Controle
Estou de ressaca de tanto chorar
Geralmente minha ressaca favorita é de álcool, onde pego um feriado prolongado e sofro o que tenho que sofrer. Hoje não foi diferente, apesar de não ter bebido um pingo de álcool, sofri o que guardava por muito tempo
Saio do banho quente, seco e passo meu hidratante corporal noturno, esfrego as pernas e os braços, espalhando o creme de chá de camomila no peito, costas e pescoço. Visto o short de pano fino branco, com ovelhinhas desenhadas e uma blusa com o mesmo material, cor e desenhos espalhados, de alça fina
Percebo no reflexo do espelho meu rosto inchado. Faço um coque frouxo com o próprio cabelo, abrindo a torneira, molho o rosto na água fria. Nego em fazer um skin care, secando o rosto na toalha de corpo
Deixo a tolha na mármore da pia, saindo do banheiro e indo para cozinha. Minha barriga roncava passava das meia-noite e a minha última alimentação foi no intervalo da aula, às três horas da tarde
Entro na cozinha já querendo sair. Paro na entrada, assistindo à visita à vontade abrindo a geladeira, retirando os ingredientes para preparar a rejeita da sua mente. Por rápido segundos, sou pega em flagrante
Mateus
Mônica deixou abrir a geladeira, relaxa — 𝐒𝐞 𝐝𝐞𝐟𝐞𝐧𝐝𝐞, 𝐛𝐚𝐭𝐞𝐧𝐝𝐨 𝐚̀ 𝐩𝐨𝐫𝐭𝐚
Mateus
Que foi? — 𝐀𝐛𝐫𝐞 𝐮𝐦 𝐬𝐨𝐫𝐫𝐢𝐬𝐨 — Não vai conversar comigo?
Isabela
Está estranho de barba
Mateus
Você acha? As meninas curtiram meu visual — 𝐃𝐚́ 𝐚𝐬 𝐜𝐨𝐬𝐭𝐚𝐬 𝐩𝐚𝐫𝐚 𝐦𝐢𝐦
Aproximo devagar, fechando a cara, não curtindo a ideia que para preparar minha refeição, terei sua presença de companhia
Mateus
Não sei o que deu para ter tanta fome
Isabela
Não sabe? — 𝐏𝐞𝐫𝐠𝐮𝐧𝐭𝐨 𝐧𝐨 𝐭𝐚̃𝐨 𝐢𝐫𝐨̂𝐧𝐢𝐜𝐨 - Sério?
Mateus
Não fumei muito — 𝐀𝐛𝐫𝐞 𝐨𝐬 𝐚𝐫𝐦𝐚́𝐫𝐢𝐨𝐬 — Veio fazer o que na cozinha? Me ver?
Isabela
Continua com o mesmo senso de humor. Não amadurece?
Mateus
Vai dizer que não sente saudades do meu humor?
Isabela
Quem é você mesmo? — 𝐀𝐛𝐫𝐨 𝐚 𝐠𝐞𝐥𝐚𝐝𝐞𝐢𝐫𝐚, 𝐩𝐞𝐠𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐝𝐮𝐚𝐬 𝐦𝐚𝐜̧𝐚̃ 𝐞 𝐦𝐢𝐧𝐡𝐚 𝐠𝐚𝐫𝐫𝐚𝐟𝐚 𝐝'𝐚́𝐠𝐮𝐚
Mateus
Verdade. Esqueci que namora com o Ruan
Isabela
Mônica foi dormir? — 𝐏𝐚𝐬𝐬𝐨 𝐬𝐮𝐚𝐬 𝐠𝐫𝐚𝐜𝐢𝐧𝐡𝐚𝐬 — Estava tão feliz que voltou a conversar com ela
Mateus
Também senti falta dela. Pena que ela não mudou nadinha
Mateus
Acho. Assim como você, besta aceitando o que ela faz
Isabela
Vai falar mal da sua prima? — 𝐋𝐚𝐯𝐨 𝐚𝐬 𝐦𝐚𝐜̧𝐚̃𝐬, 𝐚𝐨 𝐬𝐞𝐮 𝐥𝐚𝐝𝐨
Mateus cortava tomates em rodelas finas, como se estivesse em um programa de televisão
Mateus cheira a baseado e perfume amadeirado, é nostálgico seu aroma. Ficaria dias matando a saudades do seu cheiro
Isabela
Guarda algum rancor de mim? — 𝐌𝐨𝐫𝐝𝐨 𝐚 𝐦𝐚𝐜̧𝐚̃, 𝐞𝐧𝐜𝐨𝐬𝐭𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐚 𝐜𝐢𝐧𝐭𝐮𝐫𝐚 𝐧𝐚 𝐩𝐢𝐚. 𝐂𝐫𝐮𝐳𝐨𝐬 𝐚𝐬 𝐩𝐞𝐫𝐧𝐚𝐬, 𝐨𝐬 𝐛𝐫𝐚𝐜̧𝐨𝐬, 𝐯𝐢𝐛𝐫𝐨 𝐦𝐞𝐮𝐬 𝐨𝐥𝐡𝐨𝐬 𝐧𝐞𝐥𝐞 — Viramos adultos
