele momento. Ele se virou e entrou e eu fiz o mesmo com os meus filhos e criei uma expectativa tão grande com sua aguardada visita que deixei uma das pizzas cair no chão, sem chance de reaproveitamento.

- Papai, olha o que você fez.

- Puxa! — disse Bem, vendo q ume era a sua favorita que tinha sido destruída.

- Papai fará o seguinte. Vamos fritar pastel e temos bolinha de queijo também. Papai fará rápido!

A campainha tocou e eu voltei a ficar desconcertado e esperançoso de tal maneira que demorei a sair daquela cozinha e lidar com Vick sem demonstrar minhas reações mais profundas diante dele. Respirei fundo e segui meus filhos que não me esperaram.

- Oi, oi crianças. Eu trouxe isso para vocês. Comprei na estrada. Eles podem comer isso?

- Sim. Entra! Aconteceu um acidente na cozinha e vamos improvisar alguma coisa. Entre!

Tentei ser o mais natural possível e ele tinha dado um pote de doce de leite com coco e ameixa para eles e tive que guardar até conseguir limpar a cozinha e fazer outra coisa.

- Entendi.

Vick, sem formalidade, me ajudou a limpar o chão e decidiu fazer os pastéis com os recheios que Cláudia deixava nos potinhos, sabendo que vira e mexe eles gostavam.

- Ainda bem que comprei esses salgados no mercado agora. Não sou de dar fritura para eles durante a semana, mas como ninguém é de ferro, de vez em quando, deixo eles comerem o que gostam.

- Mas é assim mesmo, tem que controlar. Eu posso pegar essa panela?

- Essa aqui é para fritar.

Tirei do forno um óleo que tinha usado no dia anterior.

- Ok. Mas acho que é muita coisa para nós quarto. Outra pessoa virá?

- Não que eu esteja esperando.

- Hei, crianças, vão querer que sabor dos pastéis?

- Queijo.

- E sempre esse, mas temos carne moída, frango desfiado com essa misturinha de frios aqui.

- Bem, vamos fazer o seguinte. Fritarei dois para cada de queijo e você vai querer o quê, Túlio?

- O meu de carne moída.

- Eu também . E bolinha de queijo. A pizza pode ficar para outro dia. É muita coisa, vai por mim!

No final, Vick, assumiu o controle do meu fogão e fritou tudo numa maestria que fiquei impressionado com sua higiene na cozinha e agilidade. Olhei para ele que jogava seu sorriso contagiante e perfeita para mim e meus filhos e no final sentamos na varanda interna como uma noite que não precisava acabar.

- Abusei da sua presteza na cozinha! Disse que estava cansado.

- Sim estou. Mas é bom ficar em boas companhia e fazendo algo leve, sabe, sem obrigações, ou aquilo que a gente acha que somos obrigados.

Eu não sei o que Vick escondia, mas evitei fazer perguntas evasivas a ele, ele ainda fez suco para meus filhos. Numa reação não tão comum, as pontas dos nossos dedos se encontraram criando um choque e tudo parecia escancarado, nos olhamos como se ele pudesse ver o que sentia e ele, antes que tirasse minha mão da mesa segurou meu dedo, apontando para uma pinta branca na unha.

- Isso é falta de vitamina D. — Ele se reservou a falar apenas isso.

E eu não respondi. Eu não tinha palavras para isso. Com um sorriso um tanto safado de sua parte, vendo minha reação diante dele, Vick me encara e vira seu rosto jovem perfeito para meu filhos que não paravam quietos.

- Bem, crianças, tenho que ir. Foi muito bom estar aqui!

- Eu queria seu celular.

- Está no grupo do condomínio.

Ele seguiu para a porta e pedi para meus filhos se comportarem. Eu me senti um velho dando em cima de uma garoto novo, não poderia ficar bem, com aquela bagunça sentimental que me pus e ainda na frente dele. Mas aí da sem palavras resolvi me desculpar.

- Me desculpa.

- Pelo o quê?

- As minha atitudes, eu...

- Túlio. Eu não ligo. Talvez eu sinta a mesma coisa que você, só que com mais experiência. Você tem uma família perfeita. O único fato de não insistir com isso, é que você não gostará muito de me conhecer de verdade! Não estrague isso, vai por mim! — Vick olhou para minha casa e vida e eu fiquei estatelado o vendo ir com as mãos no bolso.

Fechei a porta tão atordoado com as coisas que precisei respirar antes de colocá-los para dormir.

- Papai, o que  houve?

- Nada. Vamos nos preparar para dormir e sem drama, os dois!

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