No dia seguinte, Ayla saíra mais cedo do quarto passando longe do refeitório. Em passos apressados ela seguiu para fora onde encontrara o muro com o buraco.
Mantivera a sua promessa de visitar Pedro todos os dias, onde conseguiram desenvolver bem uma amizade. Contudo o rapaz era completamente diferente do jogo, mantendo um humor soturno e cansado. Havia criado uma imagem similar à um filhote de cachorro que fica eufórico com a chegada de seu dono, mas o Pedro daquela realidade parecia não ter energia nem para piscar.
Ainda assim Ayla gostava dele.
— Pedro, cheguei!
— Estou na cozinha.
Arqueando a sobrancelha fora diretamente para a cozinha, percebendo que as janelas estavam abertas naquela manhã. Que estranho, imaginara que seria impossível abri-las de tão velhas que as dobradiças aparentavam. O vento da estação passava pelas janelas arejando toda a casa, aliviando os pulmões de aguentarem a poeira.
Espera um instante…
Ayla retrocedera alguns passos e dedilhara a mesa da cozinha, arregalando os olhos em não encontrar uma camada grossa de poeira.
— Você limpou a casa? — Continuando seu caminho para a cozinha, seus olhos esbugalhavam novamente — Espera aí, você está cozinhando?
— Está sendo muito barulhenta logo cedo.
Aproximando-se do fogão, Ayla sentira um aroma gostoso vindo da panela. Esticando o pescoço até tentara espiar o que estava sendo preparado pelo garoto, não compreendendo ao certo o que estava sendo preparado.
— Quando me pediu para vir mais cedo não imaginei que fosse para cozinhar… mas o cheiro está ótimo!
— Você sempre passa aqui antes do café da manhã, e sai correndo por estar atrasada. Se eu fizer o seu café da manhã poderá passar mais tempo aqui.
Olhando-o de canto, Ayla formara um ligeiro bico.
— Tudo isso porque quer passar mais tempo comigo?
Pedro não respondera, mas corara ligeiramente. Ayla sorrira ao se inclinar na frente do garoto, dominando seu campo de visão.
— Se está fazendo isso por mim, então farei um belo jejum para chegar bem faminta.
— Não precisa passar fome também! É pouca coisa, já que não sei cozinhar muito bem…
Ah, finalmente encontrara o seu lado fofo. Que garoto rabugento, mas fofo.
— Mas estou bastante surpresa que tenha até tirado a poeira da casa.
— Não tive muita escolha. Fui coagido.
— Coagido? Por quem?
— Um fantasma.
Passeando pela cozinha, tivera a coragem em abrir os armários e procurar pela louça. Já que nunca mexera por ali, e muito menos vira Pedro comer, só pudera imaginar que até os pratos e xícaras fossem quebrados e empoeirados. A surpresa pela manhã apenas continuara quando encontrara a louça intacta e limpa.
Peças bonitas até, que não pareciam combinar com Pedro. Com detalhes delicados e desenhos de flores de cerejeira eram a belíssima combinação. Segurando um prato e o erguendo ao alto, não deixara de sorrir encantada.
— Não sabia que tinha uma louça tão bonita.
— Alguém deve ter deixado aí e eu não tinha visto.
— Que bom que você sabe o que acontece na sua casa, não é?
Pedro apenas lhe mostrara a língua depois de desligar o fogão. Voltando a arrumar a mesa, Ayla continuou a encontrar peças bonitas pelos armários, escolhendo-os para aquele café da manhã. Sem pedir permissão, mas levemente influenciada pela beleza da louça, Ayla arrumara a mesa distraidamente. Nem notara que Pedro a olhava com um sorriso no rosto.
— Acho que ficou bom… — Sussurrava a garota olhando a mesa de longe, em seguida para Pedro. — Demais?
— Vou ter que lavar tudo isso depois? Ah… que preguiça.
— Eu te ajudo!
Com a mesa posta e o café da manhã liberado, Ayla finalmente descobrira que o cheiro bom veio de um ensopado de madioca com carne. O pobre ensopado tivera seu tempo encurtado pela fome da garota. Pedro também beliscara um pouco, preferindo assistir a outra se deliciar.
