Capítulo 2 - A proposta

    Se passaram um mês desde o enterro do meu pai e o encontro com Beatriz. Enfurnada em minha cama, ranzinza e cabisbaixa, não queria sair do meu quarto, nem ver ninguém ou conversar com alguém, ignorava as mensagens que Benjamin me mandava. Sei que ele só esta preocupado comigo e que deveria lhe responder, mas estava sem ânimo, não conseguia mais dormir a noite, os pesadelos daquela tragédia me perseguiam, e quando estava acordada me culpava todos os dias por estar ainda aqui viva, mas às vezes me pegava pensando no que aquela mulher, que diz ser minha mãe, veio fazer ali no enterro do meu pai e ainda teve a ousadia de vir falar comigo.

–Mel, você precisa se levantar dai da cama, esticar as pernas e comer um pouco. Estou preocupada com você.- Rose aparecia atrás da porta, querendo ver o meu estado.

–Vó...não precisa se preocupar comigo, estou bem assim e eu como de vez em quando uma barrinha e você sabe que sou preguiçosa.- Estando agora sentada em minha cama, a olhava, dando um sorriso forçado, na tentativa de conforta-la, mas não funcionou.

-Mel, sei que não esta bem e não é só instinto de vó, você está horrível.- Rose ia em direção a minha janela, na qual estava fechada, e logo abria, deixando o Sol entrar em meu quarto.

– Ai Vó! Fecha logo isso! - O Sol que entrava na janela fazia meus olhos doerem, tentava impedir erguendo a minha mão em frente ao meu rosto . Fazia tempo desde que vira o Sol, na verdade, desde que vi alguma luz nesse mês.

– Mel, que cheiro é esse?! - Minha Vó tampava o nariz e fazia uma careta em minha direção.- Parece algum bicho morto...

–Não precisa exagerar!

–Mas então o que é? - Ela perguntava procurando alguma coisa, provavelmente de onde veio o cheiro.

–É que...bem Vó, você sabe, depressão faz isso.- Agora ela estava próxima à mim e arregalava os olhos, ela tinha descoberto onde o cheiro vinha.

–Mel! Faz quanto tempo que não toma algum banho descente? - Rose me avaliava agora. - E quando parou de arrumar o cabelo?! Parece uma bruxa!

–Ei!Não precisa esculachar.- Ela me dava um olhar de advertência. Sabia o que ela queria.

– Esta bem, vou tomar um banho e arrumar esse cabelo...-Ela ainda continuava a dar aquele olhar de advertência.- E comer, mas...só se você fazer aquele escondidinho de purê que tanto gosto!

–Era só pedir.- Ela dava um sorriso de alívio e ia caminhando para saída do meu quarto, até que ela parou em frente a porta.

– Ah...tinha me esquecido. Ben disse que viria hoje, você quer falar com ele ou…-Ela parava no final da frase, sabia o que ela quis dizer com o "ou". Sim, o mandar embora e voltar outra hora.

–Bem...é que ainda não me sinto bem totalmente. - Ela me dava um olhar triste.

–Você sabe que não pode ignorar ele para todo sempre.

–Sim eu sei.-Eu acho.- Mas, só me dê algum tempo.

–Está bem, mas vê se não enrole para tomar um banho.

–Ai, ai...tudo bem vó- Revirava os olhos.

–Mel!-Rose falava me repreendendo por ter revirado os olhos.

–Ok. Nada de revirar os olhos, mas tenho um banho me esperando.-Ela dava um sorriso de satisfeita e ia.

Voltava do banho, um pouco renovada e com os cabelos penteados. Rose tinha razão, estava parecendo uma bruxa, apesar que ainda continuava com minha pele pálida e cheio de olheiras. Sentava em minha cama limpa e arrumada agora, pela minha vó, e procurava pelo meu celular. Já que não vou vê-lo hoje, pelo menos tenho que avisar que ainda estou viva. Suspirava, pegando o meu celular no criado mudo e o ligava. E me espantava, tinha mais de 200 mensagens e 12 ligações! É, parece que vou passar o dia inteiro lendo. A maioria era do Ben, como esperado, e outras me surpreenderam, era de algumas colegas da escola deixando os pêsames. Nossa a notícia se espalhou rápido. Mas, tinha algumas que era de número desconhecido e não só sms como também ligações, e todas elas eram curtas.

"Preciso falar com você."; "Me perdoe.";"Aparece na janela." Será que poderia ser ela? Mas agora tinha certeza. "Mellany, sei que agora não conseguirá me perdoar, mas me dê uma chance de falar com você". É, era ela, Beatriz, a única que me chamava pelo nome, mas não sabia o que fazer, se a respondia ou simplesmente a ignorava. Mas...como ela conseguiu o meu número? Ouvia umas batidas na porta.