Mateus
Terminei um relacionamento de oito anos. Não tive tempo para remoer o passado, entende? — 𝐀 𝐫𝐞𝐬𝐩𝐨𝐬𝐭𝐚 𝐞́ 𝐟𝐫𝐢𝐚. 𝐂𝐫𝐢𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐮𝐦 𝐜𝐨𝐧𝐭𝐚𝐭𝐨 𝐯𝐢𝐬𝐮𝐚𝐥 𝐪𝐮𝐞𝐛𝐫𝐚𝐝𝐨 𝐞 𝐭𝐫𝐢𝐬𝐭𝐞 — Foi só a carência da adolescência, nada muito profundo e intenso
Como um caco de vidro, quebro-me ao ingerir suas palavras duras e frias. Carência da adolescência? Não pensou em mim durante anos? Entendo que namorava, mas fui um nada para sua vida? Um passos esquecido e empoeirado?
Mateus volta a cozinha, montando seu sanduíches de presunto, salame, queijo e tomate
Mordo mais a metade da maçã, indo para a bancada, localizada no centro da cozinha. Sento nas cadeiras, alimentando-me com as frutas e a água
Mateus
Quer que eu faça pra você?
Isabela
Não precisa. Depois ligo para meu namorado e peço para ele vim fazer
Mateus
Tá namorando? Com quem?
Suas olhadas rápidas ainda vão fazer meu coração parar de bater
Desço os meus lumes e noto um celular grande e fino, protegido com uma capinha preta e película quebrada, quebrando alto, mas sem toque. O dono lava as mãos e seca rápido nas próprias roupas, desesperado para pegar o telefone
Mas não pega. Deslizo o polegar na tela trincada, puxando fora do seu alcance em seguida. O dono sorri, mas as sobrancelhas se juntam, injuriado
Isabela
Por que meu pai está te ligando? — 𝐅𝐢𝐜𝐨 𝐢𝐧𝐝𝐢𝐠𝐧𝐚𝐝𝐚
Meu pai não me liga, desde minha mudança para outra cidade, não houve nenhum sinal de vida sua. Ele não se preocupa com a única filha, mas com um garoto que ele faz conhece, liga a altas horas da madrugada
Isabela
Vou te perguntar de novo. Por que meu pai está te ligando agora?
Mateus
Pergunta a ele. Esqueci, é tão filha da puta que nem se importa com próprio pai
Mordo os lábios, perdendo o controle do raciocínio
Meu pai. Um garoto que ele viu no mínimo duas vezes. Meu pai mais o Mateus. Como isso é possível? Como fui esquecida pelo meu pai?
Como um moído, remoendo o passado, o presente, as lembranças que ainda me atinge, jogo o aparelho no chão com força. Ele roda em câmera lenta até o chão, batendo à ponta no piso, depois dando impacto na outra. Seu giro no ar faz com que trincos da película voam, finalizando as piruetas com a tela no chão
Isabela
Espero que sua capinha seja boa — 𝐏𝐞𝐠𝐨 𝐚𝐬 𝐦𝐚𝐜̧𝐚̃𝐬 𝐞 𝐚 𝐠𝐚𝐫𝐫𝐚𝐟𝐚, 𝐬𝐚𝐢𝐧𝐝𝐨 𝐝𝐚 𝐜𝐨𝐳𝐢𝐧𝐡𝐚 𝐚𝐬 𝐩𝐫𝐞𝐬𝐬𝐚𝐬
Não sinto remorso, Mateus mereceu. Deveria agradecer por ter arrancado a capinha e a película e descontado todo o meu cansaço e raiva por ter que aturar sua presença sob meu teto
Não gosto de admitir, mas Mateus está certo. Não mudei nadinha, ainda aceito as gracinhas de Mônica como uma boba medrosa
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