— Hmm, está muito bom! Oh, a carne, a mandioca… ah. Você cozinha bem, Pedro!
— Não fale com a boca cheia — Repreendia o garoto estendendo um guardanapo, rindo de Ayla — Não precisa ter pressa, pode comer devagar.
— Sim senhor! — Sorria ela docemente, continuando a comer.
A comida do refeitório também era gostosa, mas a de Pedro tinha algo a mais. Não era o seu gosto… mas a sensação que despertava em si. Lembrava a comida de sua mãe, talvez.
Um pensamento logo puxara outro. Entre uma colherada e outra, Ayla se dava conta do quanto sua vida havia mudado naquele mês. A grande pergunta era quanto mais mudaria… como ela estaria ao final de toda aquela aventura maluca?
— O que foi? Há algum gosto ruim?
— Hm? — Piscando algumas vezes, Ayla percebia o olhar preocupado de Pedro. Rapidamente sorria negando com a cabeça — Apenas pensando.
— No quê?
Deveria dizer que estava com saudades da comida de sua mãe? Provavelmente isso a faria pensar mais um pouco em sua família o que a deixaria triste. E então estragaria completamente quela harmoniosa atmosfera… Não queria isso.
— Hm… estava pensando em procurar uma sala de música. Será que temos uma?
— Sala de música? Por que quer ir lá?
— Bem… — Calara-se imediatamente, estava prestes a falar sobre a carta que recebera na noite anterior. — Ouvi rumores de que há um fantasma por lá… queria saber se era verdade.
— Não deveria ir só para sanar a sua curiosidade, pode ser perigoso.
— Não é apenas por curiosidade. Por causa da peça teremos de usar um piano.
— Ah, então os alunos estão agitados por causa de uma peça? — Afastando a cadeira, Pedro cruzara os braços e se ajeitara melhor no lugar — Está barulhento de novo lá fora.
— É o festival escolar, cada classe ficou responsável por uma atração. A minha fará uma peça de teatro.
— O que irão apresentar?
— Fantasma da Ópera. Inclusive, farei o papel principal junto com o presidente do grêmio e o Levi.
— Levi vai participar? — Questionava com tamanha surpresa, que quase caíra da cadeira. — Da peça? No palco?
— Ele fará o papel do fantasma. Espera, você conhece o Levi?
Ah que pergunta mais traiçoeira, admitia Ayla. Dentro do jogo era sabido que algum aluno visitava Pedro com regularidade e lhe contava sobre as novidades da escola. Os fãs sempre suspeitavam que fosse Rafael, cujo personagem parecia ter completo controle de toda a escola. Só que ele nunca dera pistas se era verdade em sua rota.
Esperava que fosse algo concertado no update. Infelizmente não pudera ter certeza.
Poderia arrancar alguma resposta naquele momento, principalmente por ver um certo pânico em Pedro.
— Teria como não saber dele?
Formando um bico nos lábios, Ayla aceitara essa resposta. Apesar de ser algo negativo, não deixava de ser popularidade. Levi era conhecido por todos os alunos de Falls School, só não seria adorado como Rafael.
— Ignore esses boatos, Pedro. Levi é um bom garoto, de verdade.
— Você o conhece?
A pergunta pareceu mais pessoal para Ayla. Desviando o olhar para o seu prato, ela retornara a tomar da sopa e comer um pedaço de pão doce. Tentaria esconder o rubor de suas bochechas, mas elas foram notadas por Pedro.
— Para ser sincera, eu gosto dele. — Admitira baixinho, sem ter coragem de olhar o outro rapaz. — Porque eu sei que Levi é mais do que os rumores dizem. Duvido muito que ele tenha escolhido ser o fantasma.
— Acho que nenhum fantasma escolhe ser fantasma. Apenas acontece de ser. — Suspirava Pedro ao se levantar e reunir a louça para levar até a pia. — Você não é a primeira a dizer que gosta de Levi, mas eu duvido muito que seja corajosa para realmente ficar do lado dele.
Uma semente fora plantada naquele momento.