– Mel o escondidinho já está pronto. - Era a voz da minha vó, então, deixava o celular de lado e abria a porta.

–Já era hora. -Dava um sorriso para ela, disfarçando a minha inquietação com as mensagens e a deixava me conduzir para a cozinha.

...****************...

Estando em meu quarto, agora satisfeita, o que não poderia dizer para Rose, pois tinha deixado quase todo o escondidinho que ela fez. Mas não tinha vontade de comer, na verdade não tinha vontade de fazer nada, nem mesmo de viver. Pensava no acidente de carro que meu pai sofreu a todo instante e em que eu poderia ter salvo, pois eu estava lá.

A culpa me acompanhava como se fosse minha sombra, estava lá sem eu perceber, em meus pensamentos, nos cantos da casa e até mesmo nas pessoas próximas que eu via. A noite eu ouvia os choros da minha avó, até que em uma dessas noites decidi ir até o quarto dela, querendo ajudá-la, não sabia como iria fazer, mas só queria ajuda-la de alguma forma, mas, só consegui ficar imóvel em frente a porta do quarto dela, ouvindo a chorar, no qual não demorou muito, e minha mão ainda na maçaneta, esperando um soluço, ou o que for para entrar no quarto dela, mas nada ouvia e então decidi voltar para o meu quarto, e desde daquela noite, nunca mais ouvi o choro de Rose.

O celular tocava no criado mudo, indicando que tinha chegado uma mensagem para mim, provavelmente é Ben, dando um suspiro, pegava o celular, até perceber que o número era desconhecido. Olhando para o meu celular, ainda na mão, decidindo se iria ler ou não. Sabia que era de Beatriz, e que poderia ser o mesmo lenga-lenga de sempre, "Me desculpe.." e coisas assim. Mas a minha curiosidade era mais forte e logo abria a mensagem.

"Mellany, sei que não mereço uma chance, mas me arrependo amargamente do que fiz, entendo se não quiser me perdoar, mas eu quero te conhecer, pelo menos um pouco. Se quiser conversar venha me encontrar no sábado, às 10h da manhã, no Miami Coffe– Atenciosamente Beatriz.''

É, isso não esperava, mas por que ela acha que iria ao seu encontro? Tudo bem ela estar certa no caso que não vou perdoa-la, mas a curiosidade me pega novamente. Por que ela só apareceu agora? E o que iria perder se fosse a esse encontro? Sinceramente não sei, mas essa mulher insiste em falar comigo, então decido ir a esse encontro.

...****************...

Dois dias se passaram, e hoje era o encontro com a Beatriz, estando arrumada, pois pelo que eu sabia o lugar era só de granfinos, ligava para Ben se poderia me dar uma carona. E no primeiro toque ele atendia.

–Mel?!- A sua voz era de surpresa e alívio.

–Sim, o mais viva que posso. Mas Ben preciso de um favor seu, poderia me dar uma carona até o Miami Coffe?

–Ah...claro, mas só uma carona? - Parecia animado, pensando que estava sendo convidado.

– Só uma carona, mais tarde nos vemos aqui. Minha vó está fazendo um bolo.

–Está bem, que horas que te pego?

– As 10 .

– Ok, já estou à caminho. - Com isso desligava o celular.

Saindo de casa, para esperar Ben nas escadas, encontrava a minha vó na sala fazendo tricor.

–Mel? - Dizia ela surpresa. Fazia tempo desde que me via levantar cedo da cama, na verdade, acho que ela nem lembra a última vez que me viu acordar cedo.-O que esta fazendo acordada a essa hora?

– Bom dia Vó. -Dava um sorrisinho sem graça, mas me aproximava dela e dava um beijo em sua testa.- Vou ir me encontrar com Ben. Tomarei meu café da manhã no Miami Coffe. - Me adiantava antes que ela perguntasse mais alguma coisa.

–Esta bem, vê se volta para o almoço querida.-O carro de Ben buzinava.

–Ok, até o almoço.

...****************...

Estava em frente a entrada do Miami Coffe, com o Ben ao meu lado.

– Então...você vai tomar um café sozinha? - Ben perguntava sem entender, franzindo as sobrancelhas negras dele.

– Não, vou me encontrar com uma pessoa. - Ele arqueava uma das sobrancelhas- E não, não vai ser com um garoto, é com uma mulher e ela quer me conhecer.

–Tudo bem, mas me liga assim que sair, tudo bem?

–Sim, tudo bem, não precisa ficar preocupado, é só uma mulher e não uma psicopata. -Ria para deixa-lo mais tranquilo. Mas até onde eu sabia, ela ser, eu não conhecia aquela mulher, só sabia que ela usava roupas de marcas.

–Mas ainda sim, me ligue.

