Quando se joga um jogo de simulação, o jogador deve estar atento. Analisar as personalidades de um personagem paquera e escolher bem suas alternativas são essenciais para alcançar o final desejado. Principalmente quando é uma rota romântica.
Na primeira vez em que jogara Monochrome Ghost, Ayla não tinha a intenção de seguir um único caminho. Escolhia as respostas que consideravam fieis a si mesma ao invés da protagonista, e acabara caindo na rota do esquecido ou então do professor.
Segundo a experiência que Ayla tivera, eles eram os mais fáceis de conquistar. O esquecido era um garoto carente e sensível, ficando empolgado enquanto espera a protagonista chegar para passar o fim de tarde consigo. Já o professor era misterioso em certo ponto, mas fácil de agradar. Apesar de ser o personagem mais velho e maduro, Ayla considerou a paquera algo bem simples e fácil.
Uma vez conquistado não haviam motivos para explorar suas rotas, e por isso havia passado para o considerado mais difícil da época: a rota do popular. Foi nessa rota que ela conhecera Levi Belchior e se encantara por ele, ansiando por suas pequenas aparições, já que ambos eram amigos.
Também fora na rota do popular que Ayla percebera haver mais interações com o professor. Quando interagia com Levi, lhe dando respostas para terem uma intimidade neutra, a de Daniel diminuía.
Quão peculiar era aquilo?
Jogando mais um pouco se dera conta de que a terceira rota era a maior e mais detalhada. Fora ali que o segredo do professor se tornara claro.
Ele havia perdido sua namorada em um trágico acidente da qual não parecia ter superado. A protagonista tem aparência e personalidade bastante similares à da finada, o que justifica os constantes encontros com o professor pela história.
Ayla chegara a se questionar o motivo de tal informação não ter sido apresentada na rota do professor, porém fora na do popular que soubera de que ele era responsável pelas aparições fantasmagóricas em Falls School, em sua tentativa de trazer a namorada de volta a vida.
Infelizmente o jogo não dera maiores informações, e Ayla permanecera suspeita de que o professor teria alguma relação com o vilão do jogo. Afinal... Os dois não se gostam, pelo menos fora o que concluíra em suas análises meticulosas.
Agora que sonhava com o jogo já imaginava que em algum momento encontraria o professor, só não esperava desbloquear o diálogo.
Sendo sincera consigo mesma, não tinha a menor vontade de interagir com ele já que era o inimigo do seu amado vilão. E queria gastar seu tempo procurando-o do que respondendo aos diálogos do professor. Todavia a conversa que tivera com ele não lhe parecera de um todo ruim.
Daniel havia aceitado bem sua resposta, e a acompanhou até os pés das escadarias para os dormitórios. E mesmo que alguns alunos passassem por eles com olhares tortos e cochichos, Daniel não pareceu se incomodar. Apenas tragava seu cigarro e mantinha seus olhos desinteressados para frente, enquanto conversava ocasionalmente com a garota.
― Chame a sua colega de quarto para irem tomar o café, antes que fiquem só com os restos ― Aconselhava Daniel, fitando a garota três degraus acima dele ― E não se esqueça de vir pra aula.
― Aula? Temos aula hoje?
― Hoje e amanhã. Por quê?
Olhando em volta Ayla percebera os alunos usando seus uniformes azul marinho e branco. Pegara no flagra alguns dos olhares curiosos sobre si e controlara o impulso de abraçar o próprio braço.
Queria fugir.
Não estava pronta.
Respirando fundo e sorrindo levemente, a garota apenas negava com a cabeça.
― Por nada. Devo ter me perdido nas datas;
― Ah, outra coisa, você é nova demais para usar maquiagem tão pesada.
O corpo da garota enrijecera mais uma vez. Forçara a abrir um sorriso, que deve ter parecido bem nervoso, para o professor.
― Eh? Mas há outras garotas usando também!
O professor segurava o cigarro entre os dedos e espreitava, mais uma vez, os olhos para Ayla.
― Sei lá, não parece combinar contigo. ― Soltara a fumaça lentamente e então dera as costas para a garota ― Te vejo em classe, novata.
Ayla permanecera na escadaria assistindo o professor caminhar pela escola. Seu semblante ficara sombrio quando a ligeira frase remexera o baú enferrujado, puxando a memória dolorida.
“― Você fica mais bonita com algo mais natural, Ayla. A prefiro assim”.
Soltara um risinho irônico e um revirar de olhos diante de tamanha coincidência. Dois professores falando algo parecido, só poderia ser algum tipo de armadilha do seu cérebro mesmo.
Dando as costas, ela subira os degraus até o quarto andar e se direcionou ao seu quarto, onde deixara a nova colega a esperando.
Antes de girar a maçaneta, Ayla respirou fundo pensando em alguma desculpa para seu comportamento tão tempestuoso. Havia simplesmente surtado quando vira aquelas roupas e fugira pateticamente sem nenhuma explicação. Não considerou que Mayla poderia ficar sem graça por sua atitude...