Coragem.
Ela era corajosa? Será que o Grande Ministro não estava criando muitas expectativas em cima dela para resolver aquele mistério? O que ela teria de tão diferente para lidar com fantasmas? A primeira e última vez que vira um fantasma foram os cabeçudinhos, e tivera a sorte de eles não a atacarem. E se o próximo fosse diferente?
Quem a protegeria?
Além disso, se fosse tão fraca quanto estava pensando então como seria capaz de ajudar Levi? Quando fora alvo dos rumores infundados tudo o que fizera fora fugir. Escondeu-se em seu quarto sem sair por meses. Como poderia ser de ajuda para Levi?
— Pois é… será que eu serei capaz?
— Ainda pretende ir até essa sala de música?
Erguendo a cabeça, Ayla percebia a proximidade de Pedro. Apoiado na mesa a olhando com tanta intensidade, ficara até vermelha.
— Irei. — Percebendo o olhar cerrado do rapaz, Ayla logo apressou-se — Prometo que se ficar perigoso eu sairei.
— Promete mesmo? Levo isso bem a sério. Posso te amaldiçoar caso quebre uma promessa comigo.
Rindo, Ayla estendia o dedo mindinho para Pedro.
— Assumirei a responsabilidade pela minhas promessas.
Com um sorriso soturno, Pedro estendera o mindinho também e o entrelaçara com o de Ayla. Com a promessa feita, o café da manhã feito pelo esquecido se encerrara. Os dois foram lavar louças enquanto conversavam sobre a peça de teatro e logo dera o horário para Ayla ir a aula.
Enquanto observava a garota passar agachada pelo buraco, Pedro se apoiava na janela e erguia os olhos para o céu azulado daquela manhã.
— Eu deveria pedir para alguém ir junto com ela?
※
— Onde você foi essa manhã?
— Ah… eu fui procurar a sala de música. Temos de ensaiar lá não?
Sentando-se em sua carteira, tirava o material sem deixar de prestar atenção em sua colega de quarto.
— O senhor Zanetti pediu que fizesse a reserva para os ensaios, não?
— Pois é… mas não faço a menor ideia de onde fica, então quis procurar antes de qualquer coisa. Mas essa escola é grande demais. — Resmungando manhosa, Ayla formava um bico nos lábios arrancando risos de Mayla.
— É verdade, é fácil de se perder por aqui. Se quiser posso te ajudar a procurar a sala.
— Você já se comprometeu a ajudar na construção dos cenários, não?
— Mas eu posso dar uma saidinha.
— Não quero te encher de coisas para fazer, Mayla. Eu resolvo isso bem rapidinho.
Sem poder argumentar mais por conta do começo da aula, Mayla desistira. Esperar o final da aula para ir atrás da dita sala de música já estava deixando Ayla ansiosa. Se fosse verdade que haveria um fantasma por lá, não poderia colocar sua colega de quarto em perigo. Certamente ela a questionaria o motivo de procurar com tanto afinco aquela sala.
Deveria fazer sozinha.
Daria conta, certo?
Durante a aula, Ayla aproveitara o silêncio da classe para rabiscar nas últimas páginas do caderno o mapa da escola. Tentava se lembrar dos cenários do jogo, e de como costumava controlar sua personagem pelos corredores. Claro que levou em consideração os cômodos que ela desconhecia, o que dificultaria em definir um ponto de partida.
Além disso não poderia perguntar aos outros onde ficava, os seus colegas e professores ignoravam sua presença igual a de Levi.
Rabiscando a folha circulara um cômodo que era do quarto andar. No pior das hipóteses teria de ir de porta em porta para descobrir onde era a sala de música. Poderia começar a procurar alguns no almoço…
Sua ansiedade apenas aumentara. Olhando distraidamente para a janela, esperou o sinal do almoço impacientemente. Mau ouvira o som ecoar pelos alto falantes espalhados pelos corredores, que Ayla pulara da cadeira e saíra em disparada pelas escadarias.
Quarto andar de Falls School estava prestes a ser explorado por ela.
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Atualizado até capítulo 71
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