Na cidade esquecida de Vila Moura, onde as janelas estavam sempre cerradas e os ventos carregavam sussurros inexplicáveis, havia uma casa antiga no topo da colina. A Mansão dos Espelhos, como era conhecida, estava há décadas abandonada, mas continuava a atrair curiosos que desapareciam sem deixar vestígios.
Dizem que, no passado, ali morava uma mulher chamada Isadora. Bela e reclusa, Isadora tinha uma obsessão: espelhos. Cada cômodo da mansão era adornado por reflexos, desde pequenos pedaços lascados até imensos espelhos de molduras douradas. Quando a solidão consumiu sua sanidade, Isadora começou a falar com os espelhos como se fossem velhos amigos.
Certa noite, os gritos da mansão ecoaram por toda a vila. Quando os vizinhos finalmente criaram coragem para investigar, encontraram a casa vazia. A única evidência de que algo terrível havia acontecido era um espelho gigante na sala principal, com sua superfície estilhaçada. Desde então, moradores evitavam a colina, mas os rumores persistiam: à meia-noite, era possível ouvir sussurros e ver sombras dançando nas janelas.
Anos depois, Clara, uma jovem jornalista obcecada por histórias de mistério, decidiu visitar a mansão. Carregava apenas uma lanterna e seu gravador. As madeiras rangiam sob seus pés enquanto ela atravessava o salão principal, onde um único espelho permanecia intacto. Seu reflexo parecia normal à primeira vista, mas, ao se aproximar, percebeu algo estranho: a imagem não seguia seus movimentos.
— Quem é você? — Clara sussurrou, com a voz tremendo.
O reflexo sorriu. Não era um sorriso amigável, mas algo distorcido, maligno.
— Eu sou o que resta de Isadora — respondeu uma voz rouca, que ecoava tanto no espelho quanto na sala vazia.
Clara tentou recuar, mas seus pés pareciam grudados ao chão. O reflexo se esticou, como se tentasse atravessar o vidro. Isadora, ou o que restava dela, tinha olhos negros como a noite e mãos longas que batiam contra a superfície, implorando por liberdade.
— Leve-me para o seu mundo, e eu deixarei você viver — sussurrou a entidade.
Desesperada, Clara balançou a cabeça e tentou gritar, mas nenhum som saiu de sua garganta. O reflexo então riu, uma risada tão alta e ensurdecedora que os espelhos ao redor começaram a rachar. A superfície do espelho principal brilhou intensamente antes de tudo escurecer.
Na manhã seguinte, a mansão parecia inalterada. Porém, agora havia algo diferente: um novo reflexo no espelho da sala principal. Não era mais Isadora. Era Clara, presa em um sorriso congelado, com olhos que imploravam por socorro.
Dizem que, à meia-noite, dois sussurros podem ser ouvidos vindos da mansão. E o número de reflexos continua a crescer.