Não era um bom começo de uma amizade, principalmente com uma personagem de seu jogo predileto. Conhecia Mayla como ninguém, sabia de sua história de vida e até mesmo suas preferências para garotos. E o fato de as duas serem alunas transferidas já era o suficiente para se apoiarem no meio da bagunça que era Falls School.
Abrindo a porta lentamente, encontrara sua colega de quarto continuando a tirar seus pertences da caixa em um cantarolar baixo e suave. Parecia feliz e distraída, com um sorriso gentil estampado em seu rosto.
Pigarreando para chamar sua atenção, Ayla dirigiu um sorriso envergonhado para a outra, que logo viera até si com as mãos sobre o peito.
― Está se sentindo melhor? Fiquei preocupada!
― Estou bem, me desculpe pelo chilique ― Ria envergonhada com a mão na nuca. Mayla, por sua vez, apenas suspirara aliviada a segurando pelo pulso.
― Né, eu fiquei pensando no que poderia ter te deixado tão furiosa quando vira suas roupas...
― Furiosa?
― Han? Foi o que me pareceu... Me desculpe se não for o caso.
Ayla piscara algumas vezes e sentira que uma lâmpada acendera com todo o seu esplendor dentro da mente. Furiosa... Ficara furiosa quando vira suas roupas. Nunca havia considerado que seu chilique tinha um nome tão simples, e que fazia algum sentido.
― Tudo bem ― Ria a garota em resposta ― Então, o que estava dizendo?
― Ah, sim. Suas roupas são bonitas, mas se não gosta delas está tudo bem, já que passaremos grande parte do dia de uniforme. O que eu quero dizer é que não são suas roupas que irão dizer quem você é... Entende?
Estava sendo confortada por uma personagem de jogo, certamente. Ayla não deixara de sorrir ao segurar as delicadas mãos de Mayla.
― Tem razão. Muito obrigada.
Satisfeita a outra inclinara a cabeça ligeiramente e sorria com os olhos.
― Não há de quê. Agora devemos ir tomar o café da manhã, não?
― Sim, apesar de eu não saber onde fica o refeitório.
Conversando descontraidamente as duas garotas saíram do quarto e voltaram para a escadaria. Talvez por contarem um pouco de suas vidas e compartilharem seus gostos, que eram bem parecidos, pouco deram atenção para o que acontecia sua volta.
Somente abriram suas atenções quando entraram no refeitório. Para Ayla, o cenário era inédito.
Um espaço amplo e bem decorado. Mesas grandiosas e redondas com algumas cadeiras amadeiradas e almofadadas na cor carmesim combinavam com a luxuosidade do ambiente. O piso monocromático também se estendia por ali, assim como as cortinas azuladas nas imensas janelas. No centro um lustre grandioso que se encontrava desligado.
Não parecia, de forma alguma, um refeitório de uma escola mal assombrada. Muito bem pelo contrário, parecia ter se matriculado em uma escola de elite.
― Uau.
― Pensei a mesma coisa quando cheguei. Venha, vamos nos servir.
Pegando uma bandeja e seguindo para o buffet no lado direito do refeitório, Ayla se percebia com fome. O cheiro das carnes ao molho eram simplesmente fabulosos. Até mesmo o arroz parecia tão bem temperado, que se vira obrigada a pegar pelo menos uma colher. Não queria parecer esfomeada, mas o cheiro era realmente atrativo.
Com suas bandejas, Mayla tomara o caminho para a mesa mais afastada. E então elas se davam conta dos cochichos e olhares.
Sentando-se na cadeira, Mayla soltara um riso nervoso.
― É um incomodo não? Saber que estão falando por nossas costas e não disfarçarem.
― Também passou por isso?
― Quando cheguei? Sim, sim. Digo... Somos as únicas a residirem no quarto andar.
― As únicas? Não temos vizinhas? ― Vendo Mayla negar com a cabeça, a garota empertigou-se ― Por quê?
― Bem, ao que fiquei sabendo o diretor tentou me colocar em algum outro quarto, mesmo que ficasse apertado só para evitar ir para o quarto andar. Mas com a sua chegada ele não pareceu ter muita escolha.
― O que há com o quarto andar? Um garoto do grêmio também não subiu junto comigo e o Rafael.
― Não estranhe, dizem que na ala dos garotos também evitam o quarto andar. Os únicos que dormem lá são o senhor Zanetti e o senhor Belchior.
Um arrepio passara na espinha de Ayla ao ouvir o sobrenome de seu vilão favorito. Finalmente alguém dissera o seu nome, comprovando que sua existência ali era um fato. Apesar de ao questionar Rafael na noite anterior ele ter ficado sério demais, Ayla não descartara a existência do vilão.
Tivera de enfiar um pedaço de carne em sua boca para conter o sorriso empolgado que nascia em sua face.