Entrava no Miami Coffe, estando 30 minutos atrasada ao encontro, e um pouco nervosa, não sabia o que iria fazer se a visse. Uma mulher baixinha com um terno vermelho me abordou.

– Seja bem-vinda. -Ela dava um sorriso simpático e dava um dos cardápios a mim.

–Não..não precisa, estou procurando alguém.

–Claro. -Ela então se retirava.

Observava o lugar, agradável e luxuoso. Várias mesas enfileiradas próximas a janelas, que dava para vista a um jardim, o piso de uma madeira escura, as mesas de vidro, as luzes amarelas com lâmpadas redondas e grandes, dando um visual mais aconchegante, mais a frente via escadas, onde parecia um lugar mais reservado, com poltronas bejes e marrons. E logo avistava, os cabelos curtos e loiros, com a pele impecável como a maquiagem , suave agora, usando um vestido de gola alta branca, sem mangas e bem cortado, e os olhos verdes me observavam, surpresos, que pareciam brilhar conforme ia em sua direção.

– Que surpresa agradável Mel! - Ela dizia com animação, mostrando os dentes perfeitos e brancos num sorriso.

– Não fique assim tão animada. - Cortava a sua animação. - Quero saber por que está aqui.

–Ora querida não precisa se apressar tanto.- Ela estendia a mão em frente a uma cadeira.- Sente-se, eu presumo que ainda não comeu.

Sentava com uma certa relutância, mas por fim, sentava e ainda esperava por uma resposta.

– Estou ainda esperando por uma resposta, depois eu como. -Dava um olhar afiado para ela.

– Ai, ai querida... - Ela dava um suspiro dramático. - Eu já te disse, só quero conhecer a minha filha.

– Não acredito em você. Por que apareceu só agora?

– Porque...-Ela parecia pensativa agora, mas logo a sua expressão mudou, os olhos pareciam encher de lágrimas, e a boca tremia. Me pegando de surpresa.- Mellany, eu passei por muitos problemas. - Ela olhava para mim, ainda com os olhos cheio d'água.- Os meus pais não me deixaram ter você, eles eram ricos e não queriam a sua filha de 16 anos tivesse um bebê e estragar a imagem deles como uns bons pais, então queriam que eu abortasse você querida. Para os ricos o status e a imagem deles é a coisa que eles mais zelam. Mas eu queria ter você querida, e então eu menti para eles dizendo que iria viajar pelo mundo. Mas eu fiquei na casa de teu pai, e por fim tive você. Mas eu não poderia guardar esse segredo por muito tempo, e agradeci a Deus por seus avós morarem em um lugar tão distante da cidade grande e seu pai ter sacrificado a faculdade para voltar a fazenda. E meu pai era um homem muito ambicioso e maldoso, e tive medo que se um dia ele soubesse de você a matasse. - Lágrimas escorriam em seu rosto. - Então eu voltei para casa e fiz um acordo com meu pai, que eu nunca mais veria você e a imagem dele estaria intacta, e eu gerenciaria a sua empresa, mas ele nunca, se quer encostaria em um fio de cabelo seu.

Não sabia o que dizer, não sabia se acreditava nela ou não, vim aqui só me deixou ainda mais confusa. Mas ela não tinha respondido o porque que ela estava aqui.

– Então..por quê esta aqui sendo que o acordo era não me ver?

–Meu pai faleceu a um ano atrás. E não sabia se você queria me conhecer, mas até que soube do acidente que aconteceu, eu vim imediatamente, estava preocupada se você tinha ido..-Sabia que ela falava do acidente que meu pai sofreu.- E que nunca tive a chance de te conhecer. De conhecer a minha própria filha..- Ela pegava a minha mão, e a cariciava gentilmente. - E olha só. -Ela sorria.- Você está aqui, viva, e falando comigo.- Ela tirava a sua mão rápido o bastante. - Mas continuo preocupada.

–Com oquê? - Estranhava ainda o contato que ela teve comigo.

– Com sua avó. Ela já está numa idade avançada, e ela precisa de um descanso. Eu te convidei aqui mais para te fazer uma proposta. Eu quero que você more comigo pelo menos um ano, e então você estará livre de mim se quiser, e ainda pagarei a sua faculdade, sei que Rose não tem o dinheiro suficiente para pagar.

– Não sei...ainda é muita coisa para processar...- Ela me interrompia.

– Não precisa me dar a resposta agora, eu espero. Mas tem que se decidir daqui a dois meses , pois é quando as suas aulas voltam. -Ela sorria com expectativa.

– Esta bem..

–Bem, agora que tal um cafezinho?

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Comments

mirla cordeiro

mirla cordeiro

Uhum agora estou começando a entender

2022-02-12

0

Rosane

Rosane

Tô curiosa para o que vai acontecer

2021-12-01

1

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