O dia seguinte amanheceu nublado.
Yuki acordou com o som da chuva leve batendo contra a janela.
Seu quarto, agora familiar, ainda parecia grande demais pra alguém como ele. Mas... aos poucos, não parecia mais tão vazio.
Ele se levantou, vestiu uma camisa simples que tinham deixado dobrada sobre a cômoda, e saiu em silêncio até a cozinha.
A governanta estava lá, como sempre, impecável, preparando chá.
Yuki
Bom dia...
*disse com um sorriso tímido*
A mulher olhou por cima dos óculos
empregada
não fale comigo se não for pra pedir algo útil.
Yuki ficou sem reação
Yuki
D-desculpe... Eu não queria...
empregada
Se quer mesmo ajudar, pare de fingir que pertence aqui. Você acha que um brinquedinho de rua vai durar muito tempo nessa casa?
Yuki apertou os punhos, mas permaneceu calado.
Ele não queria causar problemas. Não queria mais ser problema pra ninguém.
Mas mesmo assim... aquilo doía.
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Mais tarde, Renji o chamou para o jardim. Estava de camiseta preta e calça de treino.
Renji
Vem cá.
Yuki
O que e isso?
* pergunto, confuso*
Renji
Aula prática. Você vai aprender a se defender. Aqui, ninguém fica indefeso. Nem você.
Yuki arregalou os olhos
Yuki
Mas eu nunca lutei... Nem briguei
Renji
Eu percebi
*disse Renji, com um meio sorriso.*
Mas é hora de começar.
Ele entregou uma espécie de bastão de madeira leve
Renji
Isso não é pra machucar. É pra treinar reflexo. Vem, tenta me acertar.
Yuki
Eu? Acertar você?
Renji ergueu uma sobrancelha
Renji
não se preocupe, eu aguento
Yuki respirou fundo e tentou. Errou feio.
Renji desviou com facilidade.
Renji
De novo
Tentou outra vez. Renji segurou o bastão e puxou de leve, fazendo Yuki perder o equilíbrio. Ele caiu direto contra o peito do outro.
Por um segundo, os dois congelaram.
Yuki estava com as mãos sobre o peito de Renji, o rosto a poucos centímetros.
Renji segurava sua cintura com firmeza, para não deixá-lo cair de vez.
Yuki
tô... tô bem
*murmurou corado*
Renji
tô vendo.
Renji não se afastou, nem Yuki
Renji
Você sempre foi assim... calado, mas cheio de coisa nos olhos
*disse Renji, mais baixo.*
Eu fico querendo saber o que passa na sua cabeça.
Yuki
E se eu disse que agora... estou pensando em você?
Renji respirou fundo.
Yuki sentiu os dedos dele apertarem um pouco mais sua cintura.
Renji
isso e perigoso
*digo sem tirar os olhos dele*
Yuki
Eu já vivi com gente perigosa. Você não assusta. Não de verdade.
Renji chegou mais perto. A testa dos dois quase se encostava.
Renji
Se eu encostar em você agora... você vai me afastar?
Yuki
*não tiro os olhos dele*
não...
E Renji o beijou.
Foi um beijo calmo, sem pressa, como se o mundo tivesse parado por um instante só pra eles dois.
Os lábios se encontraram com suavidade, e pela primeira vez... Yuki não se sentiu sujo, nem usado.
Se sentiu querido.
Quando se afastaram, Yuki sorriu, corado.
Yuki
Isso também faz parte do treinamento?
Renji riu
Renji
Isso foi só um bônus
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Naquela noite, Yuki voltou para o quarto com um sorriso bobo no rosto. Tocava os próprios lábios como se ainda sentisse o beijo ali.
Mas ao passar pelo corredor, cruzou novamente com a governanta.
empregada
Eu vi vocês no jardim
*digo seca*
Yuki parou
Yuki
E?
empregada
Você acha que ele vai continuar te olhando assim quando se cansar? Vai acordar um dia e estar trancado num quarto. Ou pior, jogado na rua de novo.
Yuki
Você não me conhece
*digo firme pela primeira vez*
empregada
E você não conhece esse mundo. Nem ele.
A mulher se virou e foi embora, deixando Yuki ali, com o coração apertado.
Mas, dessa vez, ele não chorou.
Porque mesmo com medo, mesmo inseguro...
pela primeira vez, ele queria lutar.
E agora, ele não estava mais sozinho.
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