― Mas há algum motivo em especial para ser evitado?
Mayla olhara para os dois lados averiguando se algum aluno estava por perto, e assim pudera se inclinar sobre a mesa sendo imitada por sua colega de quarto.
― Uma veterana me contou que fora no quarto andar que dois alunos foram mortos. Só não sabem dizer se foi no dormitório feminino ou masculino.
Ayla não parecera surpresa, já que conhecia o rumor. No jogo, a protagonista tinha grandes dificuldades em fazer amizades justamente por ter sido transferida no meio do ano. Os rumores assustadores começaram com sua chegada, já que os alunos tinham medo de algo acontecer pela entrada fora do comum.
Apesar de que os eventos assustadores iriam acontecer de qualquer forma.
Infelizmente o jogo não havia dado maiores detalhes sobre os alunos mortos. Ayla tinha esperança de que a rota do vilão trouxesse alguma informação, mas infelizmente não conseguira achar a maldita rota romântica.
― Isso quer dizer que ninguém sabe de muitos detalhes, não é?
― Nenhum aluno parece ter coragem para investigar. Acho que eles não sentem necessidade disso.
―Por quê?
― Eles tem alguém para culpar.
Ayla não compreendera de começo, mas então os risinhos femininos lhe chamaram a atenção para um detalhe importante. Na porta do refeitório aparecia um grupo que brilhava. Em seu centro, Rafael acenava para as alunas até mesmo ao pegar sua bandeja e ir se servir no buffet.
Fato, Rafael realmente era popular. Até mesmo os garotos iam conversar com ele, formando uma rodinha em sua volta. Contudo, no instante em que ele se afastara do buffet ninguém o seguira. Permaneceram afastados o observando ir para o canto mais isolado do refeitório.
Mais precisamente para perto das duas colegas de quarto.
Ayla atentou-se ao fato de que nenhum outro aluno que entrara consigo, julgando ser do grêmio estudantil já que reconhecera o garoto de mais cedo, seguira Rafael para a mesa. Haviam se separado.
Em uma mesa solitária o presidente do grêmio descansava sua bandeja e se sentava, dando um último aceno aos seus seguidores antes de começar a comer silenciosamente. Os cochichos e risadinhas daqueles que pareciam desfrutar da visão de Rafael tomando seu café da manhã se calaram quando as portas do refeitório foram abertas novamente.
Imediatamente os alunos foram para seus lugares, debruçando-se em suas bandejas e mantendo suas cabeças baixas. Ayla chegara a olhar em sua volta averiguando que o mesmo comportamento fora tomado por todos os alunos, com exceção dela e Mayla.
As duas colegas se entreolharam e balançavam os ombros sem saberem a resposta de suas perguntas. Voltando a olhar para a porta do refeitório, Ayla arregalava seus olhos amendoados e sentia seu coração bater acelerado.
Caminhando em câmera lenta e silenciosamente, com certa graciosidade e elegância, estava aquele que ela adorava. Calças listradas monocromaticamente, camisa social branca e o colete da escola azul marinho. Cabelos curtos e negros, olhos delineados e azulados como o céu estralado à noite.
Era ele.
Aquele quem ela havia buscado.
Fazendo uma entrada elegante e triunfal.
Levi Belchior, o vilão que ganhara a própria rota na nova versão do jogo, sendo denominado de o fantasma.
Estava ali, ocupando o mesmo ambiente que ela. Pegando sua bandeja e se servindo ignorando por completo as demais presenças do refeitório. Silenciosamente ele seguira assim até a mesa onde Rafael estava, e se sentara para começar a comer o seu ensopado.
Ayla havia se virado na cadeira sem conseguir desgrudar os olhos daquele garoto. Pelos céus, se os gráficos em 2D já exaltavam a sua beleza, a sua mente então parecia ter alcançado a perfeição!
O infeliz era lindo demais.
Mal piscava enquanto o assistia comer do ensopado silenciosamente. E mal respirara quando seus olhos delineados se ergueram para fitá-la, como quem sentisse a sua presença e se incomodasse com ela. De toda forma Ayla não desviara o olhar, e torcia que não parecesse feia para ele, pois permanecera a fitá-lo.
Uma teia de troca de olhares iniciara ali, pois Rafael também notara e espreitava seus olhos claros sobre a aluna transferida. De longe, Mayla intercalava sua atenção entre a colega de quarto e o suposto garoto fantasma, sem compreender o significado daquilo.
Pigarreando para chamar a atenção, Rafael então acenava para Ayla que apenas o retribuíra com um sorriso enigmático antes de se virar para seu prato.
Finalmente o encontrara.
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Atualizado até capítulo 71
Comments
Karen V Pinheiro
uau, sua história está mto boa. foge de tudo o q já encontrei por aqui, está maravilhosa, parabéns. 👏👏👏👏👏
2022-06-07
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